quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Agnus Dei

domingo, 28 de dezembro de 2008

Catecismo de São Pio X - Introdução

Persignar-se

Pelo sinal † da santa cruz, livrai-nos, Deus † Nosso Senhor, dos nossos † inimigos. Em nome do Pai †, e do Filho † e do Espírito Santo †. Amém.



Per signun † crucis, de inimicis nostris libera-nos Deus † noster. In nonime Patris † et Fílio † et Spiritu Sancto . Amen

Credo

Creio em Deus Pai Todo-Poderoso,

criador do céu e da terra.

E em Jesus Cristo, seu único Filho

Nosso Senhor,

o qual foi concebido pelo poder do Espírito Santo,

nasceu de Maria Virgem,

padeceu sob Pôncio Pilatus,

foi crucificado, morto e sepultado,

desceu aos infernos,

ao terceiro dia ressurgiu dos mortos, subiu ao Céu, está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso,

de onde há de vir a julgar os vivos e mortos.

Creio no Espírito Santo.

Na Santa Igreja Católica,

na comunhão dos santos,

na remissão dos pecados,

na ressurreição da carne,

na vida eterna.

Amém.


Credo in Deum Patrem omnipotentem,

Creatorem caeli et terrae.

Et in Iesum Christum, Filium eius unicum, Dominum nostrum,

qui conceptus est de Spiritu Sancto,

natus ex Maria Virgine,

passus sub Pontio Pilato,

crucifixus, mortuus, et sepultus,

descendit ad infernos,

tertia die resurrexit a mortuis,

ascendit ad caelos, sedet ad dexteram Dei Patris omnipotentis,

inde venturus est iudicare vivos et mortuos.

Credo in Spiritum Sanctum,

sanctam Ecclesiam catholicam,

sanctorum communionem,

remissionem peccatorum,

carnis resurrectionem,

vitam aeternam.

Amen.

Ave-Maria

Ave, Maria, Cheia de graça, o Senhor é con­vosco; bendita sois vós entre as mulheres, e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. R/. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém.



Ave, María, grátia plena: Dóminus tecum: benedícta tu in muliéribus, et benedictus fructus ventris tui Jesus. R/. Sancta María, Mater Dei, ora pro nobis peccatóribus, nunc et in hora mortis nos­trae. Amen

Salve Rainha

Salve, Rainha, Mãe de misericórdia, vida, doçura e esperança nossa, salve!

A vós bradamos, os degredados filhos de Eva;

a vós suspiramos, gemendo e choran­do neste vale de lágrimas.

Eia, pois advoga-da nossa, esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei; e depois deste desterro nos mostrai Jesus, bendito fruto do vosso ven­tre, ó clemente, ó piedosa, ó doce sempre Virgem Maria.

V/. Rogai por nós, santa Mãe de Deus, R/. Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.



Salve, Regina, Mater misericordiae, vita, dulcédo et spes nostra, salve.

Ad te clamamus, éxsules fiIii Evae. Ad te suspirámus geméntes et flentes in hac lacrimárum valle. Eia ergo, advocáta nostra, illos tuos miseri­córdes óculos ad nos convérte. Et Jesum benedíctum fructun Ventris tui, nobis, post hoc exsílium, osténde.

O clemens, o pia, o dulcis Virgo María!
V/. Ora pro nobis, sancta Dei Génitrix. 
R/. Ut digni efficiámur promissiónibus Christi.

Glória

V/. Glória ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo.

R/. Assim como era no princípio, agora e sempre, por todos os séculos dos séculos. Amém.

V/. Glória Patri, et Fílio, et Spíritui Sancto. R/. Sicut erat in pricípio, et nunc, et semper, et in saécula saeculórum. Amen

 

Ato de Contrição


Meu Senhor Jesus Cristo, Deus e homem verdadeiro, Criador, Pai e Redentor meu. Por ser vós quem sois e porque vos amo sobre todas as coisas, pesa-me de todo o meu coração de vos ter ofendido, proponho firmemente a emenda de minha vida para nunca mais pecar, apartar-me de todas ocasiões de ofender-vos, confessar-me e cumprir a penitência que me foi imposta.


Vos ofereço, Senhor minha vida, obras, e trabalhos em satisfação de todos os meus pecados e assim como vos suplico, assim confio em vossa bondade e misericórdia infinitas que mos perdoareis pelos méritos de vosso preciosíssimo sangue,paixão e morte e me dareis graça para emendar-me e perseverar em vosso santo serviço até o fim de minha vida. Amém.

 

Mandamentos da lei de Deus

Os mandamentos da lei de Deus são dez: os três primeiros pertencem à honra de Deus e os outros sete ao proveito do próximo.

  1. Amar a Deus sobre todas as coisas.
  2. Não tomar seu santo nome em vão.
  3. Guardar os domingos e festas.
  4. Honrar pai e mãe.
  5. Não matar.
  6. Não pecar contra a castidade.
  7. Não furtar.
  8. Não levantar falso testemunho.
  9. Não desejar a mulher do próximo.
  10. Não cobiçar as coisas alheias.

    Estes dez mandamentos se encerram em dois:

        Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos.


Mandamentos da Igreja

Os mandamentos da Igreja são cinco:

  1. Ouvir Missa inteira nos domingos e festas de guarda.
  2. Confessar-se ao menos lima vez cada ano.
  3. Comungar ao menos pela Páscoa da Ressurreição.
  4. Jejuar e abster-se de carne, quando manda a santa madre Igreja.
  5. Pagar dízimos, segundo o costume.


Sacramentos

Os sacramentos instituídos por Jesus Cristo são sete :

  1. Batismo.
  2. Confirmação.
  3. Eucaristia.
  4. Penitência ou Confissão.
  5. Extrema Unção.
  6. Ordem.
  7. Matrimônio.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Sermão de Natal

 

São Pedro Crisólogo

Seríamos levados antes a adiar nosso sermão, tal a sublimidade e o mistério do nascimento de Cristo. A Virgem deu à luz; quem o explicará? O Verbo se fez carne; quem explanará este mistério? Se o Verbo de Deus vagiu na boca de uma criança, como poderá falar dele o homem cheio de imperfeição? Mas como a estrela iluminou os magos em busca da Luz, assim a palavra do pregador deve dar a conhecer a seus ouvintes o nascimento de Deus, a fim de se regozijarem com o encontro de Cristo e, mais que perscrutarem seus divinos segredos, honrarem com dádivas o Menino-Deus. Orai, irmãos meus, para que se digne crescer, pouco a pouco, em minha palavra, aquele que aceitou crescer num corpo como o nosso.

O evangelista diz ter o anjo falado assim: “Não temas, Maria, pois achaste graça diante de Deus”. Não temas, Maria. E por quê? Porque achaste graça. Temer não é próprio de quem recebe, - é próprio de quem perde. Recebeste, concebendo, a graça do divino germe, e não perdeste o brilho de tua virgindade, ao entregá-la à luz. “Não temas, Maria”. Que pode temer a que concebe a segurança do mundo, a alegria dos séculos? Temor não existe, onde se trata de algo divino, não humano; onde há consciência de virtude, não de impureza. Que pode temer a mãe daquele a quem temem até os que infundem temor? Que pode temer aquela cujo assessor é o juiz da própria causa, e que tem sua integridade como testemunho de sua inocência? “Não temas, Maria, pois achaste graça diante de Deus”.

A Virgem acolheu em seu seio o Verbo divino, o qual, desde a eternidade, coexistia com Deus. Fez-se grandioso templo da Divindade, ela, morada humilde e humana. Aquele que não podia ser contido na pequenez do corpo humano, ia-lo na estreiteza do ventre virginal. “Eis que conceberás no ventre”. Bastaria ter dito: “conceberás “; por que acrescentou: “no ventre”? Para indicar ser real a concepção, não aparente; para atestar que o nascimento seria real, não fictício; para demonstrar que assim como Cristo, enquanto Deus, procede do verdadeiro Deus, enquanto homem tem um corpo que é fruto bendito da verdadeira concepção. É, pois, herético afirmar que Cristo tomou um corpo etéreo e apenas tenha aparentado a forma de homem. “Eis que conceberás no ventre e darás à luz um filho, ao qual chamarás Jesus”.

Em hebraico, “Jesus” significa “Salvador”. Com razão, pois, tudo está salvo na Virgem, quando ela gerou o Salvador de tudo. “chama-lo-ás Jesus”. Porque com este nome é adorada a majestade augusta da divindade; todos os que habitam os céus, os que povoam a terra, os que gemem nas profundezas do inferno prosternam-se ante esse nome e o adoram. Ouvi as palavras do Apóstolo: “Ao nome de Jesus se dobrará todo joelho, no céu, na terra e nos infernos” 1. É o nome que deu vista aos cegos, ouvido aos surdos, curou os coxos, deu fala aos mudos, vida aos mortos, libertou os possessos do demônio. Mas se o nome é tão sublime, quanto não o será o poder de seu dono? O mesmo anjo diz quem seja aquele que detém esse nome: “Ele será chamado Filho do Altíssimo”. Vede: o que a Virgem concebe não é germe da terra, mas do céu. A Virgem deu à luz e seu filho é o Filho de Deus! Portanto, os que pretendem encontrar algo de apenas humano nesse nascimento estão injuriando ao Altíssimo!

“E o Senhor lhe dará o trono de Davi, seu pai, e reinará eternamente na casa de Jacó, e seu reino não terá fim”. São palavras que o herege procura toldar em favor de seu erro. “Eis, diz aqui, é o anjo quem fala: o Senhor Deus lhe dará… Então, não é maior aquele que dá do que aquele que recebe? E o que recebe, acaso já possuía o que recebe?”

Nós, porém, irmãos, escutemos tais palavras do anjo, não como os pérfidos hereges, mas como verdadeiros fiéis; sejam-nos fundamento para a fé, não pretexto para o erro. “O Senhor Deus lhe dará”. Que Deus? O próprio Verbo, que era, no princípio, Deus 2. A quem dará? Ao que se fez carne e habitou entre nós. Ouçamos ao Apóstolo, que diz: “Deus estava em Cristo, reconciliando o mundo consigo” 3. Consigo, não com outro. Portanto, Deus, que estava em Cristo, se dava a si mesmo o reino, em Cristo, conferindo ao corpo assumido o que desde sempre possuía na divindade.

“Dar-lhe-á o Senhor Deus a sede de Davi seu pai”. Veja-se: quando recebe, chama-se filho de Davi; quando dá, Filho de Deus. Ele mesmo disse: “tudo o que o Pai tem é meu” 4. De onde, pois, vem essa necessidade de receber, se existe a posse de tal poder? “Tudo o que o Pai tem é meu”. Quem recebe o que já é seu? Porventura é graça de um doador aquilo que o receptor já possui? Confessemos que houve um receptor, mas foi o que nasceu, o que assumiu a carne e a infância, o que sofreu o presépio e os trabalhos da vida, o que sentiu fome e sede, o que não fugiu às injúrias, o que subiu à cruz e padeceu a morte, o que ingressou no sepulcro; a este atribui, ó herege, a recepção de algo! Por que pensas que Deus despreza receber a honra, se recebeu injúrias? Pensas que lhe aborrece receber do Pai um reino, ele que dos inimigos recebeu afrontas e até a morte? Herege, tudo o que é injúria, temporal, recebido, tudo o que importa diminuição e inclui a morte, entende não dizer respeito à divindade e sim ao corpo! Assim não farás injúria ao Filho, não colocarás distâncias na Trindade.

