quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Deus castiga?

 

Aquele que ama a correção, ama a ciência,

mas o que detesta a reprimenda é um insensato (Prov. 12, 1)

Pe. João Batista de A. Prado Ferraz Costa

     Uma das tolices mais irritantes que se ouvem hoje em diversos ambientes pentecostais e progressistas é que Deus não castiga porque Deus é amor. Que coisa mais bonita! Que coisa mais melosa! Que coisa mais cretina!

     Outra coisa ridícula e estulta que se ouve com freqüência, vinda dos arraiais progressistas, é que o Deus do Antigo Testamento é um Deus diferente do Novo Testamento.

     O mistério de Deus excede a razão humana, mas não a contradiz. Quando crê em Deus, o homem não descarta o uso da razão; pelo contrário, esta lhe diz que é razoável crer, que há motivos para crer. A fé é uma luz que aperfeiçoa a razão. Ademais, seja dito de passagem, a existência de Deus não é artigo de fé, mas dado da razão. Se alguém não alcança a Deus pela razão, nada impede que nele creia movido pela graça e tocado ao menos por argumentos de conveniência.

     Basta usar um pouco a inteligência para concluir que não tem cabimento afirmar a existência de Deus criador do homem livre e racional, dotado de alma espiritual e imortal e, ao mesmo tempo, dizer que Deus não pune ninguém.

     Como ensina a Dogmática, o conhecimento que temos de Deus é um conhecimento analógico. Quer dizer, por comparação com as obras criadas, podemos conhecer a Deus e seus atributos, não em sua forma própria, mas de forma estranha, tal como moldada nas criaturas. (Cf. BARTMANN, Teologia Dogmática, v. p. 146, São Paulo, 1962). Isto nos permite evitar tanto o erro do antropomorfismo quanto uma total desantropomorfização incompatível com o dado da revelação e o mistério da Encarnação do Verbo.

     Pois bem, se Deus é pai e todo pai bom e educador castiga e corrige seus filhos para o seu bem, como não castigará Deus o homem, seu filho, para seu bem e salvação? A Sagrada Escritura contém várias passagens com essa doutrina. Por exemplo, o Apóstolo São Paulo, citando Provérbios, diz na Epístola aos Hebreus: “Filho meu, não desprezes a correção do Senhor. Não desanimes, quando repreendido por ele; pois o Senhor corrige a quem ama e castiga todo aquele que reconhece por seu filho (Prov. 3, 11s.).”

      Por outro lado, cumpre lembrar o que diz Santo Tomás em seu comentário à Epístola de São Paulo aos Romanos. Explicando as maldições que há na Sagrada Escritura, diz o Angélico que se devem julgar as coisas não segundo a sua matéria mas segundo sua forma (Cf. Super Epistolas, Ad Romanos, c. XII, lectio III). De modo que se pode dizer que o mal, enquanto castigo, não tem razão de mal mas de bem.

     Do esquecimento dessa verdade decorre hoje uma nova religiosidade que quer um cristianismo sem cruz, sem sofrimento. É por isso que se vê tanto abuso na pratica das chamadas missas de “cura e libertação”. Já não se aceita o sofrimento como uma prova permitida ou querida por Deus, mas sempre como um mal vindo do diabo.

     Hoje há uma verdadeira heresia em torno da revelação cristã de que Deus é amor. O amor pressupõe a inteligência que ilumina a vontade com o bem a ser amado. Deus ama porque antes é razão. Deus cria livremente, porque antes é inteligente. Ama tudo aquilo que criou com medida, número e peso (Sab. 11, 21). Sua obra, antes de ser reflexo da sua bondade, é reflexo da sua inteligência. Na mente divina existe, desde toda eternidade, o projeto da criação, que tem início no tempo, como manifestação da sua bondade e onipotência. E seu amor – também nos ensina a teologia dogmática – não é expressão da sua vontade mas do seu ser.

     A criação divina constitui uma ordem. Essa ordem expressa, sobretudo, inteligência e sabedoria. Opondo-se a todo bom senso, a filosofia voluntarista nega a inteligência anterior à vontade em Deus, o que tem conseqüências desastrosas em vários campos.

     Na perspectiva voluntarista, como todas as coisas dependem exclusivamente da vontade divina sem nexo com a sua inteligência, não só as ações humanas tendem a ser arbitrárias, mas também a própria idéia que se faz do juízo divino é uma idéia ilusória, reduzindo-se a um juízo destituído de qualquer elemento racional. Deus poderia fazer um Decálogo ao contrário e seria bom, porque procedente da sua vontade. Ora amor sem razão é um absurdo.

     Os frutos amargos de todas essas distorções teológicas são perceptíveis. Um deles, parece-me, é a decadência da atual educação. A educação – ou deseducação – que se dá hoje às crianças e aos jovens, é uma satisfação de caprichos da vontade ou vaidade dos pais e dos filhos. Não visa mais à perfeição e aquisição das virtudes conforme o conhecimento da verdade.

     O deus caprichoso, que muda de feição do Antigo para o Novo Testamento, da dureza para a moleza, de acordo com a nova exegese pentecostal,inspira o relaxamento da nova educação.

      Não é em vão que a Igreja tradicionalmente procurou guiar e mediar a leitura da Sagrada Escritura para evitar erros e subjetivismos na sua interpretação. Não são dois deuses opostos o do Antigo e do Novo Testamento. Mas o mesmo Deus, eterno e imutável que no tempo age como um pai ou pedagogo, adaptando-se às condições dos seus filhos. Nosso Senhor não veio abolir a lei mas completá-la e aperfeiçoá-la, o que significa torná-la ainda mais rigorosa: “Não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo: Todo aquele que lançar um olhar de cobiça para uma mulher já adulterou com ela em seu coração” (Mt. 5, 27-29).

     Como bem observa Santo Agostinho, o Antigo Testamento não ameaça com a pena eterna do inferno, mas o Novo Testamento a comina em várias passagens: “Nosso Senhor Jesus Cristo quis que fosse mais suave a disciplina uma vez revelado o Novo Testamento. Todavia, é mais atroz a ameaça do inferno, a qual não lemos entre as ameaças de Deus no governo daqueles tempos.” (Super Psalmos, Ps. 105). Quando diz que a disciplina do Novo Testamento é mais suave, o santo doutor refere-se ao conteúdo do salmo 105 que recorda os castigos temporais impostos ao povo hebreu por causa da sua rebeldia e murmuração.

     Resumindo essa doutrina em termos teológicos precisos, diz Renié, em seu Manuel d’Ecriture Sainte, : “Sem dúvida, a lei mosaica é inferior à lei evangélica: é que Deus, como um sábio pedagogo, conduziu a humanidade indo do menos perfeito ao mais perfeito. Jesus não ab-rogará a lei de Moisés, transforma-la-á, aperfeiçoa-la-á (Mt. 5,17). Se por si mesma a lei do Sinai não produzia a graça na alma e só conferia uma purificação exterior, ela contribuía no entanto para a justificação e por seus ritos expressivos reavivava a fé no Messias, de quem vinha a salvação verdadeira (...). Quanto à sua excelência, ela resulta da sua própria perenidade, porquanto ela está ainda na base das nossas civilizações modernas.” (Renié, Emmanuel Vitte, Paris, 1941).

     Para remate dessas reflexões, diria apenas que uma das providências urgentes a serem tomadas para impedir dissolução da doutrina sagrada, a redução do catolicismo à religião sem dogmas, a um vago, indefinido (e cretino) sentimento de amor é, sem dúvida, a Igreja voltar a ser mais vigilante sobre a leitura da Sagrada Escritura. Esta tem de ser precedida por criterioso estudo do catecismo, mediada pela tradição, pelo magistério e pela liturgia da Igreja. Tudo isto implica uma série de medidas concretas. A reforma litúrgica, inflacionando a leitura de textos bíblicos nas missas, inclusive com passagens de difícil interpretação, criou uma situação embaraçosa segundo análise do erudito cardeal Stickler. Aguçou um interesse entre os leigos, para não dizer uma curiosidade, pelas Sagradas Escrituras, que envolve perigos graves para a integridade da fé católica. Além disso, há um incontestável despreparo do clero formado após o Vaticano II – prejudicado pela degradação dos estudos na maioria dos seminários – para explicar aos fiéis as passagens da Sagrada Escritura lidas na santa missa. Se por um lado a reforma litúrgica multiplicou o número de leituras bíblicas, por outro lado censurou os chamados salmos imprecatórios, explanados de forma admirável por Santo Agostinho. Como se sabe, referidos salmos em linguagem contundente profetizam terríveis desgraças que cairão sobre o pecador impenitente como se fossem votos. Empregados na liturgia tradicional, seja na missa na forma de intróito ou no breviário como antífona, esses salmos recordam ao cristão a justiça divina. Certamente, não foi inócua sua supressão. Lex orandi, lex credendi. Se uma verdade de fé deixa de ser exposta pela liturgia, com o tempo será negada ou esquecida. Por exemplo, a tradução mutilada do cânon romano, suprimindo a expressão “eterna danação” é uma das causas de hoje não ser negado o inferno. Não é à toa que o cardeal Ratzinger disse que a reforma litúrgica é uma das causas da crise da Igreja em nossos dias.

Anápolis, 28 de outubro de 2008

Festa de São Simão e São Judas Tadeu, Apóstolos

Fonte: Deus castiga-Pe João Batista - Associação Civil Santa Maria das Vitórias

Confira também o artigo: A imortalidade da alma em Sto. Tomás e Dostoievski

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

O CONCÍLIO VATICANO II E A TEOLOGIA DE JOÃO PAULO II (1)

Conferência do Prof. Johannes Dörmann,* enviada ao II Congresso Teológico de Si Si No No, realizado em Albano (Roma), em janeiro de 1996, e transcrita do mensário Sim Sim Não Não, nºs 51­-52, de março- abril de 1971.

1. JOÃO PAULO II: COMO BISPO E COMO PAPA, TEÓLOGO DO CONCÍLIO VATICANO II

Este vasto assunto não poderia ser tratado numa curta conferência, se o próprio Cardeal Wojtyla não o tivesse aprofundado exaustivamente em seu livro intitulado Fontes da Renovação. Estudo sobre a aplicação prática do Vaticano II (1972, em polonês). Uma vez que a teologia do arcebispo de Cracóvia é substancialmente a mesma que a do Papa, podemos encontrar em Fontes de Renovação a resposta de João Paulo II ao tema da nossa exposição (1).

O Cardeal Wojtyla escreveu Fontes da Renovação em vista de um sínodo de sua arquidiocese. As bases de seu estudo são textos escolhidos do Vaticano II. Deles o Cardeal deduz, passo a passo, “a doutrina do Concílio”.

Sob a expressão “doutrina do Concílio” é preciso entender sempre a “doutrina do Concílio” conforme a interpretação do Cardeal Wojtyla. Pomos aqui entre parênteses a questão crítica de saber se sua interpretação é bem fiel ao sentido literal dos documentos do Concílio e se sua “doutrina do Concílio” representa bem o ensinamento real do Concílio (2). Contudo, não se deve perder de vista o fato de ter o arcebispo Wojtyla participado ativamente, como Padre conciliar, na redação de documentos conciliares, de ter estado em contato com teólogos conciliares de primeiro plano (3): ele está, portanto, bem apto para conhecer os diversos objetivos visados através dos textos que analisa. Pode-se encontrar um indício evidente de suas próprias posições no fato de que, em seguida, elevou ao cardinalato influentes teólogos conciliares.

Para tema de minha conferência, a única coisa que conta é o fato de que o Cardeal Wojtyla, testemunha autêntica do Concílio (p. 7), se identifica totalmente com a “doutrina do Concílio”, a qual ele deduz dos documentos conciliares. Feito Papa, é a partir deles que continuou a desenvolver as suas concepções. Pode-se dizer que seu “ensinamento do Concílio” é a teologia de Karol Wojtyla, como Bispo e como Papa.

