sexta-feira, 24 de julho de 2009

TRATADO SOBRE A TRADIÇÃO DIVINA DO CARDEAL FRANZELIN

SIM SIM NÃO NÃO

“O vosso falar seja SIM SIM NÃO NÃO; porque tudo o que passa disso vem do Maligno” (Mt. 5,37)

Ubi veritas et iustitia, ibi caritas

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CARDEAL FRANZELIN

 

Depois da publicação no ano passado de Tradição e Modernismo do cardeal Billot, as edições "Courrier de Rome" acabam de publicar a primeira tradução francesa do Tratado sobre a Tradição divina do cardeal Franzelin (400 páginas, 21 euros + taxa de correio).

O padre Jean-Michel Gleize, professor de eclesiologia no Seminário Internacional São Pio X em Écône, assegurou a tradução do tratado do cardeal Franzelin, acrescentando uma apresentação e notas substanciais quefacilitam enormemente a leitura.

Elevado ao cardinalato pelo papa Pio IX em 1876, Jean-Baptiste Franzelin (1816-1886) ensinou teologia dogmática durante vinte anos no Colégio Jesuíta de Roma. Teólogo consultor do prmeiro concílio Vaticano em 1870, ele publicou nesse mesmo ano um tratado sobre a tradição, o De traditione divina, que o tornou célebre e que é considerado a justo título como obra de referência sobre o assunto. Franzelin não se contenta em apresentar, com perfeito domínio de erudição, todas as fontes da patrologia grega e latina. Seu tratado é construído como uma obra propriamente científica deve ser. As duas funções da teologia, a positiva e a especulativa, estão aqui presentes para definir precisamente o conceito de tradição, na mais estreita dependência das fontes da revelação. Aobra de Franzelin põe o dedo na chaga do vício radical do sistema protestante, que repousa em grande parte sobre a recusa desse dogma católico da Tradição Divina. O livro mantém toda sua atualidade sobretudo nesse momento em que a falsa noção de tradição viva que está no centro dos ensinamentos do concílio Vaticano II dá margem a tantas confusões doutrinais que alimentam muitos fiéis da Igreja católica.

TRATADO SOBRE A TRADIÇÃO DIVINA DO

CARDEAL FRANZELIN

1- Uma obra que não envelheceu

O Cardeal João Batista Franzelin, da Companhia de Jesus, morreu em 11 de dezembro de 1886, em Roma, deixando atrás de si a imagem de um religioso exemplar. Ele ficou famoso sobretudo por sua obra mestra De traditione divina, o grande tratado teológico sobre a Tradição, publicado em 1870. É a obra prima do mestre, e como todas as obras primas, não envelheceu. Aqueles que desejam se debruçar seriamente sobre os textos do concílio Vaticano II, para analisar as dificuldades que eles colocam à consciência dos católicos, não podem ignorar o estudo de Franzelin; porque a pedra angular em que repousa uma boa parte da nova eclesiologia, a nova teologia do magistério e da fé, é a ideia modernista de "tradição viva". O tratado de Franzelin contribui profundamente para fundamentar a argumentação dos que procuram resolver os problemas levantados pelo último concílio.

2-A vantagem de uma tradução

Num episódio que ficou famoso, São Jerônimo desmascarou, com certa severidade, a tática da areia nos olhos: "Nada mais fácil - diz ele - do que seduzir uma plebe vulgar e ignorante com um discurso volúvel, pois quanto menos ela entende, mais ela admira1". Hoje em dia, todos nós fazemos mais ou menos parte dessa plebe vulgar e ignorante, porque o desconhecimento do latim tende a se generalizar. O acesso às obras dos grandes teólogos anteriores ao último concílio tornam-se cada vez de acesso mais difícil. Quem quiser pode mentir à vontade ou abusar da situação...

A vantagem de uma tradução2 é dar acesso ao verdadeiro pensamento do autor: cada um pode julgar, com bases firmes, sem glosas nem oráculos. É Franzelin quem fala.