Mas voltemos ao nosso tema: “Dar-lhe-á o trono de Davi seu pai”. Aquele, pois, que no céu se assenta junto do Pai, na terra recebe o trono de Davi. Aquele que reinou sempre, reina com relação a nós, na herança de Davi, que assume para sempre. Alegremo-nos, amados irmãos, pois quem é, em si, o Rei, se digna reinar em nós. Regozijemo-nos, pois vem reinar na terra a fim de que nós possamos reinar no céu. Sim, escutai o Apóstolo: “se com ele sofrermos, cem ele reinaremos” 5. Nasceu para nós e vem a nós precisamente para isso: para nos dar um reino! Ele mesmo o prometeu, com as palavras: “Vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do reino que vos está preparado desde a origem do mundo” 6. Preparado para vós, disse ele, não para mim. Virá para ficar sempre entre nós, para estar sempre ante nossos olhos aquele que agora só está em nosso coração. Virá trazer a confiança de sua familiaridade aos que participarão de seu reino. “E seu reino não terá fim!”

Alegrai-vos os que credes em sua vinda, porque vos prometeu um reino, onde os cargos são irremovíveis e as dignidades perpétuas. Quem não ambiciona o infinito? Quem prefere o perecível? Quem, comprando por ouro as honrarias passageiras, não deseja receber gratuitamente as eternas?

Irmãos meus, trata-se aí de cargos, de postos, de dignidades, sim, mas se não se der crédito à verdade do Evangelho não se obterão tais prêmios eternos. Se nos agrada o serviço de Cristo, se aspiramos militar sempre sob as suas ordens, armemo-nos com as armas de Cristo, vigiemos, sejamos sóbrios, vençamos o demônio, detestemos os vícios. Para podermos alcançar os prêmios e coroas de Jesus Cristo nosso Senhor, que com o Pai reina agora e sempre, pelos séculos dos séculos. Amém.

Notas:
[1] Fl 2, 11;
[2] Jo 1, 1;
[3] 2Cor 5, 19;
[4] Jo 17. 10;
[5] 2Tm 2, 12;
[6] Mt 25, 34.

 

Mercabá

domingo, 21 de dezembro de 2008

O Cura d’Ars, São João Batista Maria Vianney (1786-1859)

 

Do livro do Cônego Francis Trochu (editado na França em 1925) – Tradução da Editora Vozes – 1960 - IIª edição

Extratos mostrando a atitude dos católicos durante a Revolução francesa com respeito aos sacramentos

CAPITULO II - UM PASTORZINHO DURANTE O TERROR (1793-1794)

Os Vianney na missa do padre juramentado - A santa indignação de Maria Vianney - João Maria e os padres fiéis - A missa nas granjas.

Em janeiro de 1791, época em que a Constituição Civil entrou a vigorar na comarca de Lião, João Maria ainda não tinha completado cinco anos. O Pe Jacques Rey, cura de Dardilly durante 39 anos, cometera a fraqueza de prestar o juramento cismático. Mas, a dar-se crédito às tradições locais, esclarecido pelo exemplo do coadjutor e dos colegas vizinhos, que haviam recusado o tal juramento, não tardou muito em compreender e detestar sua falta. Permaneceu ainda por algum tempo na paróquia celebrando a missa numa casa particular, retirando-se depois para Lião. Mais tarde teve que exilar-se na Itália.

Se a saída do Pe Rey não passou despercebida, Dardilly contudo não foi perturbada ao ponto que se poderia esperar. A igreja continuou aberta, pois veio outro sacerdote, enviado pelo novo bispo de Lião, um certo Lamourette, amigo de Mirabeau, nomeado pela Constituição, sem mandato de Roma, em lugar do venerável Monsenhor Marbeuf. O novo cura como também o novo bispo haviam prestado o juramento; mas como poderia suspeitar a boa gente de Dardilly que a Constituição Civil, da qual ignoravam, talvez, o próprio nome, pudesse conduzi-los ao cisma e à heresia? Nenhuma mudança aparente se havia operado, quer nas cerimônias, quer nos costumes paroquiais. Aqueles simples de coração assistiram por algum tempo sem escrúpulos à missa do "padre juramentado". Do mesmo modo procedeu com toda a boa fé Mateus Vianney, a esposa e seus filhos. (A transição do culto católico ao constitucional se fez em muitas paróquias sem violência visível).

Entretanto abriram-se-lhes os olhos. Catarina, a mais velha das filhas, posto que naquela época não contasse mais de uma dúzia de anos, foi a primeira a pressentir o perigo. No púlpito, o novo pároco nem sempre tratava dos mesmos assuntos como o Pe Rey. Os termos cidadãos, civismo, constituição, pontilhavam suas prédicas. As vezes descambava em ataque contra seus predecessores. "Esses, dizia, não são mais curas do que os meus sapatos" (Pe Vignon, cura de Dardilly, Processo apostólico in genere, p. 368).

Cada vez mais a afluência à igreja era menos homogênea e apesar disso mais minguada do que outrora; pessoas mui piedosas não compareciam mais aos ofícios divinos. Onde, pois, ouviam missa nos dias de festa? Pelo contrário iam outros que nunca haviam freqüentado o templo. Catarina sentiu certos receios e os manifestou à mãe. As coisas andavam nesse pé, quando os Vianney receberam a visita de um parente que residia em Ecully.

"Ah ! meus amigos, que fazeis ?" perguntou-lhes ao ver que assistiam à missa do padre "juramentado". "Os bons sacerdotes recusaram o juramento, por isso são caçados, perseguidos, obrigados a fugir. Felizmente em Ecully, há alguns que ficaram entre nós. A estes é que vos deveis dirigir. O vosso novo cura separou-se da Igreja Católica com o seu juramento. Não é de modo algum vosso pastor e não o podeis seguir".

Como que fora de si por essa revelação, a mãe de João Maria não trepidou em interpelar o infeliz sacerdote e censurar-lhe a apostasia da verdadeira Igreja. Ao citar-lhe o Evangelho, onde está escrito que o ramo separado da videira será lançado ao fogo, levou-o à seguinte confissão:

- "É verdade, senhora, a videira vale mais do que o sarmento". . Maria Vianney deve ter explicado aos seus a falta daquele padre, pois conta-se que o pequeno João Maria "mostrou horror por esse pecado, começando dali por diante a esquivar-se do cura juramentado". Desde então a igreja paroquial, relicário de tão suaves recordações, onde os pais se haviam casado e os filhos recebido o batismo, deixou de ser para a família Vianney lugar predileto de oração. Não tardou muito a ser fechada.

* * *

Chegaram, porém, os dias da sangrenta perseguição. Todo o sacerdote que não prestasse juramento se expunha a ser encarcerado e executado, sem recurso possível, dentro de 24 horas. Quem os denunciasse receberia cem libras de recompensa. Quem, ao contrário, lhes desse agasalho, seria deportado. Assim rezavam as leis de 24 de abril, 17 de setembro e 20 de outubro de 1793.

Apesar dessas ameaças terríveis, os sacerdotes fiéis andavam escondidos pelos arredores de Dardilly, e a casa dos Vianney ocultou a todos, um após outro. Em algumas ocasiões celebraram nela a santa missa. .Foi um milagre o dono da casa não ter caído na suspeita de alguns jacobinos, pagando com a cabeça a sua santa audácia.

Mas foi mesmo em Lião ou nos seus arrabaldes que os confessores da fé receberam, com mais freqüência, generoso abrigo.

Mensageiros de confiança, enviados de Ecully, passavam em certos dias pelas casas das famílias católicas e lhes indicavam o esconderijo, onde à noite seguinte haveriam de ser celebrados os divinos mistérios. Os Vianney partiam, sem ruído, e marchavam, muitas vezes, por longo tempo na escuridão da noite. João Maria, todo feliz por ir àquela festa, valentemente meneava as perninhas. Os irmãos murmuravam de vez em quando, achando a distância demasiada, mas a mãe lhes dizia: "Imitem a João Maria que nunca se cansa".

Chegados ao lugar combinado, eram introduzidos num paiol ou quarto retirado, quase às escuras. Ao pé de pobre mesa, rezava um desconhecido cujo semblante fatigado esboçava suave sorriso. Depois dos cumprimentos, no canto mais escuro, detrás duma cortina, em voz baixa, o bom padre aconselhava, tranqüilizava e absolvia as consciências. Não raro jovens noivos pediam que lhes abençoasse o matrimônio. Enfim, chegava a hora da missa, a missa tão desejada por grandes e pequenos. O padre dispunha sobre a mesa a pedra d'ara que trouxera consigo, o missal, o cálice e numerosas hóstias, pois não seria só ele a comungar naquela noite. Revestia-se com paramentos amarrotados e desbotados. Depois, envolto por silêncio profundo, começava as preces litúrgicas, Introibo ad altare Dei. Que unção na voz, que recolhimento e que comoção a da assistência! Frequentemente misturavam-se às palavras santas os contínuos soluços do celebrante. Dir-se-ia uma missa nas catacumbas antes da prisão e do martírio. Como se comovia naqueles momentos inesquecíveis a alma do pequeno Vianney! De joelhos, entre a mãe e as irmãs, orava como um anjo e chorava por ouvir chorar. Além disso, com que atenção escutava, sem compreender tudo, os graves ensinamentos daquele proscrito que arriscava a vida por amor às almas. Não teria sido naquelas reuniões noturnas que ouvira, pela primeira vez, o chamado ao sacerdócio?

* * *

1793. O Terror. Em Lião corria o sangue. Na Praça dos Terrores, a guilhotina não descansava. O proconsul Chalier havia inscrito 20 mil lioneses nas suas listas de proscrição. Uma revolta popular, chefiada por De Précy, fez subir ao cadafalso o próprio proscritor . Os católicos se limitavam a esperar, quando um exército da Convenção, sob o comando de Couthon e Dubois-Crance pôs sítio à cidade. De 8 de agosto a 9 de outubro, De Précy resistiu valente- mente e não se rendeu a não ser pela fome. 0 pequeno de 7 anos não se podia dar conta exata de tais acontecimentos. Do campo da casa paterna, ouvia-se muito bem o ruído do combate. Dubois-Crance estava acampado nos arredores de Limonet, alguns quilômetros ao norte de Dardilly, e os soldados da Revolução passavam de contínuo pelo povoado. Mas os ruídos da guerra inquietavam menos ao piedoso menino do que o obstinado silêncio dos sinos.

A igreja continuava fechada. Pelos caminhos não havia mais do que os pedestais dos cruzeiros: de Lião vieram homens para derrubar as cruzes. (Fouché, por decreto de 8 de novembro de 1793, ordenou que fossem destruídos todos os sinais religiosos que se encontrassem nas estradas, nas praças e nos edifícios de Lião). Em casa era necessário esconder cuidadosamente os crucifixos e as imagens religiosas. Somente nos verdadeiros fiéis, o santuário dos corações permanecia inviolado. João Maria não se desfez da sua pequena imagem da Virgem; guardou-a com mais precaução do que nunca, levando-a ao campo num bolsinho do casaco. (...)