A questão central desta matéria sobre a relação entre o Concílio Vaticano II e a teologia de João Paulo II já está, portanto, respondida em princípio: o “ensinamento do Concílio” e a teologia de João Paulo II são idênticos. Karol Wojtyla, Bispo ou Papa, é inteiramente teólogo do Vaticano II (4).

Não me resta nada mais senão apresentar as idéias diretrizes de seu “ensinamento conciliar”.
* Nascido em 27.12.1922, Johannes Dörmann, após os estudos de matemática e de física, de filosofia e de teologia, tornou-se Padre da Arquidiocese de Colônia em 1953. Durante seus anos de ministério paroquial como vigário, e depois como cura, estudou ciência missionária em Münster, bem como etnologia, etnossociologia e ciência das religiões (Bonn e Bâle).

Doutorou-se em 1964. Foi professor universitário em ciência das religiões e ciência missionária, de 1966 a 1970. Foi mestre de conferência de 1970 a 1984, e professor em ciência missionária e religiosa na Universidade de Münster, em Westphalia. Foi nomeado em 1976 diretor do Instituto de Ciência Missionária na Universidade de Münster. Ensinou também como professor na Faculdade de Teologia de Paderborn, de 1969 a 1985. Em 1984, passou a professor emérito.

O professor Dörmann não é tradicionalista no sentido que esse termo assumiu hoje, mas um competente e sério teólogo. E foi nesta qualidade que Si Si No No lhe pediu o estudo que aqui se transcreve. Principais obras do autor:

A Única Verdade e as Numerosas Religiões;
A Estranha Teologia de João Paulo II e o Espírito de Assis;
A ‘Trilogia Trinitária’ [de João Paulo II]:
"Redenptor Hominis" (Tomo I):
"Dives in Misericordia" (Tomo II);
"Dominum et Vivificantem" (Tomo III).
Notas:
(1) Karol Wojtyla, Fontes da Renovação. Estudo sobre a aplicação prática do Concílio Vaticano II, Paris, Le Centurion, 1981, 355 pp., trad. da edição italiana. Ed. original em polonês, Cracóvia, 1972. Os números das páginas referem-se ao texto da ed. francesa.
(2) A propósito, ver J. Dörmann: A Estranha Teologia de João Paulo II e o Espírito de Assis.
(3) João Paulo II cita no seu livro Entrai na Esperança (1994) Yves Congar e Henri de Lubac. Seria preciso também mencionar a elevação ao cardinalato de Hans von Balthasar, a qual fora programada.
(4) Cf. A Estranha Teologia de João Paulo II

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Há 22 anos ... a celebração revolucionária em Assis: Liberdade, Igualdade e Fraternidade


 
 
 

 

 

 

 

 

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As profanações de Assis


Hirley Nelson de Souza


Em 27 de outubro de 1986, o Papa João Paulo II realizava na cidade de Assis, na Itália, o "encontro de religiões", onde o líder ou representante de cada confissão religiosa rezaria a seu deus pela paz. Foram 130 as religiões ali representadas. Ao Papa coube presidir as cerimônias na qualidade de anfitrião, não como uma liderança religiosa superior, já que todas as crenças se nivelaram e no mesmo pé de igualdade se encontravam judeus, anglicanos, budistas, maometanos, brâmanes, indígenas, etc. É o que poderíamos chamar de uma autêntica salada religiosa. Até os B'nai B'riht que, segundo consta, fazem profissão de ateísmo, foram convidados a participar. Foram feitas orações dirigidas a quase todas as divindades do paganismo por chefes de religiões enquanto tais.
Na escadaria em frente à Igreja em que está o túmulo de S. Francisco de Assis, "os líderes religiosos fizeram uma oração pública seguida cada uma de um breve instante de meditação".

Seguiram-se cenas as mais estapafúrdias: "Um sacerdote xintoísta leu poemas de Hiroito. Um índio fumou o cachimbo da paz. Um budista pediu que os animais se livrem do medo de serem comidos por outros e que os seres humanos não conheçam nenhum sofrimento. Um Brâmane pediu que houvesse paz nos céus, na terra, nas águas, nas ervas e nas plantas, paz em todos os seres humanos. Falaram Ulemás, rabinos, popes e pastores". (Cfr. Veritas-1986).


A imprensa internacional à época, registrou os fatos que ali se passaram, com minuciosos detalhes em sucessivas reportagens. Assim ficamos sabendo que no altar da Igreja de S. Gregório os feiticeiros indígenas prepararam o seu "cachimbo da paz" para reverenciar Manitu. Os hindus se sentaram em volta do altar da Igreja de Santa Maria Maggiori invocando os seus deuses. No altar principal da Igreja de S. Pedro armaram o trono do Dalai Lama, onde esta personagem, que não é um, representante, mas o próprio deus dos tibetanos, sentou-se de costas para o sacrário cuja lamparina acesa indicava a presença real de N. S. Jesus Cristo. Ali o Dalai Lama foi adorado pelos seus bonzos. Outro fato estarrecedor foi a colocação da estátua de Buda sobre o sacrário no altar de um templo católico para a realização de cerimônias pagas.


Talvez, por isso, houve quem pretendesse justificar as profanações em Assis alegando que não passaram de exageros da imprensa. O encontro de Assis foi algo tão grotesco e ridículo que a própria imprensa internacional a ele se referiu com títulos jocosos e irreverentes, tais como: "PAIS NOSSOS QUE ESTAIS LÁ EM CIMA, NOS CÉUS" (Panorama - 02/11/86) "PAI NOSSO QUE ESTAIS NOS DEUSES" (Liberation - idem) "EM NOME DE TODOS OS DEUSES" (Il Alguns recusaram-se a crer que a estátua de Buda tivesse sido colocada em cima de um sacrário. Não bastasse a fotografia do sacrilégio consumado, temos ainda as declarações do Cardeal Silvio Oddi, da mesma linha do Papa João Paulo II, que se encontrava em Assis por ocasião do inusitado evento "religioso".



Disse o Cardeal: - "Por esses dias caminhei por Assis, porque sou legado pontifício da da Basílica de S. Francisco, e em alguns lugares de oração assisti a profanações. Vi budistas dançarem ante o altar, onde, em lugar de Cristo, havia sido colocado BUDA, a quem se reverenciava e oferecia incenso".(Roma Aeterna n° 118 citando Esquiú - Buenos Aires-6/1/91). Se um Cardeal da Santa Igreja, que se manifesta a favor dessas "reuniões de religiões", portanto uma testemunha insuspeita, confessa ter presenciado as profanações não há motivo para se duvidar.

Aliás o Cardeal Silvio Oddi disse ainda que um Beneditino "manifestou seu escândalo (quanto ao culto budista no templo católico) e foi retirado pela polícia". Só que o Cardeal não reagiu. "Eu não gritei", disse ele, "mas o escândalo estava no meu coração," como se isto pudesse aplacar sua consciência face a sua omissão!

O Padre Emmanuel, em "O Drama do Fim dos Tempos", escrito há cem anos atrás, já AMALDIÇOAVA, profeticamente, os artífices e incentivadores de "encontros de religiões" como esse realizado em Assis, prenuncio do Apocalipse na obra citada. Disse o Pe. Emmanuel:- MALDITOS os cristãos que suportam sem indignação que seu adorável Salvador seja posto lado a lado com Buda e Maomé em não sei que panteão de falsos deuses".

Maldição à parte, não foi justamente isto que o Papa João Paulo II fez em Assis?

Suma Contra os Gentios - Santo Tomás de Aquino

LIVRO I : DEUS EM SI MESMO

CAPÍTULO I

QUAL É O OFÍCIO DO SÁBIO

Minha boca publicará a verdade e meus lábios odeiam a impiedade (Pr 8,7).

l. A terminologia vulgar, que o Filósofo diz ser con­veniente respeitar ao se dar nome às coisas (II Tópicos l, 109a), preferiu em geral julgar como sábios aqueles que diretamente ordenam as coisas e as governam com habilidade. Por isso, entre outras funções que os ho­mens atribuem ao sábio, a de que pertence ao sábio or­denar è proposta pelo Filósofo (l Metafísica 2, 982a; Cmt 2, 42-43). Ora, a regra do governo e da ordenação de todas as coisas que se dirigem para um fim deve ser assumida deste fim. Assim, cada coisa fica otimamente disposta enquanto se ordena convenientemente para o seu fim, visto ser o fim o bem de cada uma. Por esse motivo, vê-se também que, nas artes, tem o governo e como que o principado sobre as outras aquela à qual pertence o fim. Por exemplo; a arte médica governa e ordena a arte farmacêutica porque a saúde, que é ob-jeto da medicina, é o fim de todos os medicamentos preparados na farmácia. Coisa semelhante acontece na arte da navegação com relação a arte da construção naval, bem como na arte militar com relação à arte equestre e a toda indústria bélica. Essas artes que têm o principado sobre as outras são denominadas arquite-lônïcas ou artes principais. Dai os seus artífices — que são chamados arquitetos — reclamarem para si o nome de sábios.

2. Como, porém, os supramencionados artistas que tratam dos fins de coisas singulares não atingem o fim universal de todas as coisas, são, por isso, chamados de sábios desta ou daquela coisa. E é neste sentido que são Paulo escreve: Como sábio arquiteto coloquei o fun­damento (l Cot 3, 10).

O nome de sábio, porém, é simplesmente reservado só para quem se dedica à consideração do fim do universo, que é também o princípio. De onde afirmai o Filósofo que pertence ao sábio considerar as altíssimas causas (I Metafísica 1. 981a — 2, 982a; Cmt l e 2, 24-28 e 49).

3. O fim último de cada coisa é intencionado pelo seu primeiro autor ou motor. O primeiro autor e motor do universo é o intelecto, como mais além se verá (cf in­fra 1. I, c. XLIV; 1. II, c. XXIV). Convém, pois, que o fim último do universo seja o bem do intelecto, que é a verdade. Donde ser a verdade o fim último de todo o universo. Donde, também, convir à sabedoria entregar-se, acima de tudo, à sua consideração.

Justamente para a manifestação da verdade é que a sabedoria divina encarnada veio ao mundo, como bem o afirma são João: Eu aqui nasci e vim ao inundo para dar testemunho da verdade (Jo 18, 37).

Esclarece também o Filósofo que a Filosofia Pri­meira é a ciência da verdade (II Metafísica l,993b; Cmt 2, 298). Não porém de qualquer verdade, mas daquela verdade que é a origem de toda verdade, isto é, a que pertence ao primeiro princípio do ser e de todas as coisas. Donde também ser a verdade o princípio de toda verdade, já que as coisas estão dispostas na verdade como no ser.

4. Pertence, com efeito, ao que aceita uni dos ter­mos contrários refutar o outro, como, por exemplo, acontece na medicina: esta trata da saúde e afasta a doença. Portanto, como pertence ao sábio considerar principalmente o primeiro princípio e discorrer sobre os outros, pertence-lhe impugnar também o erro contrário.

5. E, pois, mui convenientemente declarado pela boca da Sabedoria o duplo ofício do sábio, no texto supracolocado. Refere-se ele à verdade divina medi­tada, que por antonomásia é a verdade, quando diz: Minha boca publicará a verdade. Refere-se à impug­nação do erro contrário à verdade, quando diz: Os meus lábios odeiam a impiedade. Está aqui designada a fal­sidade contrária à religião, pois esta também se chama de piedade. Daí a falsidade, que lhe é contrária, as­sumir para si o nome de impiedade.