O tratado de Franzelin comporta quatro granoes partes, totalizando 26 teses (ou capítulos). A primeira parte (teses 1-12) estuda detalhadamente a noção de Tradição Divina. É a parte mais importante e mais longa, correspondente a metade da obra. A segunda parte (teses 13-17) é consagrada aos monumentos da Tradição, isto é, às fontes graças as quais a Tradição é conservada e chega até nós. A terceira parte (teses 18-21) examina a natureza das relações existentes entre s Tradição e a Escritura. Enfim, a quarta parte (teses 22-26) versa sobre a explicitação do dogma e mostra err que sentido pode-se admitir um certo progresso dz Tradição.

3- Breve exame crítico do Protestantismo

A primeira preocupação de Franzelin é dar urr golpe de misericórdia no protestantismo. E ele faz issc com método, indicando imediatamente o ponto centra do debate: "Existe, fora das escrituras, um outro órgãc graças ao qual se conserva com toda segurança t doutrina pura e íntegra transmitida um sua origem pó Cristo e pêlos apóstolos? Os protestantes sãc obrigados a negar, se querem salvaguardar sua heresia3".

O essencial da refutação encontra-se na tese 20, em que Franzelin explica a existência da Tradiçãc Divina, tal qual o magistério da Igreja a transmite ( propõe de viva voz, e que passa à frente das Escritura inspiradas4.

O princípio sobre o qual repousa todo o protestantismo é, na verdade, a própria negação da Tradição. Ele enuncia assim: "Cremos, confessamos e ensinamos que há uma só regra e única norma segundo a qual se deve estimar e julgar todos os dogmas e todos os doutores, e não há outra senão os escritos dos profetas e dos apóstolos, no Antigo e no Novo Testamento". Mas esse princípio não se encontra em nenhum lugar nos escritos inspirados, nem no Antigo nem no Novo Testamento. "Eis porque - conclui Franzelin - se os protestantes partem do princípio que não se deve crerem nada fora da Escritura, pelo próprio fato eles crêem e impõem à crença, como primeiro princípio, [...] um postulado que não está na Escritura e que eles apresentam como o dogma deles. Enunciando esse princípio segundo o qual eles negam que se deva crer outra coisa além da Escritura, os protestantes afirmam por esse mesmo fato que se deve crer no que não está na Escritura e há aí uma contradição manifesta".

Isso não é tudo. "Todas as seitas protestantes ainda sustentam, tanto em sua profissão de fé quanto na prática, certas posições que não puderam deixar de pedir emprestado à tradição da Igreja Católica, pois não estão consignadas em parte alguma das Escrituras". Por exemplo, a inspiração dos livros santos ou ainda a santificação dos domingos em vez do sábado. "Essas crenças, observa Franzelin justamente, repousam unicamente sobre a Tradição e a autoridade do magistério da Igreja católica, não se encontra vestígio nenhum escrito delas".

A conclusão impõe-se: "Eis porque esse princípio de base do protestantismo, tal como eles o enunciam em seus símbolos de fé, implica contradição em si mesmo e contradiz todo o resto de sua doutrina".

Eis aí a contradição onde qualquer um se fecha ao rejeitara instituição divina do magistério eclesiástico, que é "a instituição fundamental estabelecida pelo Cristo". A Escritura é somente "uma fonte parcial e um instrumento a serviço da doutrina". Eis porque "Cristo e os Apóstolos declaram explicitamente e de mil maneiras essa instituição fundamental do magistório; mas não acontece o mesmo quando se trata de colocar a doutrina por escrito: Cristo nunca deu tal preceito aos Apóstolos [...]. Nem todos os Apóstolos escreveram uma obra, e mais ainda, nenhum deles pensou que devia colocarem livros toda a doutrina que pregavam5".