CAPITULO III - A ESCOLA, A PRIMEIRA CONFISSÃO, A PRIMEIRA COMUNHÃO (1794- 1799)

As lições do cidadão Dumas - Um aluno exemplar - Os padres missionários: Groboz e Balley - A primeira confissão de João Maria Vianney - Em Ecully, na granja de "Point-du-Jour" - A primeira comunhão de um santinho.

A julgar por diversos acontecimentos de sua infância, João Maria chegou ao uso da razão muito cedo. Estava longe de ser um tardio. Apesar disso, fora das coisas de religião, com a idade de 9 anos, ignorava quase todas as disciplinas profanas. A irmã mais velha, Catarina, ensinou-lhe o que sabia, conseguindo ele desse modo soletrar um livro de orações. Era pois chegado o tempo de freqüentar a escola. Infelizmente, porém, esta não existia em Dardilly.

A lei de 19 de dezembro de 1793 (29 frimaire ano II) dispunha que todas as crianças de 6 a 10 anos deveriam freqüentar as escolas públicas durante três anos consecutivos, sob pena de os pais incorrerem numa multa equivalente à quarta parte de seus haveres. A instrução seria comum para todos e para todos obrigatória. Dessa maneira julgavam os revolucionários que tal lei se estenderia até à última das mais ignoradas aldeias. Sonho irrealizável, pois que a Revolução suprimiu as fontes de ensino. "O ensino é livre", proclamava no primeiro artigo a lei de 29 do "frimário" (3° mês do calendário republicano). Mas ninguém podia ensinar a não ser que tivesse prestado o juramento e obtido o atestado de civismo. Nenhum membro das congregações religiosas, nenhum sacerdote, poderia ser escolhido como professor.

De mais a mais, havia insuficiência de professores jacobinos. A pequena escola de Dardilly, regida até 1791 por um bom cristão, foi fechada, não sendo mais reaberta. Até no domínio da instrução infantil, a queda de Robespierre (27 de julho de 1794, 9 termidor ano II), provocou uma forte reação. A Convenção, abolindo o juramento de civismo exigido dos professores, reconheceu o direito a todo o cidadão de ensinar (17 de novembro de 1794, 27 brumário, ano II).

Graças a essa tolerância, no começo de 1795, o "cidadão" Dumas abriu uma escola em Dardilly. Era na estação invernosa, época em que as crianças não estavam ocupadas nos serviços do campo; o novo professor, aliás um bom cristão, viu afluírem alunos em número regular. Ensinava, além de ler e escrever, contas, história e geografia. João Maria começou a distinguir-se pelo comportamento e aplicação. "O senhor Dumas, dizia Margarida, estava muito satisfeito com o pequeno, dizendo muitas vezes aos outros: “Ah! se vocês se portassem como o Vianneyzinho!”. Deveras, os progressos do pequeno deveriam ter sido muito notáveis, pois vê-lo-emos, nos serões de inverno, ler o catecismo, ensiná-lo à Gothon, a irmã menor, ou ainda ler em voz alta a vida dos santos, escutada religiosamente pela família e pelos pobres.

* * *

Infelizmente a igreja continuava fechada. Houve certo momento de esperança com a morte de Robespierre. A perseguição perdeu muito de sua violência. 0 decreto do ventoso (3 ventoso, ano III, 21 de fevereiro de 1795) ab-rogava o culto do “Ser Supremo”, inaugurado pela Convenção e suprimia a Constituição Civil do Clero. Mas, depois destes meses ( 11 prairial, 30 de maio) , novo decreto dispunha "que ninguém poderia desempenhar o ministério de algum culto religioso (nas igrejas que ainda poderiam ser abertas) a não ser que antes disso fizesse ato de submissão às leis da república".

0 velho cura de Dardilly, Pe Rey, não havia aparecido, nem outro sacerdote não juramentado para tomar conta da paróquia.

A família Vianney, que não simpatizava com nenhum padre sujeito ao decreto de 30 de maio, continuava a ouvir a missa em casas particulares.

Até o fim de 1794 os padres católicos que permaneceram na comarca de Lião não chegavam a trinta. Apesar da pena de morte, asseguravam o serviço religioso, ainda que sem ordem nem continuidade, ora aqui, ora acolá, por não lhes ser possível fixar residência. A França convertera-se em terra de missão e mesmo em algo pior. Não obstante, fazia-se sentir a necessidade duma ação organizada. Se Monsenhor de Marbeuf achou que era seu dever emigrar, o vigário geral, Pe Linsolas, disfarçando-se, não abandonou a cidade. No começo de 1794, dividiu a paróquia em grupos paroquiais, e, para cada grupo, designou missionários, coadjuvados por catequistas leigos. Ecully ficou sendo um centro missionário, ao qual pertencia Dardilly. Conservam-se os nomes dos confessores da fé que exerceram naquela região tão heróico ministério. Foram, em primeiro lugar, dois sacerdotes sulpicianos, Pe Royer e Chaillon, antigos dirigentes do seminário maior; depois, um religioso, arrancado do seu convento pela tempestade revolucionária, o Pe Carlos Balley, a quem teremos ocasião de ir conhecendo no decurso deste livro. Enfim, o Pe Groboz, cura da paróquia de Sainte-Croix, que tendo fugido para a Itália transpôs novamente os Alpes para substituir, de algum modo, a tantos colegas condenados à morte. Esses quatro padres viviam separados, dispersos em Ecully. Por motivo de precaução, adotaram um ofício que aliás exerciam bem pouco. Sabemos que o Pe Balley trabalhava de marceneiro e o Pe Groboz de cozinheiro. As ferramentas e utensílios que carregavam davam-lhes certa aparência diante do povo e eram explicação suficiente de suas idas e vindas. Não saíam quase a não ser ao cair da tarde, indo por caminhos esquivos ao lugar combinado, onde diziam missa.

Com que respeito João Maria contemplava no altar aqueles homens envelhecidos antes do tempo, que traziam no semblante os sinais de tantas fadigas e de tantas privações suportadas pelas almas! A eles mesmos chamou a atenção aquele menino de límpidos olhares que orava com tanto recolhimento e com tanto fervor. Certo dia, no ano de 1797, o Pe Groboz passou por Dardilly e visitou a casa dos Vianney. Abençoou as crianças uma após outra. Perguntou a João Maria:

-"Quantos anos tens?

-Onze anos.

-Desde quando não te confessas?

-Eu nunca me confessei, replicou todo admirado.

-Pois façamo-lo agora mesmo".

João Maria ficou a sós com o padre e começou a sua primeira confissão. "Sempre me lembro dela, dizia mais tarde; foi em casa ao pé do relógio". De que pecados se poderia ter acusado? É de crer que a perfeita candura daquela alma de criança maravilhou o sacerdote que Deus enviara para receber suas confidências. Foi para o sacerdote uma revelação. Era necessário para aquela criança instrução religiosa mais completa. Poderia encontrá-la com as damas catequistas instaladas secretamente em Ecully. Não custou muito ao Pe Groboz convencer os pais. João Vianney não poderia, pois, ficar por alguns meses, em casa de Margarida Beluse, irmã de sua mãe, casada com Francisco Humbert?

* * *

(...)

Duas religiosas de São Carlos, as irmãs Combes e Deville, cujo convento não existia mais, encontraram refúgio em Dardilly. Os missionários confiaram-lhes a delicada tarefa de prepararem as crianças para a primeira comunhão.

João Maria foi instruído por elas juntamente com outros quinze. O grande dia foi precedido por um retiro. Durante esse tempo o jovem Vianney parecia todo abismado em Deus. “Já naquela idade, disse mais tarde Fleury Véricel, de Dardilly, nós o olhávamos como a um santinho. Rezava, rezava e não se comprazia em outra coisa.” "Vede, diziam os camaradas, dando-lhe um apelido que por certo provinha da família de Mateus Vianney, vede o pequeno "Gorducho" que faz concorrência ao seu anjo da guarda".

Estamos no ano de 1799, "durante o segundo Terror" (Expressão de Madalena Scipiot, mulher de Mandy, falando no Processo Apostólico in genere, p. 258, da primeira Comunhão de João Maria Vianney.) no tempo em que se corta o feno. A indecisão, que havia seguido à queda de Robespierre, não durou muito; os católicos ainda continuavam a ser perseguidos; os padres morriam às centenas; eram deportados para as Guianas, internados nos pontões de Rochefort, de Ré ou de Oléron. O Papa Pio VI, ancião de 82 anos, estava prisioneiro da Revolução (Pio VI morreu em Valença, aos 28 de outubro de 1799, pronunciando palavras de perdão). O Calendário republicano continuava a vigorar e a década substituía o domingo. As nossas belas festas religiosas, tão consoladoras para o povo, permaneciam proscritas e tentava-se substituí-las por ridículas cerimônias (Celebrou-se a Teantropofilia de Chemin-Dupontes e depois a Teofilantropia de Larenvellière-Lepaux).

Era, pois, ainda necessário esconder-se para orar a Deus. Em Ecully, a casa da família de Pingon, possuía vastas dependências. Foi esse o lugar escolhido pelos padres Groboz e Balley, para celebrarem a festa das crianças, festa celestial e esplendorosa, radiante de luz em tempos pacíficos, mas que o povo ignorava naquele fim de primavera. De manhãzinha os 16 meninos de Dardilly, que iam comungar, foram conduzidos separadamente, em trajes ordinários, para uma grande sala, cujas portas e janelas estavam bem fechadas, pois os meninos tinham cada um sua modesta vela e não convinha que fossem vistos de fora. Para maior precaução, puseram diante das janelas algumas carretas cheias de capim, e durante a cerimônia, para dissimular melhor, vários homens se ocupavam em descarregá-las. I. As mães levaram com muito cuidado, sob os chalés, os véus e os laços brancos. Cada qual aprontava o próprio filho para a visita divina. João Maria contava treze anos completos. Alma de um senso espiritual já mui apurado, podia bem apreciar o dom que acabava de receber. Tinha fome de Cristo e as tristes circunstâncias haviam tornado ainda mais distante aquele dia.

Recebeu a Eucaristia com o coração cheio de fé, desejo e grande amor: "Eu estava presente, contava Margarida Vianney. Meu irmão achava-se tão contente que não queria mais sair do lugar onde teve a felicidade de comungar pela primeira vez". Sem dúvida, havia muito, viviam no seu interior aquelas palavras que haveriam de sair tão ardentes de seus lábios sacerdotais: "Quando a gente comunga, sente algo de extraordinário...um gozo...uma suavidade... um bem-estar que corre por todo o corpo e o faz estremecer...somos obrigados a dizer como São João : Eis o Senhor! ...Oh! meu Deus, que alegria para um cristão que se levantando da mesa sagrada vai com todo o céu no coração".

Mais tarde, não falava de sua primeira comunhão sem verter lágrimas de felicidade. Passados 50 anos, mostrava aos meninos de Ars o modesto rosário de neo-comungante, exortando-os a conservarem cuidadosamente os seus como lembrança preciosa.

No mesmo dia voltou com os pais para Dardilly. Passara o tempo da infância e o tempo dos estudos. Ainda que crescesse lentamente, era forte para sua idade. Os trabalhos caseiros da granja e do campo já o reclamavam. Desde então embalsamou mais do que nunca a casa paterna com o perfume de suas virtudes. O aspecto franco, a atenciosa afabilidade que o levava a saudar cortesmente a todo o mundo, acabaram por ganhar-lhe os corações de todos.