Fonte: Suma Contra os Gentios, Santo Tomás de Aquino, Tradução de Dom Odilo Mourão, Edições Est

Entrevista com o Arcebispo Malcom Ranjith

“A liturgia e os pobres, tesouros da Igreja”

Entrevista com o arcebispo Malcolm Ranjith (Setembro 2006), escolhido pelo papa Bento XVI como secretário da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos

Entrevista com Malcom Ranjith de Gianni Cardinale

O arcebispo Albert Malcolm Ranjith Patabendige Don, a completar 59 anos em meados de novembro, originário do Sri Lanka, foi nomeado secretário da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos em 10 de dezembro do ano passado. Bento XVI o chamou à Cúria, como segunda nomeação de relevo de seu pontificado, depois da de William Joseph Levada a prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Ao lado do recém-empossado cardeal secretário de Estado Tarcisio Bertone, dom Ranjith faz parte do círculo de estreitos colaboradores da Cúria Romana pessoalmente escolhidos pelo papa Ratzinger.
30Dias lhe pediu que aprofundasse alguns aspectos de sua biografia.

Don Albert Malcom Ranjith

Excelência, como nasceu a sua vocação?
ALBERT MALCOLM RANJITH PATABENDIGE DON: Nasci numa família de bons católicos. Em nossa paróquia vivíamos com alegria a sadia e boa tradição da Igreja, na qual a missa cotidiana era uma prática da qual participavam muitos fiéis simples. A paróquia era dirigida por um ótimo missionário francês, um oblato de Maria Imaculada, padre Jean Habestroh, que deu tudo por Jesus e por Sua Igreja. Um verdadeiro modelo de dedicação. E assim, dentro dessa intensa vida de fé na família e na paróquia, o chamada a me dedicar plenamente ao serviço do Senhor nasceu desde pequeno e amadureceu, quando eu era coroinha, quase de modo natural.


Onde o senhor estudou?
RANJITH: Numa escola dos religiosos das escolas cristãs de La Salle, escolas de ótima qualidade, nas quais a vida devocional era muito intensa. Todos os dias rezávamos o Rosário, e éramos quase todos membros da Legião de Maria. Tive sorte, pois nessas escolas cresci não apenas nos conhecimentos científicos e na formação cultural, mas também na vida espiritual. E os religiosos de La Salle eram guias exemplares.


O senhor freqüentou o seminário maior nacional de Kandy, de 1966 a 1970...
RANJITH: Eu tinha dezoito anos quando entrei no seminário. Meu pai, num primeiro momento, não estava muito contente, pois eu era o primogênito e único filho homem. Mas, depois, graças sobretudo a minha mãe, meus pais entraram em acordo e me deram permissão de entrar no seminário. Depois dos estudos filosóficos e de um período de tempo que passamos fora do seminário, o primeiro e único cardeal que teve o Sri Lanka, Thomas Benjamin Cooray, mandou-me a Roma, para o Colégio de Propaganda Fide, a fim de que eu completasse os estudos teológicos.


E em Roma o senhor foi ordenado sacerdote.
RANJITH:
Sim, em 29 de junho de 1975. Éramos mais de 350 diáconos ordenados por Paulo VI durante o Ano Santo. Em seguida, freqüentei o Pontifício Instituto Bíblico, onde, depois de quatro anos, obtive a licenciatura em Sagrada Escritura. Durante esses anos, tive também a sorte de poder fazer um curso de oito meses na Universidade Judaica de Jerusalém, onde pude receber dos rabinos professores um grande sentimento de amor pela Palavra de Deus. A Terra Santa está cheia de Deus e de Seu amor pela humanidade, um amor que naqueles lugares pode-se quase tocar com as mãos. Minha vocação sacerdotal, portanto, se enriquecia com novas forças espirituais, a cada dia que eu respirava aquele ar.


Quem foram seus mestres?
RANJITH:
Fui aluno do então padre Carlo Maria Martini, inteligente e muito capacitado: ele nos ensinava o Evangelho de São Lucas e Crítica Textual. Outro jesuíta, hoje cardeal, padre Albert Vanhoye, era também meu professor. Com ele como orientador, em 1978, escrevi minha monografia para a conclusão de curso de Sagrada Escritura sobre a Carta aos Hebreus. Da Urbaniana, guardei a figura do padre Carlo Molari: apresentava a doutrina dogmática sob um ponto de vista diferente, mas interessante, que suscitava debates e abria nossos olhos para que saboreássemos o verdadeiro valor da teologia. Houve muitos outros bons professores. Eu me lembro de dom Stefano Virgulin e do padre comboniano Pietro Chiocchetta: não ensinavam de modo “livresco”, mas com uma fé intensa em Jesus.


Concluídos os estudos, em 1978 o senhor voltou para a pátria.
RANJITH:
Fui vice-pároco numa região pouco desenvolvida, num vilarejo de pescadores, todos católicos. E lá comecei a descobrir a ligação da teologia com a vida cotidiana dos fiéis a partir do grande veículo da liturgia. Quem celebra e reza intensamente é ajudado a pôr em prática o que celebra. Depois fui pároco também em outros vilarejos de pescadores. Eram muito pobres, mas tinham uma grande fé. E foi justamente graças ao contato com essas realidades que descobri a necessidade de que a Igreja se ocupe também da justiça social. Desde então, o amor pela liturgia e o amor pelos pobres, dois verdadeiros tesouros da Igreja, poderíamos dizer, foram a bússola da minha vida de sacerdote. Muito embora, naquela época, eu jamais pudesse pensar que um dia chegaria a ser secretário da Congregação para o Culto Divino.


Como o senhor ajudou aquelas populações?
RANJITH:
Aproveitei os conhecimentos que tinha cultivado em Roma e na Alemanha. Chamei meus velhos amigos e, graças a Deus, as ajudas apareceram. Foi graças também a essa atividade que, em 1983, me tornei diretor nacional das Pontifícias Obras Missionárias. Cargo que exerci durante dez anos. E nessa condição participei de muitos encontros com os outros diretores das Pontifícias Obras Missionárias espalhadas pelo mundo inteiro. Foram essas reuniões que me ajudaram a ter uma visão realmente católica, universal da Igreja.


Em 1991, o senhor foi nomeado bispo auxiliar de Colombo. Com viveu essa primeira experiência episcopal?
RANJITH:
Como bispo auxiliar, pude ampliar minha presença para toda a diocese e colaborar dessa forma com meu bispo ordinário. Pude descobrir, além disso, como o povo cristão deseja sentir próximos seus pastores, dos quais esperam uma vida que reflita a do supremo pastor, Jesus. Durante esse período, a pedido do episcopado, coordenei com o governo e a Santa Sé a preparação da viagem do papa João Paulo II ao Sri Lanka, ocorrida em janeiro de 1995. Foi uma grande experiência também. Era comovente ver nossos fiéis simples se apertarem ao redor do Papa com um grande sentimento de afeto.

O jovem padre Ranjith, vice-pároco do vilarejo de pescadores de Kepungoda, na arquidiocese de Colombo

Era a primeira vez que um papa tocava o solo do Sri Lanka?
RANJITH:
Não, trinta anos antes, em dezembro de 1970, Paulo VI, voltando a Roma da Austrália, fez uma parada em Colombo, onde celebrou uma missa no aeroporto. Na época, eu era um jovem seminarista e ainda me lembro da alegria com que os católicos, mas não apenas eles, se reuniram em torno da figura do primeiro papa que punha os pés em nossa ilha.


No final de 1995, o senhor foi chamado a guiar a nova diocese de Ratnapura, onde ficou até 2001. RANJITH: Pediram-me para assumir uma diocese nova, que acabara de ser constituída, situada no interior do país. E eu aceitei. Foram cinco anos muito felizes, apesar dos problemas que sempre existem, sobretudo quando se deve construir toda uma estrutura diocesana. Aprendi a ficar perto do clero – que em Ratnapura estava um pouco dividido – e dos fiéis, a maioria dos quais eram e são muito pobres. Nesse caso não eram pescadores, mas agricultores das plantações de chá.


Quantos católicos havia em Ratnapura?
RANJITH:
Só dois por cento da população. Mas as relações com a esmagadora maioria budista eram ótimas. Quando entrei na diocese como bispo, fui visitar todos os templos budistas da cidade e encontrar os monges. Desde o primeiro dia, criamos um organismo de diálogo e cooperação em campos nos quais isso é possível, como o social. Nasceu uma amizade muito forte com alguns desses monges. A eles, algumas vezes, pedimos conselhos e sugestões quando construímos novas igrejas.


No entanto, nos últimos tempos, se discutem leis para impedir a conversão de uma religião para outra no Sri Lanka...
RANJITH:
É uma questão que se discute em nível nacional e que se deve à longa guerra entre a minoria tâmil, grande parte dela hinduísta, e a maioria cingalesa, formada sobretudo por budistas, e também às atividades pouco corretas de algumas seitas cristãs fundamentalistas. A maioria cingalesa-budista tem medo de que as minorias, a tâmil-hinduísta mas também as comunidades cristãs que se encontram tanto entre os tâmil quanto entre os cingaleses, queiram conquistar uma posição dominante na sociedade, e por isso reage e procura controlá-las, criando nelas às vezes um sentimento de opressão. Isso de maneira geral. Mas, quando eu era bispo em Ratnapura, a situação era tranqüila na diocese, até porque ela está fora das regiões mais quentes do conflito, que ficam no nordeste do país.


Em 2000 foi publicada a declaração Dominus Iesus, sobre o caráter salvífico único de Jesus. Ela criou problemas no diálogo com o budismo?
RANJITH:
Para dizer a verdade, um primeiro problema surgiu em 1994, quando João Paulo II publicou com Vittorio Messori o livro-entrevista Cruzando o limiar da esperança, no qual algumas frases sobre o budismo suscitaram reações. Mas aqueles que deram difusão ampla a essas afirmações eram estrangeiros que vieram se instalar no país. Foram eles que deram grande destaque nos jornais do Sri Lanka à notícia de que o Papa havia atacado o budismo nesse livro. Eram artigos que inflamavam as tensões, ainda que muitas pessoas nem tivessem lido o livro do Papa. Mas um monge budista que eu conhecia escreveu no principal jornal de língua inglesa do Sri Lanka, o Daily News, um artigo em que defendia o Santo Padre. Esse monge escreveu que, segundo as indicações de Buda, todos os ensinamentos deveriam ser submetidos à crítica, inclusive os seus. E, portanto, o Papa tinha todo o direito de dizer o que achava negativo na religião budista. Paradoxalmente, foram mais alguns teólogos católicos que criticaram o Papa do que os próprios budistas. Mais ou menos o mesmo aconteceu com a Dominus Iesus: os ataques maiores vieram dos teólogos católicos e não dos outros. Muitas vezes, nessas coisas, nós nos deixamos guiar por nossas emoções, mais que por uma análise dos fatos. E assim se criam situações antipáticas e inúteis.


De qualquer forma, durante a visita de João Paulo II ao Sri Lanka de janeiro de 1995 os líderes budistas não participaram do encontro com o Papa...
RANJITH:
Os líderes não, mas muitos e muitos fiéis budistas participaram do encontro com alegria. Devo especificar que o altar principal no qual o Papa celebrou a santa missa, na esplanada de Galle Face, foi desenhado e construído por um monge budista, nosso amigo, que dessa forma se recusou a ser instrumentalizado pelos outros.

Padre Ranjith durante um encontro de promoção da infância missionária, quando era diretor das Pontifícias Obras Missionárias do Sri Lanka

Voltemos à atualidade. Como o senhor avalia a tentativa de introduzir leis anticonversão em seu país?
RANJITH:
Antes de mais nada, nós, cristãos, dizemos claramente à maioria budista que não é nosso desejo subverter as tradições religiosas e culturais em que se reconhece a maioria do povo do Sri Lanka. Além do mais, mesmo que uma lei desse tipo seja aprovada, as conseqüências poderão não ser totalmente negativas. Isso significará que o Senhor quer pôr à prova a nossa fé, e não duvido que com Sua ajuda a fé do nosso povo cristão se reforçará.