4- Constância e Unanimidade da Pregação da Igreja

4.1- Franzelin mostra em seguida que o magistério tradicional e constante deve se definir num sentido muito particular, porque é um magistério

essencialmente tradicional6. Há na verdade uma diferença essencial entre o primeiro magistério dos apóstolos e o de seus sucessores. "O apostolado foi instituído para fundar a Igreja, pregando toda a verdade revelada. Por isso mesmo, os sucessores dos apóstolos não podem ter como função revelar uma outra verdade; eles devem ao contrário conservar e pregar em sua integridade e seu significado autêntico toda a verdade que os apóstolos receberam: "O magistério apostólico é o órgão da revelação, enquanto que o magistério eclesiástico é o órgão da tradição, e a tradição depende da revelação como de sua regra e de seu princípio fundamental. "O magistério pertence aos apóstolos como àqueles que vão promulgar pela primeira vez toda a revelação da fé católica [...] enquanto que com seus sucessores, é um magistério que deve pregar em sua totalidade essa doutrina, cuja revelação fica a partir de então completa".

Se o magistério eclesiástico depende do magistério apostólico como de sua regra, a pregação desse magistério eclesiástico deve permanecer conforme à dos apóstolos: essa pregação tradicional permanece constante: "Os sucessores dos apóstolos aparecem sempre como as testemunhas e os doutores encarregados de propor unicamente o que receberam dos apóstolos. Porque seu cargo e seu ofício têm por objeto permanecer fiéis ao ensinamento que receberam e às verdades que lhes foram confiadas pêlos apóstolos, como discípulos que reconhecem seus mestres".

4.2- Um magistério vivo

É verdade que a Igreja explicita a expressão das verdades reveladas e propõe aos fiéis uma compreensão mais penetrante do depósito da fé. É nesse sentido que se pôde dizer que o magistério tradicional era também um magistério vivo.

Na realidade, "é claro que as verdades objetivas podem fazer parte do depósito de fé, sem que entretanto a pregação pública da Igreja as tenha proposto de modo suficiente para que os fiéis se sentissem obrigados a aderir por um ato de fé católica. E pode-se demonstrar que foi isso que aconteceu realmente. Basta apoiar-se sobre todas as definições dos concílios e dos papas que declaram como sendo de fé verdades a respeito das quais os teólogos católicos seguiam até então opiniões diferentes, sem prejuízo da fé e de sua pertença à Igreja. E eles estavam todos de acordo para reconhecer que essas verdades ainda não faziam parte do depósito de fé, tal como a Igreja declara e impõe à crença. Pode-se também estabelecer a mesma conclusão observando que há ainda hoje muitas questões teológicas que não estão definidas, que os papas e os concílios deixaram voluntariamente sem solução e que entretanto concernem o sentido de certos pontos da revelação7".

Isso se explica facilmente8. "Os dogmas revelados por Deus quanto mais profundos, mais fecundos. Eles podem corresponder de uma infinidade de modos às exigências das diferentes épocas. Eles se opõem a erros muitos diversos que a fraqueza ou a perversidade humanas podem inventar". É somente na medida em que esses erros surgem que a explicitação se faz necessária. Na realidade, esses erros põem em causa a verdade implícita que gozava até então de uma soberania pacífica. Para manter a tranquilidade da ordem no seio da crença e evitar divisões no seio da Igreja, o magistério deve se pronunciar e afirmar no tom solene que lhe é próprio, a verdade que está sendo posta em dúvida. "Poderia haver nessa pregação dos apóstolos verdades enunciadas sem muitas precisões e devido às heresias que sobrevieram em seguida, tornou-se necessário dar uma explicação mais precisa, para refutar diretamente uma certa foima de erro. Assim, os Padres e os concílios definiram expressões e a Igreja consagrou fórmulas que tomaram o valor de profissões de fé".

Essa pregação torna-se mais precisa quando o magistério da Igreja fornece uma inteligência (uma compreensão) mais profunda do dogma. Há progresso não do dogma mas da inteligência (compreensão) do dogma para os fiéis, que ficam mais protegidos contra os ataques do erro. É a passagem de um conhecimento implícito a um conhecimento explícito; a mudança afeta o modo segundo o qual vai se exercer a adesão do intelecto do fiel ao objeto de fé. O objeto de fé permanece imutável tanto antes quanto depois da definição do papa porter sido formalmente revelado.