Fim dos extratos dos capítulos II e III.

Fonte: Fraternidade Sacerdotal São Pio X

A CATOLICIDADE DA IGREJA

S. Francisco de Sales

Tradução: Emerson H. de Oliveira

O grande pai, Vincent de Lerins, em seu livro Memórias, diz que ele precisa ter, antes de tudo, um grande cuidade em acreditar  “no que sempre foi crido por todos [sempre e em todos lugares]“… (1) como os embusteiros e mentirosos; pois o resto do mundo nos chama de católicos; e se nós somos  romanos, é só para mostrar que somos fiéis ao Bispo que é o Pastor geral e visivel da Igreja. E já no tempo de S. Ambrósio ser romano em comunhão era a mesma coisa que ser católico.

Mas sua igreja é chamada em todos os lugares de huguenotes, calvinistas, hereges, anabatistas e sacramentistas. Sua igreja não existiu antes desses nomes e esses nomes não existiram antes de sua igreja, porque foram formados dela. Ninguém os chamam de católicos, pois vocês negam a isso. Eu sei que suas igrejas são chamadas de Reformadas, mas há tantas divisões como luteranos, ubiquitarianos, anabatistas, trinitarianos e outros sequazes de Lutero. O nome de religião é comum à Igreja dos judeus e dos cristãos, na Velha e na Nova Lei; o nome de católico é próprio da Igreja de Nosso Senhor; o nome de Reformado é uma blasfêmia contra Nosso Senhor que tão perfeitamente formou e santificou Sua Igreja com Seu sangue, que nunca precisou mudar a forma de sua amada esposa, pilar e coluna da verdade. Pode-se reformar nações, mas não a Igreja ou religião. Ela foi formada de uma vez só e qualquer mudança nela é considerada heresia e blasfêmia. A cor do sangue de Nosso Salvador é muito feia e por isso precisa de novas cores.

Sua igreja, então, se chamando Reformada, mexe na forma que o Salvador criou. Mas eu não posso me abster de lhe contar o que Beza, Lutero e Pedro Mártir pensam disso. Pedro Mártir os chamam de luteranos, e diz que vocês são seus irmãos; vocês então são luteranos; Lutero os chamam de Zwinglianos (2) e Sacramentarianos; Beza chama os luteranos de Consubstanciadores e Quimistas, e ainda ele os põe no número das igrejas Reformadas. Veja os novos nomes que os reformadores deram um para o outro então. Então, por sua igreja não ter o nome de católico nem nada, você não pode, de boa consciência, dizer o Credo dos Apóstolos; se disser, você sabe que, confessando a Igreja católica e Universal, obstinadamente ficam nas suas igrejas, que não são reais. Se S. Agostinho estivesse vivo agora, ele permaneceria em nossa Igreja que desde tempos imemoriais é chamada de católica.

A VERDADEIRA IGREJA DEVE SER ANTIGA.

A IGREJA CATÓLICA É MUITO ANTIGA. AS PROTESTANTES SÃO NOVAS.

A Igreja, para ser católica, deve ser universal no tempo e ser universal no tempo significa ser antiga; a antigüidade é então uma propriedade da Igreja. E em relação as heresias deve ser mais antiga que qualquer uma delas, e tem que preceder tudo, porque, como Tertuliano excelentemente diz: (3) “o erro é uma corrupção da verdade. A verdade então vem antes”. A boa semente vem primeiro, o inimigo que é a erva daninha vem depois. Moisés veio antes de Coré, Datã e Abiram; os anjos vieram antes dos demônios; Lúcifer surgiu na luz antes de ser lançado às trevas; a privação tem que seguir a forma. S. João diz que os hereges saíram de nós (IJo. 2.19); sair da Igreja é heresia, ficar é fidelidade; a Igreja vem antes da heresia. Assim, a túnica de Cristo era inteira antes de ser dividida. E embora Ismael nascesse antes de Isaac não significa que o erro vem antes da verdade, mas que a sombra, o Judaísmo, foi antes do corpo, o cristianismo, como s. Paulo diz (Gl.4).

Diga-me agora, peço-lhe, o tempo e o lugar onde vossa igreja apareceu depois do Evangelho? Quero o autor e o doutor desta declaração. Usarei até as palavras de um doutor e mártir de nossa época (4), que são dignas de atenção:

“Vocês sabem, e não há como negar, que a Igreja romana é santa, católica e apostólica. Por isso, mereceu os elogios do Apóstolo (Rm.1.8; 15.29;16.16): “por todo o mundo é anunciada a sua fé…chegarei com a plenitude da bênção do evangelho de Cristo…todas as igrejas de Cristo o saúdam…”. Então, quando S. Paulo, na prisão, semeou o Evangelho; quando S. Pedro estava governando a Igreja ajuntada na Babilônia; quando Clemente, tão altamente louvado pelo Apóstolo, tomou o leme; quando os profanos césares, como Nero, Domiciano, Trajano, Antoninus, estavam massacrando os Bispos de Roma; e também quando Dâmaso, Sirício, Anastácio e Inocêncio estavam segurando o elmo Apostólico: segundo o próprio Calvino, nestas épocas eles ainda não tinham se desviado do Evangelho. Bem, então quando foi que Roma perdeu sua fé tão admirada? Quando cessou o que tinha sido? Em que momento? Sob qual Bispo? Pra que? Sob que força? De que forma a estranha religião tomou a Cidade e o mundo? Que protestos, prantos e lamentações originou? Como? Todo o mundo estava dormindo enquanto Roma estava inventando novos sacramentos, novos sacrifícios e novas doutrinas? Por que não há um único historiador, seja grego ou latino, amigo ou inimigo, que comentasse esse grande acontecimento?”

E, para falarmos a verdade, seria estranho se os historiadores que eram tão curiosos ao notar as mudanças mais insignificantes nas cidades e nas pessoas tivessem esquecido o mais importante desses eventos, isso é, a mudança de religião na cidade mais importante do mundo, que é Roma na Itália.

Eu lhe pergunto, senhores, se sabem quando nossa Igreja começou o alegado erro. Diga-nos francamente; porque é certo que, como S. Jerônimo diz, (5) “reduzir a heresia a sua origem é refutá-la”. Deixe-nos localizar o curso de história para trás até o pé da cruz; vamos olhar sob este ponto e veremos se esta Igreja católica mudou sua forma e aspecto - quer dizer, em sua doutrina e sacramentos.

Nós não temos nenhuma necessidade de ter contra você, neste ponto importante, de outra testemunha além dos olhos de nossos pais e avós para mostrar quando sua alegada igreja começou.  Pelo ano de 1517 Lutero começou sua Tragédia: em 34 e 35 eles compuseram um ato nestas partes; Zwinglio e Calvino eram os principais jogadores. Você teria que me detalhar em forma de lista de que forma e atos, com que força e violência, esta reforma ganhou Berna, Genebra, Lausanne, e outras cidades–e que dores e aflições produziu? Você não achará prazer em fazer esta pesquisa; nós vemos isto, nós sentimos isto. Em uma palavra, sua igreja não tem nem oitenta anos; seu autor é Calvino; seu resultado, a miséria de nossa idade. Ou se você quiser imaginar que a sua igreja é antiga, diga-nos onde esteve durante este tempo. Não era conhecida mas era invisível;—pois se não fosse visto quem pode dizer que existiu? Além disso, Lutero o contradiz, pois confessa que no começo ele esteve só.

Agora, se Tertuliano jé em sua época testemunhava que os católicos refutavam so erros dos hereges por suas inovações e novidades, quando a Igreja esta em sua mocidade - “iremos”, ele diz (6) “lutar contra os hereges, contra a idéia da brevidade, com o argumento da posteridade” —quanto mais certeza podemos ter agora? E se uma das Igrejas tem que ser verdadeira, este título cai na nossa, que é muito antiga; e para sua novidade o nome infame de heresia.

A VERDADEIRA IGREJA DEVE SER PERPÉTUA.

A NOSSA É PERPÉTUA. A DOS PROTESTANTES NÃO SÃO.

Embora a Igreja pode ser antiga, contudo não seria universal no tempo se tivesse falhado em qualquer período. A heresia dos Nicolaítas é antiga mas não universal, pois só durou um tempo muito pequeno. E como um vendaval que parece pronto para agitar o mar de repente ou como um cogumelo, que nasce do pouco do orvalho noturno e logo se vai,—assim toda heresia, antiga como pode ser, desapareceu afinal, mas a Igreja permaneceu. (7)

Digo-lhe, como eu disse acima: mostre-me uma década de anos desde que Nosso Senhor ascendeu uma só década em que nossa Igreja não existiu. A razão para se achar impossibilitado de dizer quando nossa Igreja começou é que ela sempre existiu. E se você quiser realmente pesquisar isto, Sanders em sua Monarquia Visível e Gilbert Genebrard em sua Cronologia dá bastante material para pensar assim como César Baronius em seus Anais. Mas se você não quiser ainda abandonar os livros de seus mestres, e se ainda não está cego de paixão, veja as Centúrias de Magdebourg, e só verá que a Igreja sempre existiu; pois, como disse um sábio de nossa época, se os protestantes não tivessem deixado esse saber de lado, não teriam deixado mil e quinhentos anos sem história. Falarei depois sobre isto.

Agora, sua igreja,—vamos supor que sua mentira seja verdade, que ela já existia no tempo dos Apóstolos; ela não pode ser a Igreja católica, pois a Igreja católica deve ser a universal no tempo: ela deve sempre continuar. Mas, me diga, onde estava sua igreja cem, duzentos, trezentos anos atrás? Você não pode me mostrar, porque não existiu: então não é a verdadeira Igreja. Existiu, alguém dirá, mas era desconhecida. Bom Deus! Quem não pode dizer o mesmo? —Adamitas, anabatista, todos dirão a mesma coisa. Eu já mostrei que a Igreja militante não pode ser invisível; eu mostrei que ela é universal no tempo; eu lhe mostrarei que ela não pode ser desconhecida.

A VERDADEIRA IGREJA DEVE SER UNIVERSAL EM LUGARES E PESSOAS. (8)

A IGREJA CATÓLICA É UNIVERSAL. AS PROTESTANTES NÃO.

O universalidade da Igreja não requer que todas as províncias ou missões recebam o Evangelho imediatamente, mas que eles tenham um depois de outro; dessa forma, porém, é que a Igreja sempre é vista, e sempre é conhecida como existente por toda a parte; de forma que se possa dizer:”Vinde, subamos ao monte do Senhor (Is. 2.3). Porque a Igreja será como o Sol, diz o salmo, e o Sol nem sempre está iluminando todos os países: e no final do ano nada se esconde ao seu calor (Sl. 19.6). Assim se cumpriu a profecia de nosso Senhor que se pregasse o arrependimento e a remissão dos pecados, em todas as nações, começando por Jerusalém (Lc. 24.47).

A Igreja no tempo dos Apóstolos espalhou em todos lugares seus ramos, cobertos com os frutos do Evangelho, como s. Paulo testemunha (Rm. 1). S. Irineu diz o mesmo de sua época, (9) falando da Igreja romana ou papal comentando sua autoridade superior.