Em 1º de outubro de 2001 veio a público a sua nomeação a secretário adjunto de Propaganda Fide. Que recordação o senhor tem desse chamado a Roma?
RANJITH:
Em 1995, além de bispo de Ratnapura, eu me tornei também secretário-geral da Conferência Episcopal e presidente da Comissão Episcopal para a Justiça e a Paz. Com o vice-presidente dessa Comissão, o bispo de Mannar, Joseph Rayappu, de etnia tâmil, trabalhei muito para levar o governo de Colombo e os Tigres tâmil à mesa de negociações que conduziram ao cessar-fogo, rompido, infelizmente, justamente nos últimos meses. Lembro-me que conseguimos levar 26 monges budistas à região controlada pelos tâmil para tentar romper a hostilidade que os budistas e os tâmil alimentavam mutuamente em razão das atrocidades cometidas por ambos no passado. O encontro entre os dois grupos foi uma experiência muito feliz. Bem no momento em que eu estava muito empenhado nessas iniciativas de paz, o núncio apostólico me telefonou, anunciando a decisão do Papa de me nomear secretário adjunto de Propaganda Fide e perguntando se eu acataria essa solicitação. Diante do desejo do Papa, eu disse sim. Dessa forma, fui para Roma desenvolver minha missão na Congregação dirigida pelo cardeal Crescenzio Sepe.


Na qual ficou durante cinco anos.
RANJITH:
Foi um período muito interessante. Para mim foi um pouco uma continuação do trabalho que eu já havia desenvolvido na qualidade de diretor das Pontifícias Obras Missionárias no Sri Lanka. Foram quase dois anos nos quais procurei ser o mais autêntico, leal e sincero possível no meu trabalho. Tentei valorizar ao máximo o papel dos diretores nacionais das Pontifícias Obras Missionárias nas várias Igrejas locais, e preservar a transparência absoluta em todas as delicadas questões financeiras que estavam relacionadas com essas obras.


Em 29 de abril de 2004 veio a público a sua nomeação a núncio apostólico na Indonésia e no Timor Leste.
RANJITH:
Depois de um período de reflexão, me pediram que me tornasse núncio apostólico. Aceitei com grande interesse, mesmo sendo uma experiência nova, num campo que ainda era misterioso para mim. Como bispo, eu havia colaborado com a nunciatura de Colombo, mas não havia recebido a formação especial que os núncios têm. Eu diria que foi uma experiência muito rica e que procurei estar próximo daquela Igreja e de seus pastores e manifestar, dessa forma, a proximidade do Santo Padre.


Foi justamente quando o senhor estava em Jacarta que ocorreu o terrível tsunami que arrasou o Sudeste asiático. Como o senhor viveu essa experiência?
RANJITH:
Naqueles dias, um de meus mais queridos amigos, o arcebispo de Viena, cardeal Christoph Schönborn, estava comigo. Quando soubemos da tragédia, abandonamos a programação que havíamos estabelecido para a visita dele e fomos para Banda Aceh. Foi uma viagem extremamente difícil, mas conseguimos chegar a visitar as regiões atingidas. Foi um espetáculo terrível: morte e destruição por todos os lados. Passamos dois dias como missionários, dormindo em alojamentos improvisados, sem água corrente nem luz. Mas ficamos contentes por poder estar próximos da pequena comunidade católica de Banda Aceh e também da ilha de Nias. A voz do cardeal Schönborn, que, de lá, narrava a sua experiência às rádios e TVs européias, foi também determinante para a solidariedade que recebemos de todas as partes do mundo. Depois, por intermédio da rede da Cáritas e da ajuda da Santa Sé, conseguimos estabelecer um programa de ajuda sólida para aquelas populações. A Cáritas indonésia estava inativa; com a ajuda do cardeal arcebispo de Jacarta e da Cáritas Internacional, conseguimos reativar esse organismo eclesial e estabelecer projetos de ajuda para a reconstrução daquelas regiões. Lembro-me de que participamos de reuniões intermináveis, mas importantes, graças às quais pudemos dar nossa contribuição como Igreja Católica às populações atingidas por essa imensa tragédia.


Pouco antes da sua nomeação a núncio, o L’Osservatore Romano de 26-27 de abril de 2004 publicou um artigo seu comentando a instrução Redemptionis Sacramentum, “sobre algumas coisas que se devem observar e evitar acerca da Santíssima Eucaristia”, publicada pouco tempo antes pela Congregação para o Culto Divino, em parceria com a Congregação para a Doutrina da Fé...
RANJITH:
Escrevi esse artigo a pedido do prefeito da Congregação para o Culto Divino, cardeal Francis Arinze. Eu tinha achado a Redemptionis Sacramentum muito útil e necessária, e por isso fiquei muito contente em comentá-la.


Foi um artigo por assim dizer profético, visto o cargo que o senhor hoje exerce...
RANJITH:
Não sei. Mas, como já disse, sempre me interessei pela liturgia, sobretudo em seus aspectos pastorais, e sempre busquei ler e me atualizar a respeito desses aspectos. Eu me lembro de que, quando encontrava o então cardeal Ratzinger, nas nossas conversas muitas vezes acabávamos falando de liturgia.


Como o senhor conheceu o cardeal Joseph Ratzinger?
RANJITH:
Foi graças a uma questão relacionada ao Sri Lanka, a do teólogo Tissa Balasuriya, que havia escrito um livro, Mary and human liberation, no qual era feita uma análise teológica que dificilmente poderia ser considerada compatível com a doutrina católica. Na época, eu era um jovem bispo recém-nomeado, me interessei por esse livro e coordenei uma comissão episcopal criada especialmente para estudá-lo. Em 1994, quando se concluíram os trabalhos dessa comissão, a Conferência Episcopal emitiu um comunicado pelo qual os fiéis eram avisados de que o livro não refletia a doutrina da Igreja. Esse comunicado desencadeou uma campanha na imprensa mundial contra nós e em favor do padre Balasuriya. A controvérsia foi tão forte, que até Roma começou a investigar. E assim fui chamado à Urbe para explicar o que estava acontecendo ao Papa e ao prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o cardeal Ratzinger. As afirmações do padre Balasuriya eram tão graves, que em janeiro de 1997 foram formalmente condenadas pela Congregação, e ele mesmo, não as tendo retirado, sofreu a excomunhão latae sententiae. Essa excomunhão foi revogada no ano seguinte, depois de uma solene declaração pública do próprio padre Balasuriya.


Foi nesse contexto, então, que começou a sua convivência com o cardeal Ratzinger...
RANJITH:
Sim, eu o encontrei diversas vezes e nessas ocasiões tinha a oportunidade de esclarecer a ele as minhas impressões e as minhas preocupações, enquanto bispo, especialmente a respeito da questão do diálogo inter-religioso e também das questões litúrgicas. Quando, mais tarde, fui chamado a Propaganda Fide, tive a oportunidade de encontrar o cardeal Ratzinger com maior freqüência, também durante as reuniões ordinárias desse organismo, do qual ele também era membro. Assim, além de ser um ávido leitor de seus livros, aprendi a apreciar pessoalmente também seus dotes humanos. Vi sempre nele um grande teólogo e, em suas palavras, não um pedante, mas essencialmente uma pessoa próxima do Senhor.


Dessa forma, o senhor ficou pouco menos de dois anos em Jacarta. Em 10 de dezembro de 2005, foi publicada sua nomeação a secretário do Culto Divino. O senhor esperava esse novo chamado a Roma?
RANJITH:
Eu me lembro de que Bento XVI me chamou em audiência a Castel Gandolfo durante o verão de 2005, em meados de setembro, e me perguntou se eu aceitaria a nomeação a secretário da Congregação para o Culto Divino. Eu disse que sim. Sempre me interessei pela liturgia, que sempre considerei a chave da relação entre a fé e a vida, pois da maneira como é celebrada a liturgia é também vivida a fé cristã. A liturgia, por um lado, exterioriza a fé, e, por outro, a alimenta. Poder dar minha contribuição sobre esse ponto, ainda que modesta, sabendo como ele é caro ao papa Bento, encheu meu coração de alegria.

Albert Ranjith com padre Uwe Michael Lang, autor do livro Rivolti al Signore. L’orientamento nella preghiera liturgica, Sena, ed. Cantagalli, por ocasião da apresentação da obra, em 27 de abril de 2006

Excelência, sua primeira aparição pública como secretário da Congregação para o Culto Divino foi uma conferência proferida por ocasião da apresentação do livro de Uwe Michael Lang, oratoriano de origem alemã residente em Londres, Rivolti al Signore. L’orientamento della preghiera liturgica (Sena, Cantagalli, 2006, 150 pp.), realizada em 27 de abril no Instituto Patrístico Augustinianum de Roma. O livro, publicado em alemão em 2003, contém um prefácio do então cardeal Joseph Ratzinger, publicado pela primeira vez em italiano na edição de março de 2004 de 30Dias. O que mais o impressionou nesse livro?
RANJITH:
Eu já havia lido esse livro e o belíssimo prefácio do então cardeal Ratzinger. Assim, quando recebi o convite, aceitei logo. Foi uma oportunidade para proporcionar um debate muito positivo na Igreja. Fala-se muito de participação dos fiéis na liturgia. Mas os fiéis participam mais quando o sacerdote celebra versus populum ou quando celebra voltado para o altar? De fato, não se pode dizer que essa participação é mais ativa quando o padre celebra voltado para o povo; pode acontecer que nesse caso o povo se distraia. Da mesma forma, a participação é verdadeira quando o abraço da paz cria uma grande confusão na igreja, com os sacerdotes indo às vezes cumprimentar até as últimas fileiras? Essa é a actuosa participatio, desejada pelo Concílio Vaticano II, ou simplesmente uma grande distração que não ajuda em nada a acompanhar com devoção o momento seguinte da missa (para não falar que às vezes se esquece até de dizer o Agnus Dei...)? Repito, o livro de padre Lang foi e é uma provocação extremamente útil, a começar pela introdução, na qual o cardeal Ratzinger lembra que o Concílio nunca pediu que se abolisse o latim, nem que se revolucionasse a direção da oração litúrgica...


Uma entrevista sua à Croix de 25 de junho, intitulada “A reforma litúrgica do Vaticano II nunca decolou”, provocou um grande burburinho. O senhor pode explicar melhor seus juízos sobre a reforma litúrgica posta em prática depois do Concílio Vaticano II?
RANJITH:
Essas palavras foram retiradas do seu contexto. Não é que eu tenha avaliado negativamente tudo o que ocorreu depois do Concílio. O que eu disse foi que o resultado esperado pela reforma litúrgica não se manifestou. Nós nos perguntamos se a vida litúrgica, a participação dos fiéis nos ritos sagrados, é mais alta e melhor hoje do que a que se dava na década de 1950. Criticava-se o fato de que, antes do Concílio, os fiéis não participavam realmente da missa, mas a assistiam passivamente ou praticavam devoções pessoais. Mas os fiéis hoje participam mesmo de um modo espiritualmente mais elevado e pessoal? Aconteceu mesmo que muitas pessoas que estavam fora da Igreja começaram a fazer fila para entrar nas nossas igrejas depois das novas liturgias? Ou será que não aconteceu justamente o contrário, que muitos foram embora e que as igrejas se esvaziaram? De que reforma estamos falando, então?


Culpa da secularização...
RANJITH:
Certamente, mas essa situação é também fruto da maneira como foi tratada, ou melhor, maltratada a liturgia... Na prática, a meu ver, as sacrossantas expectativas do Concílio de uma liturgia mais bem compreendida e portanto espiritualmente mais fecunda receberam uma resposta ainda mais decepcionante. Portanto, há ainda muito o que fazer, a fim de que as igrejas se encham de novos de fiéis que se sintam realmente tocados pela graça do Senhor durante as sagradas liturgias. Num mundo secularizado, em vez de procurar elevar os corações para a grandeza do Senhor, procurou-se muito mais, eu acredito, rebaixar os mistérios divinos a um nível banal.