O fiel cria até agora (1858) por exemplo, implicitamente, na Imaculada Conceição, crendo explicitamente que a Santíssima Virgem possuía a plenitude da graça (Lc. 1, 28). Essa plenitude da graça implica muitas coisas, particularmente a concepção isenta do pecado original. Essa consequência particular foi explicitada pela definição do Papa Pio IX (enquanto que outra consequência particular será explicitada por Pio XII por ocasião do dogma da Assunção). Desde então, o fiel deve crer não mais apenas implicitamente mas também explicitamente na verdade da Imaculada Conceição. A evolução se faz única e precisamente sobre o modo de crer: o modo com que o fiel exerce seu ato, de maneira implícita ou explícita. A evolução não se faz sobre o objeto da crença.

4.3 - Nas antípodas da nova tradição viva

Assim, por um lado, o progresso dessa inteligência (compreensão) deve decorrer "na mesma crença, no mesmo sentido e no mesmo pensamento9",

sem questionar o teor positivo do depósito revelado. Por outro lado, é o magistério infalível e constante, o magistério tradicional da Igreja, e só ele, que deve propor essa inteligência, não a simples razão natural nem a filosofia sozinha. Eis porque Franzelin ainda lembra10 a definição solene da constituição Dei Filius pela qual o concílio Vaticano l consagrou com sua autoridade essa propriedade essencial do magistério eclesiástico: ser um magistério constante. "Adoutrina da fé que Deus revelou não foi proposta como uma descoberta filosófica que devesse progredir pela reflexão do homem. Ela foi revelada como um depósito divino confiado à Esposa de Cristo para que ela o guarde fielmente e o apresente de modo infalível. Consequentemente, o sentido dos dogmas sagrados que devem ser conservados para sempre é aquele que nossa Mãe, a Santa Igreja, apresentou uma vez por todas e jamais é permitido afastar-se dele sob pretexto ou em nome de uma compreensão mais avançada11". A essa definição corresponde o seguinte cânone: "Se alguém disser que é possível que, às vezes, os dogmas propostos pela Igreja se revistam de um sentido diferente do que a Igreja compreendeu e ainda compreende, devido ao progresso da ciência, anátema sit, (que seja anátema)12".

Essa definição é importante, porque condena previamente a noção de tradição viva, cujo ancestral é o padre alemão Antoine Gunther (1783 - 1863), condenado em 1857 pelo Papa Pio IX, que reafirmou "o caráter constantemente imutável da fé13". Para Gunther, ao contrário, a inteligência da fé se desenvolve e evolui ao longo do tempo, graças às simples contribuições da filosofia e da razão natural e não graças ao Espirite Santo que assiste o magistério infalível da Igreja Segundo ele, "foi preciso esperar a descoberta desse verdadeira filosofia para abrir a via de acesso è inteligência perfeita de toda a revelação14" e nesse desenvolvimento da verdade ao longo do tempo, o únicc papel do magistério da Igreja é "decidir qual é, entre as diferentes maneiras sucessivas de compreender c dogma, aquela mais adaptada ao momento presente15" Eis porque "devem-se considerar essas definições quí a Igreja promulga nas diferentes épocas de sua historie como se elas contivessem uma certa parte de verdade sem ver aí a verdade em si e a verdadeira inteligênci; propriamente dita do dogma16".

Para chegar à concepção renovada de "tradiçã< viva", tal qual está germinando hoje no neo modernismo, basta fazer o desenvolvimento da verdadi depender da evolução da consciência individual ou d< sentimento religioso. Sendo revista e corrigida pel filosofia imanentista, que serve de base a ess modernismo, essa nova concepção procede em linha direta de Gunther, e continua merecendo a condenação de Pio IX.

5- Magistério hierárquico e crença dos fiéis

A função do magistério é conservar intacta a fé da Igreja. Como explica Franzelin17, isso implica duas verdades. "Por um lado o Espírito Santo conserva na sociedade dos fiéis a integridade da fé sempre intacta. Por outro, o Espírito Santo obtém esse resultado não apenas agindo diretamente e sem recorrer a um ministério visível, mas também através do exercício do magistério autêntico dos sucessores dos apóstolos18".