Prosper fala de nossa Igreja, não sua, quando ele diz: (10) “na honra pastoral, Roma, sede de S. Pedro, é cabeça do Universo, que ela não obteve por guerras e força, mas pela religião”. Veja que ele fala da Igreja, que ele reconheceu o Papa de Roma como sua cabeça. No tempo de S. Gregório havia católicos em todos lugares, como pode ser visto pelas Epístolas que ele escreveu aos bispos de quase todas nações. No tempo de Graciano, Valentiniano e Justiniano, havia católicos romanos em todos lugares, como pode ser visto por suas leis. S. Bernardo diz o mesmo em sua época; e você sabe bem que era assim no tempo de Godofredo de Bulhões. Desde então, a mesma Igreja é até hoje, sempre romana e papal. De forma que até mesmo se nossa Igreja fosse agora muito menor que é, não deixaria de ser muito católica, porque é a mesma Igreja romana que foi e que possuiu todas as províncias das nações e pessoas sem número: —mas, ainda é espalhada no mundo inteiro; na Transilvânia, Polônia, Hungria, Boêmia, e ao longo de toda a Alemanha; na França, na Itália, na Eslavônia, em Candia, na Espanha, Portugal, Sicília, Malta, Córsega, na Grécia, em Armênia, na Síria, e em todos lugares.

Eu somarei à lista as Índias Oriental e Ocidental? Quem teria um compêndio destes tem que assistir um Concílio geral ou assembléia dos religiosos de S. Francisco, chamados Observantinos. Ele veria estes religiosos chegarem de toda parte do mundo, do Velho e do Novo, sob a obediência de um simples homem, humilde, insignificante: de forma que só este seria bastante para a Igreja ser classificada na profecia de Malaquias (i.): Em em todo lugar há sacrifício… para meu nome.

Pelo contrário, senhores, os protestantes não passam pelos Alpes do nosso lado, nem os Pirineus no lado da Espanha; a Grécia não os conhece; as outras três partes do mundo não sabem quem são vocês, e nunca ouviram falar de cristãos sem sacrifício, sem altar, sem cabeça, sem cruz, como vocês são; na Alemanha seus camaradas, os luteranos, brentianos, anabatistas, trinitarianos, comem em sua porção; na Inglaterra os puritanos, na França os libertinos;—como então você pode ser tão obstinado, e continuar aparte do resto do mundo, como os luciferianos e donatistas? Digo-lhe, como S. Agostinho disse a um de seus companheiros: (11) “Portato, digo-lhes, para esclarecer;—como pode ser que Nosso Senhor perdeu Sua Igreja dele no mundo, e deixou de salvar”. Você reduz Nosso Senhor para uma pobreza muito grande, diz S. Jerônimo (12). Mas se você diz que sua igreja já era católica, no tempo do Apóstolo, mostra que ela já existia, pois todas as seitas dirão o mesmo. Como você pode enxertar esta religião cismática naquele tronco santo e antigo? Sua igreja precisa ter uma continuação até a igreja primitiva, pois senão, como pode puxar sua seiva? Mas nunca poderá provar isso, a menos que se submeta a obediência da [Igreja] católica e nunca poderá se juntar aos que cantam: “Tu nos redimiste com Teu Sangue, de toda tribo e língua e povos e nações e nos fez um reino para nosso Deus” (Ap. 5.9).

A VERDADEIRA IGREJA DEVE SER FRUTÍFERA. A IGREJA CATÓLICA É FRUTÍFERA.

OS PROTESTANTES NÃO SÃO.

Talvez você dirá, afinal, que depois de um tempo sua igreja esparramará suas asas, e ficará católica com o tempo; mas isto é errado. Pois se um Agostinho, um Crisóstomo, um Ambrósio, um Cipriano, um Gregório, e aquela grande multidão de excelentes pastores, não puderam fazer de tudo para impedir a Igreja de cair durante suas épocas, como [podem] Calvino, Lutero, e o resto [fazerem isto]? Que probabilidade há que deveria crescer mais forte agora, com a acusação que seus ministros não tem nem santidade e doutrina comparável aqueles? Se a Igreja em sua primavera, verão, e outono não foi frutífera, como você conseguiria juntar frutas no inverno? Se em sua mocidade não fez nenhum progresso, como acha que isto vai ocorrer?

Mas eu digo ainda mais; sua igreja não só não é a católica, mas nunca foi e não teve o poder nem a capacidade de produzir frutos, mas só de roubar a descendência dos outros, como a perdiz faz. E é uma das propriedades da Igreja ser fértil; é para isso, entre outras razões, que ela é chamada de Pomba. A Igreja é como como a videira frutífera aos lados da tua casa; os teus filhos como plantas de oliveira à roda da tua mesa (Sl. 128.3), e faz com que a mulher estéril habite em casa, e seja alegre mãe de filhos (Sl. 114.9). Ele deve, portanto, ter uma esposa que seja frutífera, de acordo com a Santa Palavra (Is. 54.1), isto devasta a idéia que alguém deveria ter muitos filhos, esta nova Jerusalém deveria ser muito populosa, e ter uma grande geração. “Os gentios caminharão à tua luz”, diz o profeta (Is. 60.3), e levanta em redor os teus olhos, e vê; todos estes já se ajuntaram, e vêm a ti; teus filhos virão de longe, e tuas filhas serão criadas ao teu lado (Is. 60.4): porque sua alma odeia o trabalho…então eu lhe darei muito. Esta fertilidade e estas grandes nações da Igreja vieram pela pregação, como diz s. Paulo (ICor. 4.15): porque eu pelo evangelho vos gerei em Jesus Cristo. A pregação da Igreja deve seer como uma chama: Sua Palavra é fogo, ó Senhor (Sl. 128). E o que é mais ativo, vivo, penetrante, e mais rápido para alterar e dar sua forma a outras matérias que o fogo?

Tal foi a pregação de s. Agostinho na Inglaterra, de S. Bonifácio na Alemanha, de S. Patrick na Irlanda, de Willibrord na Frisia, de Cirilo na Boêmia, de Adalberto na Polônia, de Stephen na Hungria, de S. Vincent Ferrer e John Capistran; como a pregação de  (13)…. Francisco Xavier, e mil outros, que destruíram a idolatria com a pregação; e todos eram católicos romanos.

Pelo contrário, seus ministros não converteram nenhuma província do paganismo, nem qualquer país. Dividir a Cristandade, criar facções, rasgar em pedaços as vestes de Nosso Senhor…esse é o efeito da pregação deles. A Doutrina Cristã é como uma chuva gentil que faz terra estéril produzir; a sua se assemelha ao granizo que destrói as colheitas, e faz estéril as terras mais férteis. Lembre-se que S. Judas diz: “Ai deles!…entraram pelo caminho de Caim, e foram levados pelo engano do prêmio de Balaão, e pereceram na contradição de Coré (Coré foi um cismático). Estes são manchas em vossas festas de amor, banqueteando-se convosco, e apascentando-se a si mesmos sem temor; são nuvens sem água, levadas pelos ventos de uma para outra parte; são como árvores murchas, infrutíferas, duas vezes mortas, desarraigadas; —eles têm o exterior das Escrituras, mas eles não têm a umidade interior do Espírito: —árvores murchas,—que não têm as folhas nem os frutos do significado interno; duas vezes mortas—mortas para caridade através do cisma, e pela fé na heresia; desarraigadas, impossibilitadas de terem frutos;— ondas furiosas do mar, espumando sua própria confusão—de disputas, competições e mudanças violentas; estrelas errantes,—que não pode servir de guia a ninguém, e não tem nenhuma firmeza de fé. Tem dúvida de que sua pregação é estéril? Você tem o tronco sem a seiva, e como podem dar frutos? Você tem só a bainha sem a espada, a carta sem o significado; por isso não podem acabar com a idolatria. Assim S. Paulo, (14) falando daqueles que se separaram da Igreja, diz que eles não devem aumentar. Se sua igreja não pode ser  católica até este presente, você pode esperar menos do futuro, já que sua pregação é fraca, e seus pregadores nunca fizeram, como Tertuliano diz, (15) a obra  “de converter os pagãos, mas só de perverter nós mesmos”. Então só pode ser uma igreja que não é nem santa, nem católica, e o que é pior, não pode ter nenhuma esperança que se tornará uma.

1. Há um hiato no MS. Aqui. Nas parte mais antigas do texto do santo os católicos são chamados de romanos nas ordens mais baixas. [Tr.]

2. Esta palavra e um ou dois outros nomes nesta oração não podem ser entendidos certamente. O argumento não é efetuado. [Tr.]

3. De Praesc. xxix.

4. Campion, Decem Rationes, 7.

5. Adv. Lucif. 28.

6. De Praesc. xxx. Seqq.

7. Aqui acontece uma passagem na perpetuidade da Igreja que já apareceu em forma um pouco mais completa, em parte I. Cap. ix., x. O leitor se refere a estes capítulos e para o Prefácio. [Tr.]

8. Esta passagem na universalidade da Igreja é igual a Parte I. c. xi.; veja nota prévia. [Tr.]

9. iii. 3.

10. De Igratis. 40.

11. Contra Don.

12. Contra Lucif.

13. Há quatro ou cinco palavras aqui no MS. O qual nós não entendemos. Há alguma indicação dos nomes de (S.) Louis Bertrand, e Anchieta, os outros parecem ser Henrye e Lorier. [Tr.]

14. 2 Tim. iii. 9.

15. De Praesc. xlii.

 

Fonte: Fidei Depositum

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O PROBLEMA DOS UNIVERSAIS

Por Renato Salles


Na Idade Média foi grande o debate sobre o problema dos universais. Este é um problema que diz respeito à idéia e sua relação com a realidade (entre voce e res). Existem 3 linhas de pensamento:
1) os realistas
2) os nominalistas
3) os realistas moderados

OS REALISTAS
Para estes a essência enquanto tal subsiste por sim mesma, ou seja, tem existência própria. Basta lembrar de Platão com seu mundo das Idéias onde a essência possui uma realidade fora das coisas que seriam apenas cópias da Idéia. Por exemplo, a essência humana existiria fora dos homens concretos, ou seja, fora do João, do Pedro, do Joaquim, etc, e teria uma existência própria. Esta é a posição de Guilherme de Champeaux, de Gilberto de la Porrée e de David de Dinant.

OS NOMINALISTAS
Para estes não existiria uma essência, nada existiria fora da individualidade. As coisas seriam tão diferentes umas das outras objetivamente, ou seja, na realidade, que não teriam nada em comum; todo conceito universal existente em nós, estaria apenas em nossas idéias e portanto seriam apenas nomes coletivos que damos às coisas. Por exemplo, o João, o Pedro, o Joaquim etc seriam tão diferentes na realidade que não se poderia dizer que eles têm algo em comum e portanto toda tentativa de os agrupar seria um ato totalmente subjetivo. Esta é a posição de Roscelin e de Guilherme de Ockham.