Albert Ranjith, recém-ordenado bispo auxiliar de Colombo, é recebido em sua paróquia de origem

Quando o senhor foi nomeado secretário para o Culto Divino, escreveram que tinha ótimas relações com o mundo lefebvriano. Isso corresponde à verdade?
RANJITH:
Não conheci dom Marcel Lefebvre em razão da nossa diferença de idade, pois ele é de uma outra geração. Mas certamente tive algum contato com alguns de seus seguidores. Mas não sou um apaixonado pelos lefebvrianos. Infelizmente, ainda não voltaram à plena comunhão com a Santa Sé, mas às vezes quando falam sobre a liturgia é evidente que estão cobertos de razão. E por isso são uma provocação que nos deve fazer refletir sobre o que estamos fazendo. Isso não significa que posso ser definido um adepto ou um amigo dos lefebvrianos. Compartilho alguns pontos defendidos pelos chamados militantes antiglobalização com relação à justiça social, mas isso não significa que sou um adepto deles... Por outro lado, a missa tridentina não é propriedade privada dos lefebvrianos. Ela é um tesouro da Igreja e de nós todos. Como o Papa disse à Cúria Romana no ano passado, o Concílio Vaticano II não é um momento de ruptura, mas de renovação na continuidade. Não se joga fora o passado, mas se cresce sobre ele.


Isso significa que a chamada missa de São Pio V, na realidade, nunca foi abolida?
RANJITH:
O fato de a Santa Sé ter recentemente aprovado a instituição, em Bordeaux, de uma sociedade de vida apostólica de direito pontifício caracterizada por usar exclusivamente os livros litúrgicos pré-conciliares [o Instituto do Bom Pastor, no qual se reuniram alguns “ex-lefebvrianos”, ndr.], significa de maneira inequívoca que a missa de São Pio V não pode ser considerada abolida pelo novo missal chamado de Paulo VI.

Fonte: http://www.30giorni.it/br/articolo.asp?id=11298

domingo, 26 de outubro de 2008

As três vias e as três conversões - Reginald Garrigou Lagrange

Capítulo V

Características de cada fase da vida espiritual

"Justum deduxit Dominus per vias rectas

O Senhor conduz o justo por caminhos retos"

(Sab. X,10)

Vimos as concepções que foram propostas para as três fases da vida espiritual, e especialmente aquela que se apresenta como a mais tradicional. Após haver dito qual a analogia que existe entre estas três fases da vida da alma e as do corpo (infância, adolescência e idade adulta), fizemos notar particularmente como a transição de uma fase espiritual para a outra se faz por momentos dificeís, que relembram aquilo que, na ordem natural, sedá com a crise que acontece aos quatorze ou quinze anos e a da primeira liberdade do adolescente que chega à idade adulta, por volta dos vinte e um anos. Vimos, também, como estas diferentes fases da vida interior correspondem às que se notam na vida dos Apóstolos.

Queremos agora, sob este ângulo de visão e segundo princípios de Santo Tomás e São João da Cruz, descrever brevemente o que constitui cada uma destas três fases dos principiantes, dos avançados e dos perfeitos, a fim de mostrar os momentos sucessivos de uma evolução verdadeiramente normal que, ao mesmo tempo, corresponde à divisão das duas partes da alma (os sentidos e o espírito) e à natureza da graça das virtudes e dos dons, que vivifica a alma cada vez mais, eleva suas faculdades inferiores e superiores, até que o fundo da alma (1) seja purificado de todo egoísmo ou amor próprio e assim se torne todo de DEUS, verdadeiramente e em ilusão. Como veremos, há nisto uma admirável sequência lógica; é a lógica da vida, cuja necesidade é comandada pelo fim último;

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A fase dos principiantes

A primeira conversão é a passagem do estado de pecado ao estado de graça, quer pelo batismo, quer pela contrição e pela absolvição, se a inocência batismal não houver sido conservada. No Tratado da Graça, a teologia explica detalhadamente o que é a justificação nos adultos, como e porque ela requer, sob o influxo graça, os atos de fé, de esperança, de caridade e de contrição detestação do pecado cometido (2). Esta purificação pela infusão da graça habitual e a remissão dos pecados é, num sentido, o tipo o esboço das purificações futuras, que também comportarão atos de 3 de esperança, de caridade e de contrição. Muitas vezes, esta primeira conversão acontece após uma crise mais ou menos dolorosa, na qual a pessoa se separa progressivamente do espírito do mundo, como o filho pródigo, para voltar a Deus. É o Senhor quem dá o primeiro passo em nossa direção, como sempre ensinou a Igreja em oposição ao semipelagianismo (3), é Ele que nos inspira o bom movimento,' boa vontade inicial, que é o começo da salvação. Para isso, pela graça atual e pela provação, de certo modo Ele trabalha nossa alma antes de nela depositar a semente divina; faz nela um primeiro sulco, sobre o qual voltará mais tarde aprofundando-o cada vez mais, a fim de extirpar as raizes más que tenham ficado, como o vinhateiro que liberta a videira já crescida de tudo o que possa impedir seu desenvolvimento

Depois desta primeira conversão, se a alma em estado de graça não recai mais em pecado, ou se pelo menos logo se levanta afim de caminhar para a frente (4), então estará na via purgativa dos principiantes.

A mentalidade ou estado de alma do principiante pode ser descrita, observando nele sobretudo o que há de essencial na ordem do bem: o conhecimento de Deus e de si mesmo e o amor a Deus. É certo que há principiantes particularmente favorecidos, como os grandes santos que, logo no início, tiveram um grau de graça bem mais elevado do que muitos dos principiantes; assim também, sob o ponto de vista natural, existem prodígios infantis que, todavia, continuam crianças, e então sabe-se em que consiste geralmente a mentalidade daqueles que se iniciam. Começam a conhecer-se a si mesmos, a ver sua miséria, sua indigência e a cada dia devem examinar atentamente a própria consciência a fim de se corrigirem. Ao mesmo tempo, começam a conhecer a Deus no espelho das coisas sensíveis, das coisas da natureza ou das parábolas, por exemplo nas do Filho Pródigo, da Ovelha Perdida e do Bom Pastor. É o movi­mento certo de elevação a Deus, lembrando a andorinha que se eleva da terra para o céu com gritos (5). Neste estado há um amor de Deus proporcionado; os principiantes verdadeiramente generosos amam o Senhor com um santo temor do pecado, temor que os faz fugir do pecado mortal e até do pecado venial deliberado e isto pela morti­ficação dos sentidos e das paixões desregradas, isto é, da concupis­cência da carne e a dos olhos e do orgulho.

Depois de certo tempo desta generosa luta, os principiantes de hábito recebem, como recompensa, consolações sensíveis na oração e também no estudo das coisas divinas. O Senhor faz assim a con­quista da sua sensibilidade, pela qual sobretudo vivem eles; o Senhor os afasta das coisas perigosas e os atrai para si. Neste momento o principiante generoso já ama a Deus «de todo o coração», mas ainda não de toda sua alma ou com todas as suas forças, nem de todo o seu entendimento. Os autores espirituais falam frequentemente do leite da consolação que então lhes é dado. O próprio São Paulo diz (I Cor., 3,2): «Não é como a homens espirituais que vos pude falar, rnas sim como a homens carnais, como a crianças em Cristo. Eu lhes dei leite para be­ber, não alimento sólido, pois ainda não sois capazes de o absorver».

Mas então, o que é que acontece geralmente? Quase todos os principiantes, ao receberem estas consolações sensíveis, comprazem-se demasiadamente nelas, como se elas fossem um fim e não um meio. Dentro de pouco tempo elas se tornam um obstáculo, oca­sião de gula espiritual, de curiosidade no estudo das coisas divinas, de orgulho inconsciente, manifestado quando o principiante fala de­las a todo momento, sob pretexto de apostolado, como se ele já as dominasse. Reaparecem - diz São João da Cruz (Noite Obscura, L.I caps.l a 7) - os sete pecados capitais, não mais sob sua forma gros­seira, mas na ordem das coisas espirituais, como novos obstáculos à verdadeira e sólida piedade.

Em consequência, tem-se nada de mais lógico e mais vital como transição, uma segunda conversão é necessária, aquela descrita por São João da Cruz sob a denominação de purificação passiva dos sentidos, «comum ao maior número de principiantes» (Noite Obscura. Li cap. 8), para introduzi-los «na via íluminativa dos avançados, em que Deus nutre a alma pela contemplação infusa (id, cap. 14). Esta purificação se manifesta por uma aridez sensível e prolongada, na qual o principiante é privado das consolações sensíveis em que tanto se comprazia. Se nesta aridez houver um vivo desejo de Deus, de seu reino em nós e o temor de o ofender, caracteriza-se um segundo sinal da existência de uma purificação feita por Deus. E mais ame se a este vivo desejo de Deus juntar-se a dificuldade na oração ou de fazer considerações múltiplas e raciocinadas e passara prevalecer uma inclinação simples a olhar para o Senhor com amor (Noite Obscura, cap. 9). Este é o terceiro sinal, que indica estar consumada a segunda conversão e que a alma está elevada a uma forma de vida superior, precisamente a via iluminativa.

Se a alma suporta bem esta purificação, sua sensibilidade submete cada vez mais ao espírito; a alma está curada da gula espiritual, da soberba que a levaria a posar como mestra nos assuntos espirituais; aprende assim a melhor conhecer sua própria indigência. Não é raro que então apareçam outras dificuldades purificadoras, exemplo, no estudo, na prática dos diversos deveres de estado, nas relações com as pessoas às quais a alma estava demasiado apegada e que o Senhor algumas vezes afasta repentina e dolorosamente. Neste período, surgem com muita frequência fortes tentações contra a castidade e a paciência, permitidas por Deus a fim de que, por uma vigorosa reação, estas virtudes, que têm sua sede na sensibilidade, se fortifiquem e se fixem realmente em nós. Também podem aparecer doenças para nos provar.

Nesta crise, o Senhor trabalha novamente a alma, aprofunda ainda mais o sulco que havia feito no momento da justificação ou primeira conversão; Ele extirpa as raízes ruins e os restos do pecado <<relíquias peccati>>.

Certamente esta crise não ocorre sem perigo, exatamente como na ordem natural a crise dos catorze ou quinze anos. Alguns nessa ocasião se mostram infiéis à sua vocação. Muitos não atravessam esta prova de modo a poderem entrar na via Íluminativa dos avançados e ficam num certo estado de tibieza; com propriedade, diga-se que não são mais verdadeiros principiantes, mas antes almas retardadas ou enfraquecidas. Em certo sentido, nelas se realizam as palavras da Sagrada Escritura: «não perceberam o tempo da visita do Senhor» (6) na hora da sua segunda conversão. Estas almas, principalmente se estão na vida sacerdotal ou religiosa, não tendem à perfeição tanto como deveriam; sem perceber, elas também paralisam muitas outras e se tornam um penoso obstáculo àquelas que verdadeiramente queriam avançar. Assim, muitas vezes a oração comum em vez de se tornar contemplativa se materializa, tornando-se mecânica; em vez de transportar as almas, são as almas que a carregam; infelizmente pode chegar até a se tornar anticontemplativa.