Certamente o Espírito Santo pode sempre agir no íntimo das almas, pela graça. Entretanto, essa ação mística é inseparável da ação social do magistério. O Espírito Santo age nas almas na medida em que as almas permanecem na dependência da hierarquia da Igreja. "Quando se fala dessa graça interior chamando-a de doutrina, revelação, testemunho, não se deve entender as expressões desse género no sentido em que elas excluíram a graça exterior e a pregação autêntica. Deve-se ao contrário torná-las como se significassem ao mesmo tempo essa segunda noção19". Todas as passagens da -Escriturérsobre as quais os— protestantes quiseram se basear para defender seu postulado do livre exame ou de uma inspiração nëivjdual direta (1 Jo, 2,18-21 e 2, 24-27; Isaías, 54,13; Jer 31T 31-34) não se podem compreender com exclusão da atividade do magistério; ao contrário, supõem essa atividade20".

Há uma dependência essencial da Igreja discente em relação à Igreja docente. E ao invés de falar em relação aos fiéis de uma "infalibilidade passiva da Igreja", Franzelin pensa que seria melhor "distinguir a infalibilidade na creftça e a'infalibilidade no ensino, ou melhor, a infalibilidade da obediência da fé e a da pregação e da definição da fé.21"

Sem dúvida, Santo Hilário pôde dizer que "os ouvidos do povo são mais santos do que os corações dos padres22". Mas essa expressão deve se entender num sentido bem preciso. "O povo", diz Franzelin, "prefere permanecer na unidade e de acordo com o pensamento dos padres que, por sua vez, permanecem na unidade e de acordo com o pensamento da Igreja. O povo prefere isso a seguir a doutrina dos padres que estão desligados da unidade e da fé comum. Mas seria completamente absurdo ouvir os corações dos padres sem precisão ou achar que o povo passe a ser juiz dos padres. A ordem é exatamente inversa e os corações dos padres, a consciência de sua fé e a inteligência católica dos pastores que permanecem na unidade da Igreja são a causa ministerial e o órgão graças ao qual o

Espírito da verdade modela os santos ouvidos do povo, formando neles o sentido e a inteligência católica dos fiéis que devem escutar, aprender e obedecer a fé23". O sentido da fé ("sensus fidei") é o efeito, não a causa, da atividade do magistério eclesiástico.

6- Em caso de necessidade: recurso à doutrina de sempre

Para prová-lo, Franzelin imagina até um caso limite (poderíamos pensar hoje que não é só teoria). "Pode acontecer que bispos, até mesmo muitos bispos, de províncias inteiras, percam a f é e a maior parte do rebanho dos fiéis permaneça com a profissão de fé católica e prefira se agrupar na unidade e no acordo de pensamento com os sucessores dos apóstolos que permanecem no centro da unidade, isto é, a Sede de Pedro24".

Em tal situação crítica, a Igreja discente terá sempre o meio de reconhecer a autêntica pregação da Igreja docente, porque essa deve sempre permanecer como tal, de um modo ou de outro, ao menos numa parte dos pastores que permaneceram fiéis. E haverá sempre um sinal indubitável para reconhecer essa pregação, MasJranzelin não diz que_ seja primeiro e acima de tudo a pregação dos pastores que obedecem ao sucessor de Pedro. É a pregação dos pastores que obedecem ao sucessor de Pedro na medida em que este obedece ao Cristo, continuando a transmitir o depósito. O verdadeiro magistério deve sempre ser um magistério constante e tradicional. Basta "que tenha constância para transmitir a doutrina já recebida uma vez por todas, e é graças a essa constância que permanece para o povo católico uma norma viva que regula sua fé e o laço que estabelece sua unidade25".

A constância do ensinamento tradicional é portanto o critério por excelência, necessário e suficiente, da pregação autêntica da fé católica. "É impossível que uma doutrina revelada, depois de ter sido unanimemente defendida e explicitamente professada entre os sucessores dos apóstolos, venha a ser negada no interior da Igreja. E reciprocamente, é impossível que uma doutrina, depois de ter sido negada e condenada pela unanimidade, seja defendida26".