OS REALISTAS MODERADOS
Para estes tudo é individual, i.é., não existem seres universais com existência própria fora das coisas individuais, mas, diferentemente dos nominalistas, os realistas moderados defendem que a razão humana é capaz de fazer abstração das coisas individualizantes e apreender no individuo aquilo que ele tem em comum com outros. O universal só existe na inteligência e não na realidade, mas aquele tem por fundamento esta, não são apenas idéias sem vínculo com a realidade como querem os nominalistas. Esta forma de pensar denota o que é comum, ou seja, o modo de ser que é comum a todos os indivíduos da mesma espécie. Por exemplo, o João, o Pedro, o Joaquim etc têm em comum o nosso modo de ser, i.é, são homens e o intelecto faz abstração das notas individuais e exprime aquilo que nós temos em comum (ser homem) por meio de um conceito. A essência existe individualizada no ser e o intelecto, fazendo abstração do que é individual, faz surgir no conceito o que é universal (que compreende todos os indivíduos daquela mesma espécie). Esta é a posição Pedro Abelardo e de São Tomás de Aquino.

COMPREENSÃO E EXTENSÃO
Um conceito pode ser visto de dois modos:
1) enquanto compreensão
2) enquanto extensão
Enquanto compreensão

Enquanto compreensão o conceito se refere às notas (ou aspectos inteligíveis) que sustentam uma determinada essência.
Ex1.: Animal possui as seguintes notas: é uma sustância, é um corpo vivo, é dotado de sensibilidade;
Ex2.: Homem possui as seguintes notas: é uma sustância, é um corpo vivo, é dotado de sensibilidade, é racional.
Como se pode notar a diferença entre homem e animal é apenas uma nota: a racionalidade; portanto o conceito Homem é superior, maior, que o conceito Animal, pois possui mais notas.
Enquanto extensão

Enquanto extensão o conceito se refere ao número de indivíduos que determinado conceito abarca, i.é. se refere à amplitude do conceito.
Ex1.: Animal se refere a todos os indivíduos que possuem sensibilidade
Ex2.: Homem se refere a todos os indivíduos que possuem alma racional
Como Homem possui sensibilidade o conceito Animal abarca o conceito Homem enquanto extensão, sendo, portanto, Animal superior a Homem
Uma Lei Geral no que concerne a Compreensão e a Extensão de um conceito é que estas são inversamente proporcionais, ou seja, quando maior a compreensão, menor a extensão e vice-versa: quanto maior a extensão, menor a compreensão.
DIFERENÇAS ENTRE REALISTAS MODERADOS E NOMINALISTAS
Para os nominalistas, o que constitui primeiramente um conceito é a sua extensão;
Para os realistas moderados, o que constitui primeiramente um conceito é sua compreensão.
Para os nominalistas, o que o conceito representa de real são os indivíduos;
Para os realistas moderados, o que o conceito representa de real são as essências.
Para os nominalistas, o conceito é subjetivo, pois não existe essência em si mesmas, são as idéias que fazem a coligação das notas;
Para os realistas moderados, o conceito é objetivo pois expressa uma essência que existe no ser concreto.

REFERÊNCIAS
REALE,Giovanni. História da Filosofia: da Antiguidade a Idade Média. São Paulo:Paulus,1990.vol 1, p.519-524
MARITAIN, Jacques. A Ordem dos conceitos: Lógica menor. 13ª Ed. Rio de Janeiro: Agir, 2001.
BARROS, Manoel Correa de. Lições de Filosofia Tomista. [arquivo pessoal]. Disponível em <http://www.microbookstudio.com/mcbarros.htm> Acesso em: 26 set.2008.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Missa tradicional este sábado!

S5300013

Prezados, Salve Maria!

No 2º final de semana do mês de dezembro, mais especificamente no dia 13/12/08 – sábado - , teremos a nossa Missa na Capela do Colégio Arnaldo. A Capela é muito grande e bonita, com altar de Missa tradicional (também chamada de Missa Gregoriana, Missa Tridentina, Missa de Sempre, Missa no rito romano extraordinário, etc):

SÁBADO:

Local: Capela do Colégio Arnaldo

Endereço: Praça João Pessoa, 200 (o colégio fica em frente a Av. Brasil) - Funcionários

Dia: 13/12/08 – Sábado

Horário: 16 horas

Um abraço!

Renato Salles

 

 S5300017 S5300008

O santo Padre, o Papa Bento XVI, disse a algum tempo atrás:

Tornou-se mais facilmente possível [considerar fazê-lo] pelo fato de que neste meio tempo apareceram dois trabalhos excelentes nos quais o assunto da orientação da oração na Igreja do primeiro milênio foi esclarecido muito persuasivamente. Penso primeiramente no importante livrinho de Uwe Michael Lang, Voltados ao Senhor, de importância particular, e a importante contribuição de Stefan Heid, atitute e orientação da primeira oração na era Cristã (no Jornal de Arqueologia Cristã, 72-2006), onde fontes e uma bibliografia sobre o tema são amplamente ilustradas e atualizadas.

A conclusão é absolutamente clara: a idéia de que um padre e o povo devem se olhar nos olhos um ao outro era somente [uma idéia] na Cristandade moderna e é completamente alheia na antiga [Igreja]. O padre e o povo certamente não rezam um ao outro, mas ao único Senhor. Eles olham em oração para a mesma direção: em direção ao Leste, como símbolo cósmico para o Senhor que vem, ou onde isso não é possível, a uma imagem de Cristo, a uma cruz, ou simplesmente para o céu, como o Senhor fez na oração sacerdotal da véspera de sua Paixão (Jn 17:1).

Fonte: http://fratresinunum.wordpress.com/

Em recente entrevista disse Mons. Ranjith, secretário para a congregação do Culto Divino:

Excelência, sua primeira aparição pública como secretário da Congregação para o Culto Divino foi uma conferência proferida por ocasião da apresentação do livro de Uwe Michael Lang, oratoriano de origem alemã residente em Londres, Rivolti al Signore. L’orientamento della preghiera liturgica (Sena, Cantagalli, 2006, 150 pp.), realizada em 27 de abril no Instituto Patrístico Augustinianum de Roma. O livro, publicado em alemão em 2003, contém um prefácio do então cardeal Joseph Ratzinger, publicado pela primeira vez em italiano na edição de março de 2004 de 30Dias. O que mais o impressionou nesse livro?
RANJITH:
[...]De fato, não se pode dizer que essa participação é mais ativa quando o padre celebra voltado para o povo; pode acontecer que nesse caso o povo se distraia. Da mesma forma, a participação é verdadeira quando o abraço da paz cria uma grande confusão na igreja, com os sacerdotes indo às vezes cumprimentar até as últimas fileiras? Essa é a actuosa participatio, desejada pelo Concílio Vaticano II, ou simplesmente uma grande distração que não ajuda em nada a acompanhar com devoção o momento seguinte da missa (para não falar que às vezes se esquece até de dizer o Agnus Dei...)? Repito, o livro de padre Lang foi e é uma provocação extremamente útil, a começar pela introdução, na qual o cardeal Ratzinger lembra que o Concílio nunca pediu que se abolisse o latim, nem que se revolucionasse a direção da oração litúrgica...

Culpa da secularização...
RANJITH:
Certamente, mas essa situação é também fruto da maneira como foi tratada, ou melhor, maltratada a liturgia... Na prática, a meu ver, as sacrossantas expectativas do Concílio de uma liturgia mais bem compreendida e portanto espiritualmente mais fecunda receberam uma resposta ainda mais decepcionante. Portanto, há ainda muito o que fazer, a fim de que as igrejas se encham de novos de fiéis que se sintam realmente tocados pela graça do Senhor durante as sagradas liturgias. Num mundo secularizado, em vez de procurar elevar os corações para a grandeza do Senhor, procurou-se muito mais, eu acredito, rebaixar os mistérios divinos a um nível banal.

Quando o senhor foi nomeado secretário para o Culto Divino, escreveram que tinha ótimas relações com o mundo lefebvriano. Isso corresponde à verdade?
RANJITH:
Não conheci dom Marcel Lefebvre em razão da nossa diferença de idade, pois ele é de uma outra geração. Mas certamente tive algum contato com alguns de seus seguidores. Mas não sou um apaixonado pelos lefebvrianos. Infelizmente, ainda não voltaram à plena comunhão com a Santa Sé, mas às vezes quando falam sobre a liturgia é evidente que estão cobertos de razão. [...]

Fonte: http://www.30giorni.it/br/articolo.asp?id=11298

Dioceses se mobilizam em favor das vítimas de Santa Catarina

Notícia que acaba de sair no site da CNBB
 
Dioceses de todo o Brasil prestam solidariedade às vítimas das enchentes de Santa Catarina, que acontecem desde o penúltimo fim de semana, deixando até agora, de acordo com a Defesa Civil de Santa Catarina, oito cidades isoladas, 114 mortos, 78 mil desabrigados e desalojados.

A arquidiocese do Rio de Janeiro, por meio da Cáritas Arquidiocesana recebe doações em dinheiro que serão enviadas às dioceses catarinenses afetadas pelas chuvas. Da mesma forma agem a arquidiocese de São Paulo e a diocese de Santo André (SP), que abriram campanha até o próximo dia 31 de dezembro. Toda a arrecadação será destinada à Mitra Diocesana de Florianópolis.

A Rede Cáritas Brasileira, também reforça o apelo de solidariedade às vítimas das enchentes daquele Estado. As entidades-membro da entidade, localizadas nas áreas mais atingidas pelas chuvas, abriram três contas bancárias para receber doações em dinheiro. A Cáritas diocesana de Colatina (ES), em parceria com a Cáritas Brasileira, também está na mobilização para ajudar os catarinenses. Ainda no Espírito Santo, o bispo de Cachoeiro do Itapemirim (ES), dom Célio de Oliveira Goulart, por meio da Cáritas diocesana, da Defesa Civil e outros grupos da cidade, também deu início, neste fim de semana, a uma campanha para arrecadação de alimentos não perecíveis, roupas e calçados que serão doados aos flagelados das enchentes.

No município catarinense de Itajaí, onde 90% das casas foram atingidas pelas enchentes, as seis paróquias e os colégios católicos da cidade tornaram-se abrigos para acolher os desabrigados e desalojados. São mais de 2 mil famílias acolhidas pela Igreja de Itajaí e que permanecerão nos colégios e paróquias por um bom tempo. Um caminhão está coletando roupas, água e alimentos nas paróquias e uma conta foi aberta para receber as doações em dinheiro.
“A flagelação sensibiliza, mas a solidariedade também comove"

A Cúria diocesana de Curitiba (PR) montou um esquema para receber donativos às vítimas. Segundo o arcebispo, dom Moacyr José Vitti, “a flagelação sensibiliza, mas a solidariedade também comove”. O arcebispo alertou que é preciso rapidez e organização para atender a população desabrigada. E completou: “O coração aberto dos paranaenses e brasileiros vai amenizar os prejuízos e tornar o Natal um pouco mais feliz para centenas de milhares de pessoas atingidas”.