Ao contrário, naqueles que atravessam esta crise com proveito, (segundo São João da Cruz (Noite obscura L.i cap. 14), ela aparece como o começo da contemplação infusa dos mistérios da fé, acompanhada pelo vivo desejo da perfeição. Então, principalmente sob a luz do dom da sabedoria (7), o principiante que se torna um avançado e entra na via iluminativa conhece muito melhor sua própria miséria, a futilidade das coisas do mundo, da procura das honras e das dignidades; ele se desliga destes obstáculos; é preciso que «dê o passo», como diz o Pé. Lallemant, para entrar na via iluminaíiva. É como uma vida nova que começa, como uma criança que se torna adolescente.

É verdade que esta purificação passiva dos sentidos, mesmo para aqueles que nela entram, é mais ou menos manifesta e também mais ou menos bem suportada. São João da Cruz (Noite Obscura, L I, j cap. 9 fim) já o notou, quando fala daqueles que se mostram menos generosos: «Para eles, a noite de secura dos sentidos é frequentemente interrompida. De vez em quando ela aparece e desaparece; algumas vezes a meditação dedutiva é impossível, outras vezes torna-se facílima... Eles não chegam nunca a frustrar os sentidos de modo a fazer abandonar as considerações e os argumentos; não têm esta graça senão de forma intermitente». Pode-se dizer que têm uma via iluminativa diminuída. São João da Cruz o explica melhor mais adiante (8), atribuindo esta circunstância a falta de generosidade por parte deles: «É preciso explicar aqui porque há tão poucos que conseguem este elevado estado de perfeição e de união com Deus. Não é porque Deus queira limitar esta graça a um pequeno numere de almas superiores, seu desejo é que a alta perfeição seja comum a todos... Ele envia pequenas provações a uma alma e esta se mostra fraca, fugindo imediatamente a todo sofrimento, sem querer aceitar dor alguma... Deus então deixa de atuar para purificar esta alma.., que quer ser perfeita recusando-se deixa-se levar pelo caminho das provações que forma os perfeitos».

Tal é a transição mais ou menos generosa a uma forma de vida superior. Até aqui foi fácil ver a sequência lógica e vital das fases pelas quais a alma deve passar. Não se trata de uma justaposição mecânica de fases sucessivas, mas sim do desenvolvimento orgânico da vida.

Extraído do livro, "As três vias e as três conversões", Reginald Garrigou Lagrange, Editora Permanência

Notas:

1)Esta expressão, preferida por Tauler, tem o mesmo sentido que «cume da alma». É apenas a metáfora que muda, conforme sejam consideradas as coisas sensíveis, como exteriores ou como interiores.

2) Cf. o Concilio de Trento, sessão VI cap. 6 (Denzinger n° 798), e Santo Tomás, l-Ilaeq.113 a.l até a.8 inclusive.

3) Cf. Concilio de Orange (Denzinger n°s 176, 178 eseg.).

4) Santo Tomás explica (IJIa q.89 a.5 ad 3) que o ressurgimento é proporcional ao fervor da contrição; quer dizer, se alguém possuía dois talentos antes de pecar mor­talmente e tem apenas uma contrição suficiente, mas relativamente fraca, talvez só recupere um talento (Resurgit in minore caritate); para que recobre o mesmo grau de graça e de caridade que havia perdido, será necessária uma contrição mais fervorosa e proporcional à falta e ao grau da graça perdida.

5) Algumas vezes, o principiante considera também a bondade divina nos mis­térios da salvação, mas ainda não está familiarizado com eles, pois isto não é próprio de seu estado.

6) Lucas 19,44; Jeremias 50, 31; SI.94, 8; Hebr.3, 8; 15, 4e7.

7) Cf. Sanlo Tomás II-II ae q.9 a.4.

8) Viva Chama, 2 estrofe, verso V - item Cântico Espiritual. IV P, estrofe 39, desde o começo.

sábado, 25 de outubro de 2008

Singulari Quadam

CARTA ENCÍCLICA

DO SUMO PONTÍFICE

SÃO PIO X

SOBRE ORGANIZAÇÕES DE TRABALHO

Para Nosso Filho Amado, George Kopp, Padre Cardeal da Santa Igreja Romana, Bispo de Breslau, e para os outros Arcebispos e Bispos da Alemanha.

Filhos amados e Veneráveis Irmãos, Saúde e a Bênção Apostólica.

1.Nós somos movidos por sentimentos particularmente afetuosos e benevolentes em direção aos Católicos da Alemanha, que são mais lealmente e obedientemente dedicados a Sé Apostólica e acostumados a batalhar generosamente e valentemente em nome da Igreja. Nós então nos sentimos compelidos, Veneráveis Irmãos, a dedicar Nossa força e completa atenção à discussão daquele assunto que surgiu entre eles sobre as associações de trabalhadores. Relativo a esse problema, vários de vocês, como também qualificados e respeitados representantes de ambos os pontos de vista, já Nos informaram repetidamente durante os anos passados. Cientes de Nosso Ministério Apostólico, Nós estudamos este problema mais diligentemente. Nós entendemos totalmente que Nosso dever sagrado é trabalhar incessantemente para que Nossos filhos amados possam preservar o ensinamento católico não adulterado e incólume, de não permitindo de nenhuma maneira que sua Fé seja posta em perigo.

Se eles não forem persuadidos a tempo para ficar em guarda, eles obviamente iriam, gradualmente e inadvertidamente, cair no perigo de se satisfazer com uma forma vaga e indefinida de religião Cristã que tem sido ultimamente designada como intercredo. Isso não é nada além de uma recomendação vazia de um Cristianismo generalizado. Obviamente, nada é mais ao contrário aos ensinamentos de Jesus Cristo. De mais a mais, posto que Nosso desejo mais ardente é a promoção e fortificação da concórdia entre os Católicos, Nós constantemente tentamos remover todas aquelas ocasiões de disputas que dissipam a força de homens de boa vontade e que serão vantajosas apenas para os inimigos da religião. Finalmente, Nós desejamos e pretendemos que o fiel viva com seus concidadãos não-católicos naquela paz sem a qual nem a ordem de sociedade humana nem o bem-estar do Estado pode suportar.

Se, porém, como Nós já dissemos, a existência dessa questão era por Nós conhecida, achamos, todavia, sábio obter cada uma de suas opiniões, Veneráveis Irmãos, antes de anunciarmos Nossa decisão. Vocês têm respondido a Nossas questões com aquela consciência e diligência que a seriedade da questão exige.

2. Conseqüentemente, Nós, em primeiro lugar, declaramos que todo Católico tem um dever sagrado e inviolável, tanto na vida particular quanto pública, de obedecer e firmemente aderir e corajosamente professar os princípios de verdade Cristã enunciados pelo Magistério da Igreja Católica. Em particular, Nós queremos afirmar aqueles princípios que Nosso Predecessor colocou com sabedoria na carta encíclica "Rerum Novarum." Nós sabemos que os Bispos de Prússia seguiram-nos mais fielmente em suas deliberações no Congresso de Fulda de 1900. Vocês mesmos resumiram as idéias fundamentais destes princípios em suas comunicações relativas a essa questão.

3. Estes são princípios fundamentais: Não importa o que o cristão faz, mesmo no domínio dos bens temporais, ele não pode ignorar o bem sobrenatural. Particularmente, de acordo com as ordens de filosofia Cristã, ele deve ordenar todas as coisas para o último fim, isto é, o Bem Mais alto. Todas as suas ações, enquanto moralmente boas ou más (quer dizer, se elas estão de acordo ou não com a lei natural e divina), estão sujeitas ao julgamento da Igreja. Todo aquele que gloriar-se do nome de cristão, individualmente ou coletivamente, e desejam permanecer fiel a sua vocação, não pode encorajar inimizades e dissensões entre as classes de sociedade civil. Pelo contrário, eles devem promover acordo e caridade mútua. A questão social e suas controvérsias associadas, como a natureza e duração de trabalho, o salário a ser pago, greves dos trabalhadores, não são simplesmente econômicas em caráter. Portanto, elas não podem ser colocadas à parte da autoridade eclesiástica. "O exatamente oposto é a verdade. É, primeiro de tudo, moral e religioso, e por essa razão sua solução é ser esperada principalmente da lei moral e dos pronunciamentos da religião."[1]

4. Agora, relativamente a associações dos trabalhadores, muito embora seu propósito seja obter vantagens terrenas para seus membros, apesar disso, estas associações são para ser mais aprovadas e consideradas como mais úteis para a vantagem genuína e permanente de seus membros que são principalmente estabelecidas no fundamento da religião católica e abertamente seguem as diretivas da Igreja. Nós repetimos essa declaração em várias ocasiões anteriores em resposta aos questionamentos de vários países. Conseqüentemente, tais assim-chamadas associações confessionais católicas devem certamente ser estabelecidas e promovidas em todas as direções, em regiões católicas, como também em todos outros distritos onde pode ser presumido que elas suficientemente possam ajudar as várias necessidades de seus membros. Porém, se houvesse uma questão sobre associações que diretamente ou indiretamente tangem à esfera da religião e moralidade, não seria permitido encorajar e espalhar organizações misturadas, isto é, associações compostas de Católicos e Não-Católicos, nas áreas já mencionadas. Além de outros assuntos, em tais organizações existem ou certamente podem existir sérios perigos para nosso povo, para a integridade de sua fé e a obediência aos mandamentos e preceitos da Igreja católica. Veneráveis Irmãos, você mesmos também abertamente chamaram atenção a essa questão em várias de suas respostas que Nós temos lido.

5. Nós, portanto, dispensamos louvores sobre cada e todas as associações de trabalhadores estritamente católicas existentes na Alemanha. Nós desejamos a eles todo sucesso em todos seus esforços em benefício do povo trabalhador, desejando que elas venham a apreciar um crescimento constante. Porém, ao dizer isso, Nós não negamos que os Católicos, em seus esforços para melhorar as condições de vida dos trabalhadores, distribuição mais eqüitativa de salários, e outros justos benefícios, tenham um direito, desde que eles o exercitem com a devida precaução, de colaborar com não-Católicos para o bem comum. Para um tal propósito, porém, Nós preferimos ver as associações católicas e não-católicas unirem forças rumo a nova e oportuna instituição conhecida como cartel.

6. Não poucos de vocês, Veneráveis Irmãos, Nos perguntaram se é permissível tolerar os denominados Sindicatos Cristãos que agora existem em suas dioceses, posto que, por um lado, eles têm um número consideravelmente maior de membros que as associações puramente católicas e, por outro lado, se a permissão fosse negada sérios prejuízos resultariam. Devido às circunstâncias particulares dos assuntos católicos na Alemanha, Nós acreditamos que Nós deveríamos acatar esse pedido. Além disso, Nós declaramos que tais associações misturadas como agora existem dentro de suas dioceses podem ser toleradas e os Católicos podem ter permissão de se juntar a elas, enquanto tal tolerância não deixar de ser apropriada ou permissível por causa de nova e alteradas condições. Precauções necessárias, porém, devem ser adotadas a fim de evitar os perigos que, como já foi mencionado, acompanhem tais associações.

A seguir estão as mais importantes destas precauções: Em primeiro lugar, deveria ser produzida uma condição àqueles trabalhadores católicos que são membros dos sindicatos deverem também pertencer àquelas associações católicas que são conhecidas como "Arbeitervereine". Em relação a eles deverem fazer um pouco de sacrifício para essa causa, mesmo financeiramente, Nós estamos seguros que eles farão isso prontamente pelo objetivo de proteção da integridade de sua Fé. Como felizmente demonstrado, as associações de trabalhadores católicos, ajudadas pelo clero e por sua liderança e sua vigilante direção, estão aptas a alcançar muito para preservar as verdades da religião e a pureza da moralidade entre seus membros, e que nutram o espírito religioso por práticas freqüentes de devoção. Portanto, os líderes de tais associações, claramente reconhecendo as carências da época, estão indubitavelmente preparados para instruir os trabalhadores sobre seus deveres de justiça e caridade, especialmente relativos a todas aquelas ordens e preceitos em que um conhecimento preciso é necessário ou útil a fim de capacitar-lhes a tomar uma parte ativa em seus sindicatos, de acordo com os princípios da doutrina católica.