7-Aatualidade de Franzelin

Dom Lefebvre sempre invocou esse critério da constância, o argumento dos 20 séculos de Tradição, para justificar a resistência dos católicos face aos erros do concílio Vaticano II. Em particular, fica claro que os ensinamentos da declaração Dignitatis humanae sobre a liberdade religiosa (especialmente o no. 2) são a própria expressão dos erros solenemente condenados pelo magistério infalível do papa Pio IX na encíclica Quanta cura de 1864. É portanto impossível aceitar esse texto do concílio Vaticano II.

"Somos obrigados a constatar que a orientação que a Igreja toma atualmente se encontra em contradição com o que seus predecessores disseram. E eis-nos obrigados a escolher. É um drama para nós. Escolher entre a Igreja de hoje, a orientação da Igreja de hoje e a que a Igreja sempre ensinou durante dois mil anos".

"O que podemos fazer? Só nos resta a alternativa de nos reportarmos a dois mil anos de Tradição. Não é possível desligarmo-nos da Igreja. Seria fazer um cisma. Desligarmo-nos da Igreja de dois mil anos! [...]. Vemos os erros que são ensinados atualmente, as práticas contrárias à tradição da Igreja, coisas que são contrárias a nossa fé. Devemos dizer: não! Não podemos aceitar o que vai de encontro a nossa fé, seja quem for que no-lo ensine. Mesmo se for um anjo vindo do céu, dizia São Paulo, não podemos abandonar nossa fé [...]. E eis porque nos apegamos à Tradição da Igreja. Porque, permanecendo fiéis ao que a Igreja sempre ensinou durante dois mil anos, estamos seguros e certos de não nos enganar27".

Evocando este argumento de 20 séculos de Tradição, Dom Lefebvre não fez outra coisa a não ser seguir os ensinamentos recebidos há anos de seus professores no Seminário Francês de Roma, ensinamentos que eram e continuam sendo a expressão da doutrina católica da Igreja. É mérito de Franzelin nos ter dado a formulação teológica mais sublime. Eis a razão porque a leitura de beu livro é tão útil ao esclarecimento dos espíritos, fazendo-os compreender melhor as bases e a necessidade da resistência aos erros do último concílio.

Pe. Jean-MicheI GLEIZE

Notas

1 São Jerônimo, Carta 52 a Népotien, n. b em PL, 22 -534.

2 A primeira tradução francesa do tratado de Franzelin acaba de ser publicada pela Edição Courrier de Rome.

3 Tese 3, n. 26.

4 Tese 20, n. 436-438.

5 Tese 4, n. 40.

6 Tese 22, n. 470-472.

7Tese 23, n. 490.

8Tese 23, n. 485 et485.

9 Concílio Vaticano l, constituição Dei Filius, cap. 4 em DS3020.

10 Tese 25, n. 529.

11 Concílio Vaticano l, constituição Dei Filius, cap. 4 em

DS3020.

12lbid.

13 Pio IX, Breve Eximinian tuam ao arcebispo de Cologne, em 15 de junho de 1857 em DS 2829

14 Tese 25, n. 525.

16lbid.

16lbid.

17Tese 12, n. 193-209.

18 Tese 12, n. 193.

19 Tese 12, n. 202.

20 Tese 12, n. 202-205.

21 Tese 12, n. 194, notai.

22 Santo Hilário, Contre Auxence, n. 6 em PL, 10/613, citado por Franzelin, tese 12, n. 209.

23 Tese 12, n. 209.

24lbid.

25lbid.

26lbid.

27 Dom Lefebvre, Homélie à Ecône, 19 de setembro de 1976 em Vu dehaut.

2 comentários:

Hilton disse...

É uma pena que essa obra não esteja traduzida para o português. E a do Cardeal Billot Também.

Cruzados de Maria disse...

Caro Hilton,
Salve Maria!

A obra do Cardeal Billot, em breve estará a nossa disposição. Fique com Deus.

Abraço

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