Na arquidiocese de Campinas (SP) as paróquias e comunidades intensificaram as iniciativas de ajuda ao povo de Santa Catarina. O arcebispo, dom Bruno Gamberini, divulgou nota ás paróquias para que não se omitam neste momento de dor: “Não podemos, neste momento, nos omitir frente ao sofrimento de tantos irmãos e irmãs”, diz o texto.
Contas Bancárias divulgadas pela Cáritas Brasileira
Florianópolis
Banco do Brasil, agência 3174-7, conta 17611-7.
Em nome de Ação Social Arquidiocesana/Flagelados SC 2008.
Informações pelo telefone (48) 3224.8776 ou pelo e-mail
asa@arquifln.org.br
Joinville
Banco BESC, agência 014, c/c 130.786-2.
A campanha é promovida pela Associação Diocesana de Promoção Social.
Informações pelo telefone (47) 3451.3715 ou pelo e-mail
adipros@diocesejlle.com.br
Blumenau
Banco Itaú, agência 6407, c/c 07004-1.
Campanha “Diocese de Blumenau - Emergência”.
Informações pelos telefones (47) 3323.6952 ou 3322.4435 (cúria) ou pelo e-mail dioceseblumenau@terra.com.br

 

Fontes: http://angueth.blogspot.com/2008/12/dioceses-se-mobilizam-em-favor-das.html

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

S. João Maria Vianney. Sermão sobre a Pureza

“Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus”. (Mt.5,8)


Nós lemos no Evangelho, que Jesus Cristo, querendo ensinar ao povo que vinha em massa, aprender dEle o que era preciso fazer para ter a vida eterna, senta-se e, abrindo a boca, lhes diz: “Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus.” Se nós tivéssemos um grande desejo de ver a Deus, meus irmãos, só estas palavras não seriam acaso suficientes para nos fazer compreender quanto a pureza nos torna agradáveis a Ele, e quanto ele nos é necessária? Pois, segundo Jesus Cristo, sem ela, nós não o veremos jamais! “Bem-aventurados, nos diz Jesus Cristo, os puros de coração, porque eles verão o bom Deus”. Pode-se acaso esperar maior recompensa que a que Jesus Cristo liga a esta bela e amável virtude, a saber, a posse das Três Pessoas da Santíssima Trindade, por toda a eternidade? ... S. Paulo, que conhecia bem o preço desta virtude, escrevendo aos Coríntios, lhes diz: “Glorificai a Deus, pois vós o levais em vossos corpos; e sede fiéis em conservá-los em grande pureza. Lembrai-vos bem, meus filhos, de que vossos membros são membros de Jesus Cristo, e que vossos corações são templos do Espírito Santo. Tomai cuidado de não os manchar pelo pecado, que é o adultério, a fornicação, e tudo aquilo que pode desonrar vossos corpo e vosso coração aos olhos de Deus, que a pureza mesma”. (I Cor, 6, 15-20) Oh! Meus irmãos, como esta virtude é bela e preciosa, não somente aos olhos dos homens e dos anjos, mas aos olhos do próprio Deus. Ele faz tanto caso dela que não cessa de a louvar naqueles que são tão felizes de a conservar. Também, esta virtude inestimável constitui o mais belo adorno da Igreja, e, por conseguinte, deveria ser a mais querida dos cristãos. Nós, meus irmãos, que no Santo Batismo fomos rociados com o Sangue adorável de Jesus Cristo, a pureza mesma; neste Sangue adorável que gerou tantas virgens de um e outro sexo; nós, a quem Jesus Cristo fez participantes de sua pureza, tornando-nos seus membros, seu templo... Mas, ai! Meus irmãos, neste infeliz século de corrupção em que vivemos, não se conhece mais esta virtude, esta celeste virtude que nos torna semelhantes aos anjos!... Sim, meus irmãos, a pureza é uma virtude que nos é necessária a todos, pois que, sem ela, ninguém verá o Bom Deus. Eu queria fazer-vos conceber desta virtude uma idéia digna de Deus, e vos mostrar, 1º. quanto ela nos torna agradáveis a Seus olhos, dando um novo grau de santidade a todas as nossas ações, e 2º. o que nós devemos fazer para conservá-la.

I – Quanto a pureza nos torna agradáveis a Deus.


Seria preciso, meus irmãos, para vos fazer compreender bem a estima que devemos ter desta incomparável virtude, para vos fazer a descrição de sua beleza, e vos fazer apreciar bem seu valor junto de Deus, seria preciso, não um homem mortal, mas um anjo do céu. Ouvindo-o, vós diríeis com admiração: Como todos os homens não estão dispostos a sacrificar tudo antes que perder uma virtude que nos une de uma maneira íntima com Deus? Procuremos, contudo, conceber dela alguma coisa, considerando que dita virtude vem do céu, que ela faz descer Jesus Cristo sobre a terra, e que eleva o homem até o céu, pela semelhança que ela dá com os anjos, e com o próprio Jesus Cristo. Dizei-me, meus irmãos, de acordo com isto, acaso não merece ela o título de preciosa virtude? Não é ela digna de toda nossa estima e de todos os sacrifícios necessários para conservá-la? Nos dizemos que a pureza vem do céu, porque só havia o próprio Jesus Cristo que fosse capaz de no-la ensinar e nos fazer sentir todo o seu valor. Ele nos deixou o exemplo prodigioso da estima que teve desta virtude. Tendo resolvido na grandeza de sua misericórdia, resgatar o mundo, Ele tomou um corpo mortal como o nosso; mas Ele quis escolher uma Virgem por Mãe. Quem foi esta incomparável criatura, meus irmãos? Foi Maria, a mais pura entre todas e por uma graça que não foi concedida a ninguém mais, foi isenta do pecado original. Ela consagrou sua virgindade ao Bom Deus desde a idade de três anos, e oferecendo-lhe seu corpo, sua alma, ela lhe fez o sacrifício mais santo, o mais puro e o mais agradável que Deus jamais recebeu de uma criatura sobre a terra. Ela manteve este sacrifício por uma fidelidade inviolável em guardar sua pureza e em evitar tudo aquilo que pudesse mesmo de leve empanar seu brilho. Nós vemos que a Virgem Santa fazia tanto caso desta virtude, que Ela não queria consentir em ser Mãe de Deus antes que o anjo lhe tivesse assegurado que Ela não a perderia. Mas, tendo lhe dito o anjo que, tornando-se Mãe de Deus, bem longe de perder ou empanar sua pureza de que Ela fazia tanta estima, Ela seria ainda mais pura e mais agradável a Deus, consentiu então de bom grado, a fim de dar um novo brilho a esta pureza virginal. Nós vemos ainda que Jesus Cristo escolhe um pai nutrício que era pobre, é verdade; mas ele quis que sua pureza estivesse por sobre a de todas as outras criaturas, exceto a Virgem Santa. Dentre seus discípulos, Ele distingue um, a quem Ele testemunhou uma amizade e uma confiança singulares, a quem Ele fez participante de seus maiores segredos, mas Ele toma o mais puro de todos, e que estava consagrado a Deus desde sua juventude.


Santo Ambrósio nos diz que a pureza nos eleva até o céu e nos faz deixar a terra, enquanto é possível a uma criatura deixá-la. Ela nos eleva por sobre a criatura corrompida e, por seus sentimentos e seus desejos, ela nos faz viver da mesma vida dos anjos. Segundo São João Crisóstomo, a castidade duma alma é de um preço aos olhos de Deus maior que a dos anjos, pois que os cristãos só podem adquirir esta virtude pelos combates, enquanto que os anjos a têm por natureza. Os anjos não têm nada a combater para conservá-la, enquanto que um cristão é obrigado a fazer uma guerra contínua a si mesmo. S. Cipriano acrescenta que, não somente a castidade nos torna semelhantes aos anjos, mas nos dá ainda um caráter de semelhança com o próprio Jesus Cristo. Sim, nos diz este grande santo, uma alma casta é uma imagem viva de Deus sobre a terra.

Quanto mais uma alma se desapega de si mesma pela resistência às suas paixões, mais ela se une a Deus; e, por um feliz retorno, mais o bom Deus se une a ela; Ele a olha, Ele a considera como sua esposa, como sua bem-amada; faz dela o objeto de suas mais caras complacências, e fixa nela sua morada para sempre. “Bem-aventurados, nos diz o Salvador, os puros de coração, porque eles verão ao bom Deus”. Segundo S. Basílio, se encontramos a castidade numa alma, encontramos aí todas as outras virtudes cristãs, ela as praticará com uma grande facilidade, “porque” - nos diz ele – “para ser casto é preciso se impor muitos sacrifícios e fazer-se uma grande violência. Mas uma vez que alcançou tais vitórias sobre o demônio, a carne e o sangue, todo o resto lhe custa muito pouco, pois uma alma que subjuga com autoridade a este corpo sensual, vence facilmente todos os obstáculos que encontra no caminho da virtude”. Vemos também, meus irmãos, que os cristãos castos são os mais perfeitos. Nós os vemos reservados em suas palavras, modestos em todos os seus passos, sóbrios em suas refeições, respeitosos no lugar santo e edificantes em toda sua conduta. Santo Agostinho compara aqueles que têm a grande alegria de conservar seu coração puro, aos lírios que se elevam diretamente ao céu e que difundem em seu redor um odor muito agradável; só a vista deles nos faz pensar naquela preciosa virtude. Assim a Virgem Santa inspirava a pureza a todos aqueles que a olhavam... Bem-aventurada virtude, meus irmãos, que nos põe entre os anjos, que parece mesmo elevar-nos por sobre eles!


II - O amor que os Santos tinham por esta virtude


Todos os Santos fizeram o maior caso dela e preferiram perder seus bens, sua reputação e sua própria vida a descorar esta virtude.
Nós temos um belo exemplo disto na pessoa de Santa Inês. Sua formosura e suas riquezas fizeram com que, à idade de doze anos, ela fosse procurada pelo filho do prefeito da cidade de Roma. Ela lhe fez saber que estava consagrada ao bom Deus. Ela foi presa sob o pretexto de que era cristã, mas em realidade para que consentisse nos desejos do rapaz. Ela estava de tal modo unida a Deus que nem as promessas, nem as ameaças, nem a vista dos carrascos e dos instrumentos expostos diante de si para amedrontá-la, não a fizeram mudar de sentimentos. Não tendo conseguido nada dela, seus perseguidores a carregaram de cadeias, e quiseram colocar uma argola e anéis em seu pescoço e em sua mãos; eles não puderam fazê-lo, tão débeis eram suas pequenas mãos inocentes. Ela permaneceu firme em sua resolução, no meios destes lobos enraivecidos, ela ofereceu seu corpinho aos tormentos com uma coragem que espantou aos carrascos. Arrastam-na aos pés dos ídolos; mas ela confessa bem alto que só reconhece por Deus a Jesus Cristo, e que os ídolos deles não são mais que demônios. O juiz, cruel e bárbaro, vendo que não consegue nada, crê que ela será mais sensível diante da perda daquela pureza que ela estimava tanto. Ele ameaça expô-la num lugar infame; mas ela responde com firmeza; “Vós podeis fazer-me morrer, mas não podereis jamais fazer-me perder este tesouro: o próprio Jesus Cristo é zeloso deste tesouro.” O juiz, morrendo de raiva, manda conduzi-la ao lugar das torpezas infernais. Mas Jesus Cristo, que velava por ela duma maneira particular, inspira um tão grande respeito aos guardas, que eles só a olhavam com uma espécie de pavor, e manda a Seus anjos que a protejam. Os jovens que entram naquele quarto, inflamados de um fogo impuro, vendo um anjo ao lado dela, mais belo que o sol, saem dali abrasados do amor divino. Mas o filho do prefeito, mais perverso e mais corrompido que os outros, penetra no quarto onde estava santa Inês. Sem ter consideração por todas aquelas maravilhas, ele se aproxima dela na esperança de contentar seus desejos impuros; mas o anjo que guarda a jovem mártir fere o libertino que cai morto a seus pés. Rapidamente se espalha em Roma o boato de que o filho do prefeito tinha sido morto por Inês. O pai, enfurecido, vem encontrar a santa e se entrega a tudo o que seu desespero lhe pode inspirar. Ele a chama de fúria do inferno, monstro nascido para a desolação de sua vida, pois tinha feito morrer seu filho. Santa Inês lhe responde tranqüilamente: “É que ele quis fazer-me violência, então o meu anjo lhe deu a morte.” O prefeito, um pouco acalmado, lhe diz: pois bem, pede a teu Deus para ressuscitá-lo, para que não se diga que foste tu que o mataste.” – Sem dúvida, diz-lhe a Santa, vós não mereceis esta graça; mas para que saibais que os cristãos nunca se vingam, mas, pelo contrário, eles pagam o mal com o bem, saí daqui, e eu vou pedir ao bom Deus por ele.” Então Inês se põe de joelhos, prostrada com a face em terra. Enquanto ela reza, seu anjo lhe aparece e lhe diz: “Tenha coragem”. No mesmo instante o corpo inanimado retoma a vida. O jovem ressuscitado pelas orações da Santa, se retira da casa, corre pelas ruas de Roma gritando: “Não, não, meus amigos, não há outro Deus que o dos cristãos, todos os deuses que nós adoramos não são mais que demônios que nos enganam e nos arrastam ao inferno.” Entretanto, apesar de um tão grande milagre, não deixaram de a condenar. Então o tenente do prefeito manda que se acenda um grande fogo, e faz lançá-la nele. Mas as chamas entreabrindo-se, não lhe fazem nenhum mal e queimam os idólatras que acudiram para serem espectadores de seus combates. O tenente, vendo que o fogo a respeitava e não lhe fazia nenhum mal, ordena que a firam com um golpe de espada na garganta, afim de lhe tirar a vida; mas o carrasco treme como se ele mesmo estivesse condenado à morte... Como os pais de Santa Inês chorassem a morte de sua filha, ela lhes aparece dizendo-lhes: “Não choreis minha morte, pelo contrário, alegrai-vos de eu Ter adquirido uma tão grande glória no Céu.”