7. Além disso, se os Católicos estão para ser permitidos juntar-se a os sindicatos, estas associações devem evitar tudo que não está de acordo, seja em princípio ou prática, com os ensinamentos e mandamentos da Igreja ou as próprias autoridades eclesiásticas. Similarmente, tudo é para ser evitado em sua literatura ou discursos ou ações que na visão acima incorreria em censura.

Os Bispos, portanto, deveriam considerar isto em seu dever sagrado de observar cuidadosamente a conduta de todas estas associações e observar diligentemente para que os membros católicos não sofram qualquer dano como resultado de sua participação. Os próprios membros católicos, porém, jamais deveriam permitir as uniões, se por causa de interesses materiais de seus membros ou pela causa da união como tal, proclamar ou apoiar ensinamentos ou tomar parte em atividades que venham a conflitar de qualquer forma com as diretrizes proclamadas pelo Magistério supremo da Igreja, especialmente aquelas mencionadas acima. Portanto, de acordo com problemas que aparecem relativos a matérias de justiça ou caridade, os Bispos deviam tomar o maior cuidado em verificar se o fiel não omite o ensino moral católico e não despede-se dele mesmo até a distância de um dedo.

8. Nós estamos seguros, Veneráveis Irmãos, que vocês cuidarão diligentemente de verificar que todas essas Nossas diretrizes sejam conscienciosamente e exatamente cumpridas, reportando cuidadosamente e constantemente para Nós concernindo este problema muito sério. Desde que Nós tomamos este assunto sob Nossa jurisdição e, depois de ouvir as visões dos Bispos, posto que a decisão Nos concerne, por meio disso, mandamos todos Católicos de boa vontade desistir de todas as disputas entre eles mesmos relativas a este assunto. Nós estamos confiantes que com caridade fraterna e obediência perfeita eles cumprirão completamente e alegremente Nosso comando. Se qualquer dificuldade adicional surgir entre eles, eles deveriam buscar sua solução da seguinte maneira: Deixe-os primeiro voltar-se a seus Bispos para conselho, e então submeta a matéria à Sé Apostólica para decisão.

Há mais um ponto a considerar, e ele já estava implicado no que foi dito. Por um lado, ninguém podia acusar de má fé e, sob tal pretexto, produzir hostilidade àqueles que, enquanto defendendo firmemente os ensinamentos e direitos da Igreja, apesar das boas razões de terem se juntado ou desejar se juntar a associações de trabalho misturadas naqueles lugares onde, sob certas proteções, a autoridade eclesiástica permitiu devido a condições locais. Por outro lado, igualmente seria mais repreensível opor ou atacar as puramente associações católicas (este tipo de associação deve, pelo contrário, ser apoiada e promovida de toda maneira possível), e exigir que as denominadas associações intercredos sejam introduzidas e forcem seu estabelecimento aos fundamentos que todas as associações católicas em toda diocese convenham estar fundadas em um mesmo padrão.

9. Expressando aqui Nosso desejo que a Alemanha católica possa fazer grande progresso na religião e vida civil, e para que este desejo pudesse ser felizmente cumprido, Nós pedimos ao amado povo alemão a ajuda especial de Deus Todo-Poderoso e a proteção da Virgem Mãe de Deus, a Rainha de Paz. Como uma garantia das graças divinas e também que sinal de Nosso amor particular, Nós transmitimos, mais amorosamente, a vocês, Filho Amado e Veneráveis Irmãos, a seu clero e povo, a Bênção Apostólica.

Dado em São Pedro, Roma, em 24 de setembro de 1912, o décimo ano de Nosso Pontificado.

PIO PP. X

NOTAS FINAIS

1. Carta Encíclica de Leão XIII, "Graves de Communi", 18 de janeiro de 1901.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

O FIM, OS MEIOS E A EXECUÇÃO





R. Garrigou-Lagrange

Muitos erros práticos na vida espiritual provêm do fato de esquecermos de considerar que em tudo é preciso primeiramente querer o fim e que este fim só se realiza ou se obtém em último lugar. Como diz muitas vezes Santo Tomás: “o fim é o primeiro na ordem da intenção e último na ordem da execução” (Ia. IIae., q. 1, a. 4). O doente quer a saúde mais do que os remédios mas só após empregar os remédios é que recobra a saúde desejada. O arquiteto concebe a Igreja que quer construir em toda sua altura mas ele tem, evidentemente, que começar pelas fundações e não pelas abóbadas. Na ordem material, só os loucos é que se afastam deste bom senso elementar. Mas na ordem espiritual é fácil se afastar dele sem se notar. Muitos parecem querer começar pelas abóbadas e flechas e não pelos alicerces, a construção do edifício espiritual ou, para empregar outra imagem, parecem querer voar sem ter asas.

Desejaríamos recordar neste artigo qual é o alcance do princípio que acabamos de lembrar, para o itinerário espiritual. Será este um modo de completar praticamente o que muitas vezes dissemos sobre o caminho normal da santidade onde é preciso, contrariamente aos quietistas, evitar tanto a presunção como a preguiça espiritual, não avançando nem muito cedo nem muito tarde mas, como deseja o Senhor, fortiter e suaviter.

* * *

A intenção do fim deve preceder, é claro, a consideração e a escolha dos meios e por mais forte razão a execução deles.

Quais devem ser desde o começo da vida espiritual as qualidades desta intenção?

A intenção do fim deve ser reta, pura, elevada e eficaz e isto desde o começo de nossa viagem até o fim; sem o que os atos que devem ser praticados não teriam nem retidão nem eficácia.

Deve ser reta, segundo a direção da reta razão, esclarecida pela fé. Em outros termos, ela deve-se voltar com toda pureza para o fim que o próprio Senhor nos assinala. Jesus nos diz no Sermão da Montanha (Mt 6, 22): “Se teus olhos são simples, todo o teu coração será luminoso; mas se teus olhos forem maus, todo teu corpo será tenebroso”. Da mesma maneira, se nossa intenção é reta e pura, toda nossa vida, inspirada nela, terá luz.

A intenção deve ser elevada: “Buscai em primeiro lugar o reino de Deus e sua justiça e tudo mais vos será dado por acréscimo” (Mt 6, 33). Nós devemos desejar primeiro nosso fim sobrenatural, a vida da eternidade, a possessão inamissível de Deus pela visão beatífica e a glória que deve vir dele. Nossa intenção deve ser pois muitíssimo elevada; por meio dela devemos constantemente tender para Deus sem limitar nossa aspiração a um determinado grau da glória pois não sabemos qual nos foi reservado. Devemos tender também para a plena perfeição cristã, que é realizável aqui na terra, como para o prelúdio normal da vida eterna. É por isto que Nosso Senhor começou seu primeiro sermão da montanha falando aos homens a respeito das bem-aventuranças. Não há objeto mais elevado e mais oposto às máximas da sabedoria humana. “Bem-aventurados os pobres, os mansos, os que choram, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os de coração puro, bem-aventurados os pacíficos, os que sofrem perseguição pela justiça”. Estas bem-aventuranças, diz Santo Tomás depois de Santo Agostinho, são os atos mais elevados das virtudes e dos dons[1], e no entanto Nosso Senhor fala delas desde o início de sua pregação, para mostrar às almas o fim para o qual elas devem tender, o ideal a que elas devem aspirar. Pela mesma razão Santo Tomás começa a exposição da teologia moral pelas questões do fim último e da bem-aventurança no Céu. O fim, que é o último na ordem da execução deve ser, com efeito, o primeiro na ordem da intenção.

Em terceiro lugar a intenção deve ser eficaz e deve até se tornar cada vez mais eficaz sem o que não empregaremos os meios, algumas vezes penosos, que são necessários para obter esse fim; recuaremos diante da cruz. Muitos se contentam com um amor de admiração pelo fim entrevisto, amor que não passa de uma veleidade. Nosso Senhor nos diz sobre isto (Mt 7, 21): Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus, mas quem faz a vontade de meu Pai que está nos céus. Não basta um idealismo belo que nada realiza.

Mas também se enganaria no sentido inverso quem, querendo ser muito prático, dissesse: “A via purgativa me basta” e não quisesse aspirar mais alto. A via purgativa, como a mortificação, não passa de um meio em vista à união com Deus, que é preciso primeiramente desejar eficazmente; sem o que não teríamos a coragem de praticar efetivamente as virtudes da via purgativa, a renúncia, com a qual pretenderíamos contentar-nos.

O fim sendo o primeiro na ordem da intenção, a perfeição cristã não diminuída deve ser, desde o começo da vida espiritual, vivamente desejada, querida por uma vontade reta, pura, elevada e eficaz e à medida que avançamos, estas qualidades de intenção devem aumentar com a caridade que deve sempre crescer aqui na terra em nossas almas pelos nossos méritos e pela freqüente comunhão.

* * *

Após a intenção do fim, é preciso passar à consideração e à escolha dos meios, e depois à execução. Esta consideração deve descer da apreciação do fim desejado para a apreciação dos meios que lhe são subordinados, até aos meios mais ínfimos porém indispensáveis, que devemos empregar todos os dias na prática de nossos deveres de estado, alguns às vezes muito modestos segundo o lugar onde a Providência nos colocou. É preciso, aqui, não negligenciar a consideração do que São Francisco de Sales chama as pequenas virtudes que são como flores da caridade sem as quais as relações com o próximo se tornam tensas e quase impossíveis: doçura, afabilidade, prontidão no prestar serviço, em interpretar acontecimentos com bons olhos, etc... É preciso não se contentar com vagas generalidades sobre o fim proposto; não é suficiente dizer: “É preciso fazer tudo pelo amor de Deus”; é preciso ver, cada dia, em que consistem nossos deveres de estado, que são um dos grandes meios de santificação para nós, de conformidade com a vontade de Deus. É preciso não negligenciar os deveres de estado por uma piedade idealista e sentimental, mal entendida, que não passará de uma fantasia piedosa. É preciso descer portanto até o detalhe dos meios a empregar para se santificar na vida quotidiana, pois os atos humanos são atos contingentes e particulares, postos hic et nunc, em circunstâncias muito determinadas. Aqui, é preciso estar atento a todas as direções da obediência, e a prudência deve aproveitar tudo que pode assegurar a retidão de nossa marcha para frente, no meio em que nos encontramos, no relacionamento com nossos superiores e com nossos iguais. Deste ponto de vista não há nada de pequeno na vida cristã: os atos mais simples, necessários para a prática dos deveres de estado mais elementares, têm alguma coisa de grandioso em relação ao fim último sobrenatural e à caridade que nos deve inspirar em vista deste fim. Compreende-se assim que a perfeição não consiste em fazer coisas brilhantes, extraordinárias, mas em fazer extraordinariamente bem as coisas ordinárias da vida cristã: assistir bem à santa missa, preparar-se seriamente para a santa comunhão, fazer bem a ação de graças, e viver deste tesouro da vida divina, praticando nossos deveres com uma intenção sempre mais pura e mais firme, apesar das dificuldades e atropelos, com o que Nosso Senhor chama “fome e sede de justiça de Deus”.

* * *

Enfim, assim como a consideração dos meios deve descer até os meios mais ínfimos, a execução deve-se elevar destes meios até o fim a conquistar. A execução deve ser uma ascensão contínua que começa pelos meios inferiores indispensáveis, que se deve ensinar aos principiantes, sob pena de comprometer-lhes o futuro espiritual, do mesmo modo como, para ir fazer uma visita a um personagem importante, veste-se uma roupa conveniente para a ocasião ou para reparar um doutorado na Universidade, é preciso fazer a inscrição e seguir os cursos.