Estais vendo, meus irmãos, o que esta Santa sofreu para não perder sua virgindade. Formai agora idéia da estima em que deveis ter a pureza, e como o bom Deus se compraz em fazer milagres para se mostrar-se seu protetor e guardião. Como este exemplo confundirá um dia estes jovens que fazem tão pouco caso desta bela virtude! Eles jamais conheceram seu preço. O Espírito Santo tem, portanto, razão de exclamar: “Ó, como é bela esta geração casta; sua memória é eterna, e sua glória brilha diante dos homens e dos anjos!” É certo, meus irmãos, que cada um ama seus semelhantes; também os anjos, que são espíritos puros, amam e protegem duma maneira particular as almas que imitam sua pureza. Nós lemos na Sagrada Escritura que o anjo Rafael, que acompanhou o jovem Tobias, prestou-lhe mil serviços. Preservou-o de ser devorado por um peixe, de ser estrangulado pelo demônio. Se este jovem não tivesse sido casto, é certíssimo que o anjo não o teria acompanhado, nem lhe teria prestado tantos serviços. Com que gozo não se alegra o anjo da guarda que conduz uma alma pura!


Não há outra virtude para conservação da qual Deus faça milagres tão numerosos como os que ele pródiga em favor duma pessoa que conhece o preço da pureza e que se esforça por salvaguardá-la. Vede o que Ele fez por Santa Cecília. Nascida em Roma de pais muito ricos, ela era muito instruída na religião cristã, e seguindo a inspiração de Deus, ela Lhe consagrou sua virgindade. Seus pais, que não o sabiam, prometeram-na em casamento a Valeriano, filho de um senador da Cidade. Era, segundo o mundo, um partido bem considerado. Ela pediu a seus pais o tempo de pensá-lo. Ela passou este tempo no jejum, na oração e nas lágrimas, para obter de Deus a graça de não perder a flor daquela virtude que ela estimava mais que sua vida. O bom Deus lhe respondeu que não temesse nada e que obedecesse a seus pais; pois, não somente não perderia esta virtude, mas ainda obteria... Consentiu, pois, no matrimônio. No dia das núpcias, quando Valeriano se apresentou, ela lhe disse: “Meu caro Valeriano, eu tenho um segredo a lhe comunicar.” Ele lhe respondeu: “Qual é este segredo? ” – Eu consagrei minha virgindade a Deus e jamais homem algum me tocará, pois eu tenho um anjo que vela por minha pureza; se você atenta contra isto, você será ferido de morte”. Valeriano ficou muito surpreso com esta linguagem, porque sendo pagão, não compreendia nada de tudo isto. Ele respondeu: “Mostre-me este anjo que a guarda.” A Santa replicou: “Você não pode vê-lo porque você é pagão. Vá ter com o Papa Urbano, e peça-lhe o batismo, você em seguida verá o meu anjo”. Imediatamente ele parte. Depois de Ter sido batizado pelo Papa, ele volta a encontrar sua esposa. Entrando no seu quarto, vê o anjo velando com Santa Cecília. Ele o acha tão bonito, tão brilhante de glória, que fica encantado e tocado por sua formosura. Não somente permite à sua esposa permanecer consagrada a Deus, mas ele mesmo faz voto de virgindade ... Em breve eles tiveram a alegria de morrerem mártires. Estais vendo como o bom Deus toma cuidado duma pessoa que ama esta incomparável virtude e trabalha por conservá-la?


Nós lemos na vida de Santo Edmundo que, estudando em Paris, ele se encontrou com algumas pessoas que diziam tolices; ele as deixou imediatamente. Esta ação foi tão agradável a Deus, que Ele lhe apareceu sob a forma de um belo menino e o saudou com um ar muito gracioso, dizendo-lhe que com satisfação o tinha visto deixar seus companheiros que mantinham conversas licenciosas; e, para recompensá-lo, prometia que estaria sempre com ele. Além disto, Sto. Edmundo teve a grande alegria de conservar sua inocência até a morte. Quando Santa Luzia foi ao túmulo de Santa Águeda para pedir ao Bom Deus, por sua intercessão, a cura de sua mãe, Santa Águeda lhe apareceu e lhe disse que ela podia obter, por si mesma, o que ela pedia, pois que, por sua pureza, ela tinha preparado em seu coração uma habitação muito agradável ao seu Criador. Isto nos mostra que o bom Deus não pode recusar nada a quem tem a alegria de conservar puros seu corpo e sua alma...


Escutai a narração do que aconteceu a Santa Pontamiena que viveu no tempo da perseguição de Maximiano. Esta jovem era escrava dum dissoluto e libertino, que não cessava de a solicitar para o mal. Ela preferiu sofrer todas as sortes de crueldades e de suplícios a consentir nas solicitações de seu senhor infame. Este, vendo que não podia conseguir nada, em seu furor, entregou-a como cristã nas mãos do governador, a quem prometeu uma grande recompensa se a pudesse conquistar. O juiz mandou que a conduzissem ante seu tribunal, e vendo que todas as ameaças não a faziam mudar de sentimentos, fez a Santa sofrer tudo o que a raiva pôde lhe inspirar. Mas o bom Deus concedeu à jovem mártir tanta força que ela parecia ser insensível a todos os tormentos. Aquele juiz iníquo, não podendo vencer sua resistência, faz colocar sobre um fogo bem ardente uma caldeira cheia de pez, e lhe diz: “Veja o que lhe preparam se você não obedece a seu senhor.” A santa jovem responde sem se perturbar: “Eu prefiro sofrer tudo o que vosso furor puder vos inspirar a obedecer aos infames desejos de meu senhor; aliás, eu jamais teria acreditado que um juiz fosse tão injusto de me fazer obedecer aos planos de um senhor dissoluto.” O tirano, irritado por esta resposta, mandou que a lançassem na caldeira. “Ao menos mandai, diz-lhe ela, que eu seja lançada vestida. Vós vereis a força que o Deus que nós adoramos dá aos que sofrem por Ele.” Depois de três horas de suplício, Pontamiena entregou sua bela alma a seu criador, e assim alcançou a dupla palma do martírio e da virgindade.


III - Como esta virtude é pouco conhecida e apreciada no mundo.


Ai, meus irmãos, como esta virtude é pouco conhecida no mundo, quão pouco nós a estimamos, quão pouco cuidado nós pomos em conservá-la, quão pouco zelo temos em pedi-la a Deus, pois que não a podemos ter de nós mesmos. Não, nós não conhecemos esta bela e amável virtude que ganha tão facilmente o coração de Deus, que dá um tão belo brilho a todas as nossas outras boas obras, que nos eleva acima de nós mesmos, que nos faz viver sobre a terra como os anjos no céu!...


Não, meus irmãos, ela não é conhecida por este velhos infames impudicos que se arrastam, se rolam e se submergem na lama de suas torpezas, cujo coração é semelhante àqueles ... sobre o alto das montanhas... queimados e abrasados por estes fogos impuros. Ai! Bem longe de procurar extingui-lo, eles não cessam de acendê-lo e abrasá-lo por seus olhares, por seus pensamentos, seus desejos e suas ações. Em que estado estará esta alma, quando aparecer diante de Deus, a Pureza mesma? Não, meus irmãos, esta bela virtude não é conhecida por esta pessoa, cujos lábios não são mais que uma abertura e um tubo de que o inferno se serve para vomitar suas impurezas sobre a terra, e que se alimenta disto como de um pão quotidiano. Ai! A alma deles não é mais que um objeto de horror para o céu e para a terra! Não, meus irmãos, esta bela virtude não é conhecida por estes jovens cujos olhos e mãos estão profanados por estes olhares e ... Ó DEUS, QUANTAS ALMAS ESTE PECADO ARRASTA PARA O INFERNO!... Não, meus irmãos, esta bela virtude não é conhecida por estas moças mundanas e corrompidas que tomam tantas precauções e cuidados para atraírem sobre si os olhos do mundo; que por seus enfeites exagerados e indecentes, anunciam publicamente que são infames instrumentos de que o inferno se serve para perder as almas; estas almas que custaram tantos trabalhos, lágrimas e tormentos a Jesus Cristo! ... Vede estas infelizes, e vós vereis que mil demônios circundam sua cabeça e seu coração. Ó meu Deus, como a terra pode suportar tais sequazes do inferno? Coisa mais espantosa ainda, como mães as suportam num estado indigno de uma cristã! Se eu não temesse ir longe demais, eu diria a estas mães que elas valem o mesmo que suas filhas. Ai, este infeliz coração e estes olhos impuros não são mais que uma fonte envenenada que dá a morte a qualquer que os olha e os escuta. Como tais monstros ousam se apresentar diante de um Deus santo e tão inimigo da impureza! Ai! A vida deles não é mais que uma acumulação de banha que eles estão juntando para inflamar o fogo do inferno por toda a eternidade. Mas, meus irmãos, deixemos uma matéria tão desagradável e tão revoltante para um cristão, cuja pureza deve imitar a de Jesus Cristo mesmo; e voltemos à nossa bela virtude da pureza que nos eleva até o céu, que nos abre o coração adorável de Jesus Cristo, e nos atrai todas as bênçãos espirituais e temporais.

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