Aqui, nesta ascensão, é preciso não se precipitar e querer chegar ao termo mais rápido do que convém. Em nossa época de vida efervescente é muito comum levar as inteligências e as vontades à maturidade antes da hora, como que pondo numa estufa frutos que amadureceriam antes da estação. Mas um fruto amadurecido à força não se conserva por muito tempo e logo estará passado.

* * *

Que nos diz Nosso Senhor para nos curar de tal defeito? Notemos que ele começou sua pregação pelas bem-aventuranças para nos mostrar o altíssimo fim ao qual devemos tender: “Procurai primeiro o reino de Deus e sua justiça e todo o resto vos será dado por acréscimo”. (Mt 6, 33) Mas quando se trata de passar a execução, de começar a caminhada em direção a tão alto fim, entrevisto e desejado, Nosso Senhor, sobretudo formando os Apóstolos, insiste na humildade. Nosso Senhor, que não cessa de elevar seus corações, lhes diz também: “Se não vos tornardes semelhantes a uma criancinha, não entrareis no reino dos céus” (Mt 18, 3) Lembremo-nos em que ocasião estas palavras foram pronunciadas. São Marcos nos conta que Jesus, caminhando com os apóstolos pela Galiléia, lhes anunciava uma Paixão mas os apóstolos não compreendiam suas palavras e temiam interrogá-lo. “E chegaram a Cafarnaum”, diz São Marcos (9, 32). Quando estavam já em casa, perguntou-lhes Jesus: “De que faláveis vós outros pelo caminho?”. Mas eles se calaram porque pelo caminho haviam discutido entre si qual deles seria o maior. Sentando-se, pois, ele chamou os doze e lhes disse: “Se alguém quer ser o primeiro seja o último de todos e o servo de todos”. Está bem clara, na linguagem simples e elevada de Jesus, a oposição entre a ordem da intenção e a da execução: para atingir este fim tão alto que é a santidade é preciso começar pela humildade. Quanto mais algo for o edifício espiritual, mais profundos devem ser os alicerces. E além disso não basta cavar os alicerces de uma vez por todas no começo da obra mas será preciso cavar mais profundamente, aqui e ali à medida que cresce o edifício, para a humildade crescer com a caridade. É isto que Jesus quer dizer aos Apóstolos: “E tomando um menino, diz São Marcos, pô-lo no meio deles; depois de o abraçar, disse-lhes:— Todo aquele que recebe um desses meninos em meu nome, a mim é que recebe; todo o que me recebe, não recebe a mim mas Àquele que me enviou”.

São Lucas (9, 46) conta também que os Apóstolos não compreenderam então que Jesus lhe anunciava sua Paixão: “Veio-lhes então o pensamento de qual deles seria o maior. Mas Jesus, conhecendo os pensamentos de seus corações, tomou um menino, pô-lo junto de si e lhes disse: — Todo o que recebe esse menino em meu nome, a mim recebe; e quem recebe a mim recebe Aquele que me enviou; pois quem dentre vós todos é o menor, esse é o maior”. São Mateus (18, 4) dá-nos a explicação dessas últimas palavras: “Todo aquele pois que se humilha como esse menino, esse será o maior no reino dos céus”. A criancinha está isenta de orgulho, de malícia, de concupiscência, de rancor, esquece logo o mal que lhe fazem; depois, é simples e consciente de sua fraqueza, pede socorro a seu pai e a sua mãe.

Assim deve ser o cristão diante de Deus para entrar no reino dos céus; isento de orgulho, simples, consciente de sua fraqueza. É aos humildes que Deus dá a sua graça. Assim também nós somos levados a nos inclinar para a criancinha, a ajudá-la e dar-lhe tudo que podemos, enquanto que nos afastamos da criança pretensiosa que perdeu sua graça e a simplicidade da infância em troca de uma vaidade ridícula.

O cristão quando é verdadeiramente humilde, começa e continua como deve sua viagem para a eternidade; sem precipitação alguma, ele chegará muito alto. Ele não deseja de modo desregrado sua própria excelência, não se estima como digno de grandes coisas; mais ele é humilde, mais ele ama a Deus e deseja glorificá-lo, desprezando sua própria excelência, cuja procura diminuiria em si o esplendor da glória divina.

Este princípio de infância espiritual foi ensinado por todos os santos, especialmente os fundadores da Ordem, na formação de seus discípulos. O Senhor, nos últimos tempos, nos lembrou de uma maneira singularmente eloqüente e persuasiva este espírito na pessoa de Santa Teresa do Menino Jesus. Esta necessidade se fazia sentir. Nossa época não conhecia mais, por causa de sua presunção e de seu frenesi, estas qualidades da verdadeira infância sem as quais não se terá nunca as qualidades da adolescência nem as de uma idade mais avançada. Ao mesmo tempo em que ela nos lembra a humildade, Santa Teresa do Menino Jesus nos diz toda a confiança filial que devemos ter em Deus e tudo o que Ele está pronto a nos dar para nos prender mais intimamente a Ele. Ela nos mostra admiravelmente as graças sempre novas de luz e de amor que se encontram no caminho normal da santidade.

Para isso não se trata de receber a verdade somente do modo intelectual assim como se escuta com atenção uma conferência interessante. É preciso que a alma inteira, inteligência e vontade, receba a verdade e o bem que lhe são propostos em uma doutrina que, como o dom da sabedoria, [3] é ao mesmo tempo especulativa e prática, doutrina de vida.

É preciso recebê-la humildemente, pelos intermediários que Deus quis que fossem os nossos e que têm a graça de estado para nos esclarecer. Receber “como uma criancinha”, diz Nosso Senhor, com simplicidade, pondo em seguida em prática o que nos foi dito; pois, nesse caso, é pela prática que se vai à teoria, no sentido de que é pela prática das virtudes que nos preparamos para receber a contemplação verdadeiramente viva e saborosa dos mistérios da salvação.

Assim recebe aquele que entrou nesta infância espiritual da qual falava Jesus aos seus discípulos e que é o antípoda das criancices de uma vã e tola pretensão. A presunção, querendo-se elevar muito depressa, não atinge nem mesmo os degraus inferiores da escala espiritual. O espírito de infância de que fala Jesus, ao contrário, predispõe a chegar em tempo normal à verdadeira maturidade que só virá na hora marcada por Deus.

Há, pois, uma grande diferença entre um intelectual apressado em se instruir e um contemplativo. Nosso Senhor alude a isto dizendo: “Eu vos dou graças, Pai, porque escondestes estas coisas aos prudentes e sábios e as revelastes aos pequeninos”.

São José, que não era um intelectual foi certamente um dos maiores contemplativos de todos os tempos; quem pode descrever o aumento de caridade, de inteligência e de sabedoria que ele recebia do Verbo de Deus feito homem, quando, no silêncio da casa de Nazaré, ele o contemplava com amor! O Santo Cura d’Ars que tampouco era um intelectual, também foi, em sua aldeia, um grande contemplativo. Nada via do imenso bem que realizava todos os dias mas via se elevar cada vez mais o ideal do sacerdócio, e dele se julgava sempre mais afastado.

Para ser contemplativo, é preciso não ter a alma inflada de orgulho, é preciso ser simples e humilde em relação a Deus, como uma criança. “Deus superbis resistit humilibus autem dat gratiam” (Tg 4, 6). É aos humildes que Deus dá sua graça e os faz humildes para os cumular de graça. Então seu reino se estabelece verdadeiramente nestas almas, nestas inteligências, nestas vontades, nestes corações.

* * *

Finalmente se realiza o ideal entrevisto e desejado no primeiro dia, segundo o princípio que citamos no começo: em tudo é preciso primeiramente considerar e querer o fim, que só se realizará em último lugar. É preciso não negligenciar os meios inferiores, indispensáveis para a prática cotidiana de nossos deveres de estado, às vezes muito modestos; é preciso não saltar por cima dos degraus mas acelerar lentamente e finalmente se chega ao fim. Com dizia um santo diretor: “Quando trabalhamos assim para o bom Deus chegamos a fazer mais e menos do que tínhamos sonhado”; menos porque sobram sempre lacunas que esperávamos preencher mais ligeiro, e que o Senhor deixa para nos manter humildes; mas também avançando seriamente, fazemos mais do que havíamos sonhado, pois o bom Deus, por sua graça, fecunda nossos esforços além de nossas esperanças. “Deus, qui dives est in misericordia... convivificavit nos in Christo, et conresuscitavit et conculis supervenientibus abundantes divitias gratiæ suæ in bonitate super nos in Christo Jesu” (Ef 2, 4). “Deus que é rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, mesmo quando estávamos mortos pelos pecados, nos convivificou em Cristo (por cuja graças fostes salvos); e com ele nos ressuscitou e fez sentar nos céus com Cristo Jesus, para mostrar, nos séculos futuros, a infinita riqueza da sua graça, por sua bondade para conosco em Jesus Cristo”.

Uma vida bela, diz-se, é um pensamento da juventude realizado na idade madura, e realizado muitas vezes sem que saibamos, porque a alma voltada para Deus, não se volta mais para si mesma.

Evitamos assim dois tropeços: o dos idealistas que nada realizam, ou fazem só a aparência do bem, e o daqueles que se dizem práticos e perdem de vista a altura do fim a atingir.

Os idealistas no mais das vezes, se contentam em conceber o ideal e admirá-lo; quando procuram realizá-lo não pensam, como deviam, nos meios inferiores e no entanto indispensáveis. Esquecem que para fazer uma bela estátua de Cristo, não é suficiente se ter um belo modelo, é preciso também ver se a argila que se vai usar não é nem muito úmida nem muito seca. Estando atentos apenas à forma e não à matéria, podem muitas vezes fazer monstros, aplicando uma forma belíssima a um objeto que está longe de ter a disposição necessária para recebe-la. Ou ainda fazem uma imitação no campo da espiritualidade, dando aos iniciantes uma direção que convém aos adiantados.

Por outro lado a atenção dada aos meios às vezes ínfimos, porém necessários, não deve nos deixar cair em minúcias, como acontece com o espírito esmiuçador que, sob o pretexto de ser muito prático, perde de vista a elevação do fim a atingir. Falando desses meios ínfimos, o tom e o acento devem lembrar a grandeza do fim; é preciso sentir, na prática das virtudes morais, o sopro e o élan das virtudes teologais que devem inspirá-las, o espírito de fé, de confiança e de amor de Deus.

É por isso que convém ler livros ascéticos escritos por espirituais que, como o autor da Imitação, não esquecem que a ascese é ordenada à mística, como coroamento normal, que as almas generosas alcançarão na hora querida pelo Senhor.

Assim são resolvidas muitas dificuldades e evitam-se muitos erros práticos em espiritualidade. Não nos intrometemos, como os quietistas, nas vias místicas nem simulamos, antes da hora, o repouso da contemplação. Esta é infusa e só Deus pode dá-la. Mas Ele tem o hábito de concedê-la às almas verdadeiramente humildes e generosas que, fazendo cada coisa a seu tempo, não negligenciaram as virtudes pequenas, a prática exata de seus deveres de estado, e que, pela comunhão quotidiana, cada dia mais fervorosa, pela aceitação sobrenatural da cruz, se encaminham para a intimidade da união divina.

Então, no crepúsculo da vida, a realização se encontra com a intenção primeira. Esta, desde o começo, devia ser reta, pura, elevada e eficaz; essas qualidades não cessaram de aumentar nela; ultrapassou-se o idealismo e chegou-se a um santo realismo que não foi obtido pela diminuição do ideal mas pela fidelidade constante Àquele único que pode, como Ele o disse, dar a vida e a dar com abundância: Veni ut vitam habeant, et abundantius habeant (Jo 10, 10).

(Trad: Anna Luiz Fleichman. "Perfection Chretienne et Contemplation", págs. 779ss, vol. II. Revista Permanência, Set.-Out. 77)

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